Título: Usinas nucleares viram opção para escassez de hidrelétricas
Autor: Severo, Rivadavia; Scrivano, Roberta
Fonte: Gazeta Mercantil, 25/07/2008, Infra-estrutura, p. C6
O governo voltou a apostar nas usinas nucleares como opção à falta de oferta de energia para abastecer a crescente demanda do insumo no País. O presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Mauricio Tolmasquim, órgão ligado ao Ministério de Minas e Energia, defende a retomada do Programa Nuclear Brasileiro, que tem a usina de Angra 3 como ponta de lança. "As usinas nucleares são seguras e não emitem gás carbônico, que causa o efeito estufa", ressalta ele. Segundo Tolmasquim, a energia nuclear tem que ser vista como uma opção estratégica para o Brasil. Ele alega que temos que olhar no longo prazo, no horizonte de 25 anos, quando as opções para hidrelétricas se tornarem mais escassas. "Hoje, as termelétricas são competitivas funcionando de forma complementar. Mas se ficarem ligadas o tempo todo elas ficam bastante caras e aí a nuclear passa a ser mais competitiva. Então é fundamental implementar as nucleares", argumenta Tolmasquim. Os estudos da EPE indicam que nos próximos 25 anos o País vai necessitar de mais 130 mil megawatts (MW), hoje gastamos cerca de 100 mil MW. Desses 130 mil MW, 88 mil MW virão de hidrelétricas e o restante de outras fontes, inclusive nuclear, mas de forma minoritária, adverte o trabalho. A Eletronuclear, estatal responsável pelos projetos brasileiros de energia nuclear, calcula que o custo de Angra 3 será de R$ 7 bilhões. A obra estará a cargo da construtora Andrade e Gutierrez. Parte dos equipamentos que serão usados na obra já foi comprada em 1999. Na época, os materiais custaram US$ 750 milhões. O governo gasta cerca de US$ 20 milhões por ano só para manter essas máquinas em condições de uso, além de pagar seguro, inspeções e outros custos operacionais. As usinas de Angra 1 e Angra 2 têm capacidade instalada para produzir 2 mil MW e respondem por 1,9% da matriz energética brasileira. Quando Angra 3 estiver operando com capacidade instalada de 1.350 MW, em 2014, caso cumpra todas as exigências até obter a licença de operação, a previsão é de que as três usinas nucleares respondam por 2% da matriz nacional. Isso porque outras fontes de energia também serão ampliadas, diz a EPE. Além de Angra 3, a Eletronuclear anunciou que vai começar este ano a analisar a instalação de pelo menos mais quatro centrais nucleares. No total, o programa nuclear brasileiro prevê a construção de outras oito nucleares no Brasil, além da terceira unidade de Angra. A retomada deste programa faz parte da estratégia de diversificação da matriz energética brasileira, decisão tomada ainda na gestão de Fernando Henrique Cardoso. O governo vem reduzindo a dependência das hidrelétricas para evitar que a falta de chuvas cause um novo apagão como o de 2001, quando 97% da matriz brasileira era de fontes hidrelétricas. Hoje esse percentual é de 80%, "o que dá mais flexibilidade ao sistema para poupar energia das hidrelétricas", argumenta Tolmasquim. Cada vez que o nível dos reservatórios se aproxima do patamar de risco, as usinas térmicas são acionadas para poupar a água dos reservatórios. Isso eleva o preço da energia, porque o combustível usado para acioná-las é mais caro do que a água, mas garante que o nível dos reservatórios não chegue a patamares críticos. O principal gargalo energético enfrentado pelo País é o período entre 2009 e 2011, quando alguns projetos de grande porte ainda estarão sendo construídos, como as usinas do rio Madeira, Santo Antônio e Jirau, que terão juntas capacidade para gerar 6.450 MW. Depois disso, calcula a EPE, a oferta de energia será suficiente para sustentar um crescimento econômico de 5% ao ano. Greenpeace é contraSérgio Leitão, diretor de políticas públicas do Greenpeace Brasil, considera a decisão do governo federal de conceder a licença prévia para a construção da usina nuclear de Angra 3 completamente errada. "O primeiro fator que concretiza esta decisão como errada é o aspecto econômico. Não faz sentido liberar uma usina nuclear que gera um megawatt-hora (MWh) por R$ 140, enquanto uma hidrelétrica, como as do rio Madeira (Santo Antônio e Jirau), irão gerar eletricidade por cerca de R$ 70 o MWh", critica o ambientalista. Ele refuta a decisão e diz que o governo brasileiro precisa aproveitar outras possibilidades de energia alternativa. "Há outras fontes que geram pelo mesmo preço que uma usina nuclear, mas não renováveis e não prejudicam o meio ambiente", diz Leitão, que usa as centrais eólicas como exemplo. "Todos sabem do potencial eólico que a região Nordeste do País tem e é preciso aproveitá-la", comenta. Outro fator apontado pelo diretor do Greenpeace é a conseqüente produção de lixo atômico a partir da geração nuclear. "O Brasil está na contramão no mundo. A Alemanha, por exemplo, está largando seu projeto nuclear. Além disso, recentemente, na França, houve um vazamento radioativo, o que prova a insegurança da energia nuclear", diz Leitão. Segundo o ambientalista, Angra 3 custará aos cofres públicos algo em torno de R$ 11 bilhões e, se não atrasar, levará até sete anos para ter a obra concluída.