Título: País deve buscar o superávit nominal, diz Guido Mantega
Autor: Cavalcanti, Simone
Fonte: Gazeta Mercantil, 05/08/2008, Nacional, p. A4
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse ontem acreditar que está na hora de passar a considerar o superávit nominal nas contas do governo e abandonar a meta de superávit primário, a que chamou de distorção. "Devemos olhar para o nominal porque pagamento de juros também são despesas. Estamos tentando fazer isso, por isso sempre mostro o déficit", afirmou, sem, porém, ser específico sobre o estabelecimento oficial de tais metas. O Brasil é o único país integrante do Fundo Monetário Internacional (FMI) que considera apenas o resultado primário (receitas menos despesas, sem incluir os juros da dívida) para efeito fiscal. O arranjo foi costurado após a crise da Rússia (1998) pela equipe econômica no governo Fernando Henrique Cardoso. Só assim, naquela época, o Brasil conseguiria cumprir os objetivos impostos pelo organismo por conta do empréstimo bilionário. Embora tenha sido enfático na defesa da mudança da contabilidade, não há sinais de que isso aconteça tão logo. Antes de ser questionado a respeito do resultado nominal, Mantega havia afirmado que o governo conta com a possibilidade de elevar a meta do primário além dos atuais 4,3% do Produto Interno Bruto (PIB) para ajudar no combate à inflação, caso a pressão altista não arrefeça conforme o previsto. "Isso seria mais eficiente e menos danoso à economia. Em vez de pagar juro prefiro reduzir o gasto corrente", afirmou durante edição do seminário Diálogos Capitais para o Desenvolvimento do Brasil. O comandante da Fazenda fez questão de mostrar que foi possível reduzir o crescimento das despesas nos primeiros seis meses deste ano, quando os gastos cresceram 9,8%, um percentual abaixo do PIB nominal (12,8%). Mas negou que os gastos deixem de ser elevados por causa da necessidade de reajustes aos servidores públicos. No entanto, Mantega ressaltou que, ao que tudo indica, um maior superávit não será necessário porque a perspectiva é de desaceleração inflacionária entre este e o próximo ano. "Chegamos no auge da inflação e começamos a descer a montanha", disse, mostrando gráficos com dados dos últimos índices já divulgados. Para Mantega, houve um aquecimento "um pouco além" dos limites de sustentabilidade do crescimento do País. Mas, enfatizou, o Brasil já entrou em rota de expansão sustentada, uma vez que nos últimos quatro anos cresceu a uma média de 4,5%. Ponto de discórdia para os ex-ministros da Fazenda Antônio Delfim Netto e Luiz Carlos Bresser-Pereira e para o diretor da Escola de Economia da Fundação Getulio Vargas de São Paulo, Yoshiaki Nakano, que participaram do evento. "Não há garantias de que agora o crescimento não será abortado como ocorreu entre 2004 e 2005 (último ciclo de aperto monetário antes deste)", afirmou Delfim, para quem o discurso de que há um enorme excesso de demanda e que, por isso, a taxa Selic tem de ser elevada ainda mais, não convence. Para o economista, responsável pelos crescimentos médios de 10% ao ano da economia na década de 70, a política monetária é um expediente que sempre termina mal no País, principalmente porque não perde oportunidade de valorizar o câmbio para ajudar a combater a inflação. "Os bancos centrais do mundo estão esperando o otário que vai subir primeiro os juros", criticou. Ele citou uma pesquisa na qual os empresários dizem não considerar a inflação quando decidem investir. "Mas são ameaçados quando ouvem o discurso de que o BC tem de reduzir as expectativas de inflação. Desenvolvimento é um estado de espírito, quando o governo convence todos a investir." Para Bresser-Pereira, o governo não está sendo capaz de resolver o problema de médio prazo do Brasil, um equívoco que não leva à sustentabilidade do crescimento. "Quando quisermos resolver essa taxa absurdamente alta e esse câmbio suicida, temos que fazer um maior esforço fiscal." Já Nakano disse que o País não conseguirá entrar na rota do crescimento sustentado como ocorreu entre as décadas de 1940 e 1980 se continuar com a mesma receita. Para ele, a expansão dos emergentes se dá pela maior abertura econômica, com ênfase nas exportações ajudadas pelo câmbio sem apreciação, balizados pelo crescimento da taxa de investimento.