Título: Deficit de US$ 14,6 bi
Autor: Victor Martins
Fonte: Correio Braziliense, 27/04/2011, Economia, p. 10

Contas externas Resultado mostra desequilíbrio entre os gastos de brasileiros lá fora e de estrangeiros aqui dentro

O dólar desvalorizado frente ao real ¿ ontem, a moeda norte-americana terminou o dia cotada a R$ 1,564, com queda de 0,57% ¿ tem promovido estragos nas contas externas do país. Isso significa que o brasileiro se esbalda em compras no exterior e deixa lá fora mais capital do que o estrangeiro desembolsa aqui dentro. Um desequilíbrio que aumenta a cada ano e neste início de 2011, apenas no três primeiros meses, gerou um deficit de US$ 14,6 bilhões ¿ montante 22,4% superior ao registrado em igual período do ano passado. São compras de viagens internacionais, aluguel de equipamentos e aquisição de serviços que, no Brasil, são precários, escassos ou mais caros. Um consumo tão intenso que tem feito a balança das transações internacionais pesar contra a bandeira verde e amarela.

¿O deficit repercute maior demanda dos brasileiros por produtos e serviços. O país cresce e precisa importar para continuar a se expandir. O volume de serviços tem sido destaque no nosso levantamento¿, explicou Túlio Maciel, chefe do Departamento Econômico do Banco Central. Não fosse a atratividade que o Brasil tem exercício sobre um mundo ainda em crise, com os Estados Unidos crescendo a taxas minguadas, o país estaria em apuros.

Enquanto a terra do Tio Sam e a Europa não se recuperam plenamente, investidores e empresas de todo o mundo permanecem com os olhos voltados para os mercados emergentes e, no caso brasileiro, remetendo somas expressivas de dinheiro em forma de Investimento Estrangeiro Direto ¿ destinado ao setor produtivo ¿ e como aplicações no mercado financeiro. Durante o tempo em que esse fluxo se mantiver, a equipe econômica da presidente Dilma Rousseff passa um sufoco a menos. Apenas no primeiro trimestre do ano foram US$ 17,4 bilhões em investimentos direcionados para expansão e criação de empresas ¿ dinheiro suficiente para cobrir todo o rombo e ainda deixar uma sobra.

¿Ao mesmo tempo que vemos a expansão do deficit em transações correntes, observamos uma elevação dos investimentos estrangeiros. Uma coisa compensa a outra¿, explicou Túlio Maciel, chefe do Departamento Econômico do Banco Central. A despeito do otimismo do economista, esse ingresso de recursos, somado aos empréstimos que empresas e instituições financeiras têm feito lá fora para aproveitar as baixas taxas, e ainda a entrada de capital externo destinado à operações financeiras, o fluxo de dólares para o Brasil chegou aos US$ 35,7 bilhões ¿ volume recorde para um início de ano.

Tsunami Tamanho montante se transformou, porém, em um gigante a ser batido pelo BC na batalha por um dólar mais valorizado. E, em vez do ¿tsunami de capital estrangeiro¿ ¿ como classificou ontem o ministro da Fazenda, Guido Mantega ¿ se apresentar como algo extremamente positivo para a economia, todo esse excesso de dinheiro em circulação está gerando um custo, principalmente para o setor produtivo, já que leva o real para cima e o dólar para baixo.

Ontem, a moeda fechou a R$ 1,564, perto da menor cotação da última década, de 1º de agosto de 2008, quando a divisa foi cotada a R$ 1,561. ¿Entrou muito dinheiro no país. Todo dia uma nova empresa vem para o Brasil. Aqui é um local que está sendo avaliado como ideal para se instalar uma empresa¿, observou Márcio Cardoso, diretor da Título Corretora de Valores.

A expectativa de Maciel, entretanto, é de que o país filtre esse capital atraindo mais investimentos de longo prazo. Isso em função das medidas macroprudenciais adotadas pelo governo, a exemplo do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) incidente na renovação e na cessão de empréstimos no exterior. Assim, ele espera que o fluxo de dinheiro para o Brasil desacelere. Os bancos, por exemplo, têm puxado esse endividamento externo e ao mesmo tempo impulsionado o ingresso de dólares no Brasil. Apenas de dezembro do ano passado até março, captaram US$ 18,8 bilhões lá fora por meio de empréstimos. ¿Com o IOF maior, esse ritmo vai diminuir¿, ponderou o economista do BC.

À espera do Fed A queda do dólar ontem foi decorrente da atenção do mercado à reunião de política monetária do Federal Reserve, o banco central norte-americano. O encontro ¿ o 1º do tipo em 97 anos do Fed ¿ termina hoje. ¿Enquanto o governo norte-americano continuar com essa política de injetar dinheiro na economia, vamos ter muita liquidez e investidores ávidos por elevados retornos. E com 12% de juros ao ano o Brasil é um paraíso para eles¿, disse à Reuters o gerente de câmbio da Treviso Corretora, Reginaldo Galhardo.

Bancos apostam contra A aposta dos bancos contra o dólar voltou a se elevar em abril. Enquanto em março essa posição estava em US$ 8,8 bilhões, no mês seguinte, até o dia 20, ela passou para US$ 13,2 bilhões ¿ valor bem próximo do que o Banco Central já considerou prejudicial à segurança do sistema financeiro. Em dezembro, a autoridade monetária havia limitado essas apostas e conseguiu segurar, por um tempo, a cotação da divisa norte-americana. Porém, com o excesso de dinheiro em circulação na economia, os bancos voltaram a elevá-las. No mercado futuro, as instituições financeiras estão na posição contrária, apostando contra o real como forma de se proteger e minimizar perdas caso o mercado dê uma guinada brusca. Os estrangeiros, entretanto, estão posicionados, em quase US$ 15 bilhões, contra o dólar.