Título: Inflação é o indicador que mais preocupa os economistas
Autor: Americano, Ana Cecilia
Fonte: Gazeta Mercantil, 06/08/2008, Finanças, p. B1
Nem só de otimismo vive o sistema financeiro, apesar da conquista do Brasil da classificação de grau de investimento. Foi o que transpareceu ontem, durante um seminário sobre o tema, promovido ontem pela Associação de Bancos no Estado do Rio de Janeiro (Aberj) e pelo Sindicato dos Bancos do Estado do Rio de Janeiro (Sberj). As apresentações oscilaram entre a comemoração da classificação -- assim como de vários indicadores econômicos favoráveis -- e a cobrança de ações mais incisivas para garantir uma política fiscal mais ousada, a reforma tributária, o aumento da poupança privada e pública, os sacrifícios necessários à manutenção de baixas taxas de inflação e até a diminuição das altas taxas de juros cobradas no País. Em comum, as apresentações feitas por Henrique Meirelles, presidente do Banco Central, Luciano Coutinho, presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e alguns economistas-chefe de instituições bancárias e agências de ratings, deixaram claro que, para além da euforia pelos ótimos indicadores obtidos pelo País, há que se ter cautela com a inflação e agir em diversas frentes. "O Brasil ganhou na mega sena acumulada, pois nos últimos três anos, os preços dos produtos que exportamos cresceram muito mais que os preços de importação", comparou Octávio de Barros, diretor de Pesquisas e Estudos Econômicos do Bradesco. Melhor ainda: o País, lembrou ele, é o que maior diversidade de commodities metálicas e agrícolas possui em todo o mundo e 56% de suas exportações hoje estão destinadas aos países emergentes, onde a demanda por esses bens é crescente. "A China é a grande responsável pelos preços relativos das commodities no mercado e, dado ao seu atual ciclo de investimentos, teremos um cenário favorável devido à sua demanda por mais 10, 15 anos", acredita. E exemplifica: "Mais de cem cidades chinesas estão pleiteando a construção de metrôs e hoje aquele país conta com 92 aeroportos em construção". Barros ressalta, ainda, que o país oriental consome 35% do aço do mundo, 36% do alumínio e 21% da soja. Para o diretor do Bradesco, ainda que os preços internacionais das commodities caiam bruscamente, o Brasil continuará no lucro. O executivo fez um levantamento levando em conta a queda no preço das commodities de segunda-feira. Segundo Barros, para que os seus preços chegassem ao patamar da média do ano passado, seria necessário que caíssem ainda outros 21%; no caso do petróleo, tendo a cotação de US$ 118 como referência, para que ela baixasse à média de 2007, o seu preço teria de cair outros 40%. Para Barros haverá ainda algum ajuste, sem maiores impactos para o Brasil. Sequer o último aumento da taxa Selic em 0,75 será um problema no curto prazo. "O aperto monetário em curso, nem de longe, terá os efeitos que os anteriores tiveram sobre o País", aposta. "Contudo", ponderou, "é preciso estarmos preparados para quando este ciclo terminar, pois o choque dos preços das commodities está mascarando a ineficiência brasileira". Para Henrique Meirelles, independente da conquista do grau de investimento, o momento exige que o Banco Central mantenha a sua atuação para trazer a inflação de volta à casa dos 4,5% ainda em 2009. "Quando os analistas falam que, depois de subir um pouco, a inflação deverá cair, já estão prevendo a ação do Banco Central", defende. Segundo o presidente do BC, por melhor que esteja o cenário do País, quando há um desequilíbrio entre a oferta e a demanda, só há duas maneiras de se lidar com o problema: "ou o BC faz um ajuste coordenado, ou se dá um ajuste desorganizador, via inflação, de forma a adequar a demanda à oferta". Para Alexandre Schwartsman, economista-chefe do Santander, apesar de o grau de investimento apontar para a melhora do País, na prática, a classificação não representa um novo horizonte de crescimento. "É preciso mais", reclama. Ele recomenda uma mudança dramática da política fiscal, tanto no nível de gastos públicos, quanto no perfil deste gasto, quanto do ponto de vista tributário. "Não só tributamos muito, com alíquotas elevadíssimas, mas há um desperdício na estrutura tributária, devido aos seus altos custos", acusa. O economista elogiou o fato de o Brasil ter persistentemente reduzido a sua dívida em relação ao PIB desde 2004.