Título: Problema de São Paulo não é caixa, é gestão
Autor: D¿Angelo, Marcello ; Nascimento, Sandra
Fonte: Gazeta Mercantil, 01/09/2008, Política, p. A9

1 de Setembro de 2008 - No próximo dia 3 de setembro, Paulo Maluf completa 77 anos de vida. Mais experiente (41 anos de vida pública) candidato à disputa pela Prefeitura de São Paulo, o ex-governador, ex-prefeito e ex-candidato à Presidência da República e hoje deputado federal pelo PP, diz que só se arrepende daquilo que não fez. "O que um homem de 77 anos quer? Deixar uma biografia, e eu quero que a minha seja de ter consertado esta cidade e recuperar o tempo perdido", diz Maluf, que tem como destaque de sua campanha a construção de uma freeway(via expressa) sobre os rios Pinheiros e Tietê. "Eu vou construir a freeway porque sei que é a única solução para o trânsito da cidade", diz. Com um discurso no qual sempre destaca seus feitos do passado e desqualifica os processos que tem contra si na Justiça, - "todos falsos, sem base jurídica, são processos, não condenação" - Maluf tem hoje 9% das intenções de voto. Está atrás do prefeito Gilberto Kassab (DEM), com 14% mas, segundo o Datafolha, dentro da margem de erro, o que configura empate técnico. À frente segue o ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB), com 24% e Marta Suplicy (PT), com 41%. Ainda dizendo-se confiante de que poderá chegar ao segundo turno se mantida a tendência de crescimento e evitando antecipar o apoio a outro candidato, apesar da simpatia demonstrada a Kassab, Maluf é o segundo candidato a participar da série Eleições 2008 Encontros com a Redação, que traz entrevistas exclusivas com os principais nomes da disputa pela maior cidade da América Latina e quarta do mundo, detentora de um orçamento de R$ 25 bilhões, o quinto do País. A seguir os principais pontos da entrevista exclusiva. Atração de investimentos A cidade está coalhada de novos investimentos, nunca se investiu tanto de fora na cidade de São Paulo. Isso não é mérito de ninguém. Mas, mal administrados, os aportes acabam por gerar problemas, como trânsito, transporte coletivo, poluição. À questão levantada pelo empresário Ricardo Martins (a pedido da Gazeta Mercantil), diretor de Comércio Exterior do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp), respondo que construí a avenida Jacu Pêssego, inaugurada em 1996, um estímulo para atrair indústrias para a zona leste. É preciso sim atrair indústrias para os extremos leste e sul da cidade. Por que o metrô que vem de lá vem carregado? Porque não tem empregos. Temos que gerar empregos nos locais onde as pessoas moram. Para atrair empresas é preciso dar incentivo fiscal total, porque se o sujeito vai para o interior, o prefeito dá o terreno, dá incentivo por 10, 15, 20 anos. Em Salto, o prefeito deu, muito alegre e feliz, 20 anos de isenção de IPTU para a minha empresa, a Eucatex, colocar mais uma linha de produção. Se ele não desse iríamos buscar quem desse, claro. É preciso dar incentivos fiscais e arrumar com o governo do estado linhas de financiamento. Foi um crime tirar o Banespa do estado de São Paulo, ele era um indutor da agricultura e da indústria. E agora querem vender a Nossa Caixa e ninguém se opõe... Hoje não temos o Banespa, a Eletropaulo. Hoje o governador tem poder político para cuidar da professora e do médico e cuida mal dos dois. Trânsito e transporte coletivo É difícil falar em prioridade absoluta, porque a prefeitura tem diversos problemas. Mas para mim a questão mais urgente é um projeto para o trânsito de São Paulo. O outro é transporte coletivo, em resposta à pergunta feita pelo presidente da Associação Comercial do Estado de São Paulo, Alencar Burti. Em todo mundo, transporte coletivo e trânsito andam juntos. Quando fui prefeito, os corredores de ônibus que construí tinham uma média de velocidade de 20 km/h, hoje são 11 km/h. Trânsito ruim atrapalha o transporte coletivo. O único corredor que anda acima de 30 km/h é o tão criticado Fura-Fila, hoje Expresso Tiradentes. Quem sai da Cohab leva até 2 horas e meia para chegar ao centro e outras duas e meia para voltar. Onde estão os gargalos? São as marginais. Eu vou construir a freeway nas marginais Pinheiros e Tietê. Eu vou construir a freeway, porque sei que é a única solução. Não tenho medo da crítica, quando eu morrer com certeza vão dizer "ele foi um homem de visão". E tem também de cuidar da educação, da saúde, do meio ambiente. Metrô O orçamento do estado de São Paulo é de R$ 80 bilhões, o da cidade, R$ 25 bilhões. Há de se perguntar: a pulga tem de ajudar o elefante? Temos de exigir que o governo do estado cumpra com suas metas, porque ele é quem tem mais orçamento. Essa história eu conheço bem, para mim, construir metrô não é tema de campanha eleitoral, não é função do prefeito que é, se tiver verba sobrando, trabalhar junto com o governador. O metrô é uma empresa de propriedade majoritária do acionista Estado de São Paulo e a ele cabe dar as instruções para fazer as linhas, não à prefeitura. Agora se dá voto dizer que vai construir 47 quilômetros, como a Marta (Suplicy) diz, eu vou dizer então 57, se campanha eleitoral é olimpíada da mentira, eu acho que a gente vai mentir um pouco mais, mas eu como engenheiro não posso dizer isso. Quanto ao Rodoanel, lembro que é um projeto meu antigo, chamava-se grande anel rodoviário. Está atrasado 20 anos. Dívidas e orçamento Eu tive R$ 24 bilhões de orçamento em quatro anos, os que vieram depois de mim, Pitta, Marta, Serra, Kassab, tiveram R$ 150 bilhões e a única grande obra feita na cidade de São Paulo foi a ponte estaiada Otávio Frias de Oliveira. Mas entre R$ 300 milhões para construir a ponte ou para levar a avenida até a Rodovia dos Imigrantes, eu diria que a prioridade é levar a avenida até a Imigrantes. Para que a avenida Bandeirantes desafogue, temos que levar a avenida Roberto Marinho até a Imigrantes, senão essa obra não terá a função para a qual foi projetada. Eu sou empresário, busco reduzir custos e o que sobra são lucros para os acionistas. No governo você aperta e o que sobra é verba de investimento. A CMTC (Companhia Municipal de Transportes Coletivos) dava US$ 1,5 milhão de prejuízo diário, US$ 500 milhões por ano, foi privatizada. Eu peguei a prefeitura com 180 mil funcionários e deixei com 120 mil, minha folha de pagamento era R$ 100 milhões/mês, hoje é mais de R$ 500 mil. R$ 400 mil/mês é um ponte estaiada por mês. O orçamento da cidade de São Paulo, de R$ 25 bilhões, é suficiente para fazer frente aos problemas de São Paulo e eu vou reduzir isso ainda mais para ter até R$ 10 bilhões para investimentos. O orçamento da prefeitura não é diferente de uma empresa, a prefeitura é uma grande empresa. Quantas empresas sumiram do mapa porque foram mal administradas? Já a prefeitura não quebra, impõe sacrifícios à sua população. Impostos A promessa de redução de impostos é eleiçoeira. O compromisso que eu assumo é, com o mesmo orçamento, sem aumentar um imposto, eu mudo a cara da cidade. Efeito Lula e adversários Se a Marta traz o Lula de muleta, é porque ela sabe que não pode se eleger sozinha. Nada contra o Alckmin, ele que precisa dizer o que fez para a cidade de São Paulo. Nada contra o Kassab, ele foi bom vereador comigo, bom deputado. Ele está trabalhando, mas vou dizer o seguinte, eu trabalharia numa velocidade muito maior do que ele. Economia O Banco Central não tem independência nenhuma, quem manda no BC são os banqueiros. Quando ele diz que aumentando a taxa de juros diminui a inflação, eu pergunto porque no Japão a taxa de juros é de 0,5% ao ano e não tem inflação? Todos os países do mundo que tem juro baixo não tem inflação, é uma tese falsa. Porque o sujeito que vai comprar um móvel a inflação tem que pagar o juro mais alto porque subiu o arroz e o feijão? O que tem de mudar é a cesta básica da medida da inflação, até mesmo expurgar o feijão, se preciso. O governo Lula teve sorte de o déficit comercial norte-americano estar em torno de US$ 800 bilhões/ano. O grande superávit da balança brasileira é o déficit da balança norte-americana. Eu não sou Zaratrusta, mas ninguém vai mexer na economia americana até a posse, em janeiro. Qualquer um que for eleito, Barack Obama ou John McCain, terá de voltar para a verdade dos valores. Como já dizia Abraham Lincoln, nenhuma nação pode viver eternamente na base de dinheiro emprestado. A China tem US$ 1,8 trilhão em títulos americanos, o Japão tem quase US$ 1 trilhão, os Emirados Árabes, US$ 800 bilhões e o Brasil quer fazer um fundo soberano... Todos nós insistimos em financiar o bem-estar do norte-americano. O Lula está fazendo um bom governo graças ao Bush e ao Saddam Hussein e o déficit que a guerra do Iraque está provocando. O mundo está vendendo para ele (Bush) e recebendo papéis podres porque já perderam valor quase a metade em cinco, seis anos. Temos US$ 200 bilhões em de reservas e queremos dar US$ 400 mil com o fundo soberano. É uma estupidez, se eu for prefeito de São Paulo, vou me meter na economia. Eu acho que o Banco Central está numa política suicida onde valoriza os bancos. (Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 9)(Marcello D¿Angelo, Ana Maria Géia e Sandra Nascimento)