Título: Elevação dos juros afetará mercado interno, diz Ricupero
Autor: Aliski, Ayr
Fonte: Gazeta Mercantil, 10/09/2008, Nacional, p. A6

Brasília., 10 de Setembro de 2008 - Um dia antes de o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central anunciar qual será a nova taxa Selic ganharam força em Brasília os clamores para que o juro básico da economia não suba ainda mais, como aposta o mercado. Atualmente, a taxa Selic é de 13% ao ano. Os ex-ministros da Fazenda Rubens Ricupero e Ciro Gomes foram enfáticos em deixar um claro recado ao Governo de que uma nova elevação dos juros vai atingir negativamente o mercado interno, o qual tem sustentado a evolução produtiva do Brasil e garantido maior blindagem frente às recentes turbulências internacionais. As declarações foram dadas durante o seminário Desenvolvimento Econômico: Crescimento com Distribuição de Renda", integrante das comemorações dos 200 anos do Ministério da Fazenda, em Brasília."Não seria justificado um novo aumento dos juros", disse Ricupero. A taxa Selic, que permaneceu no patamar de 11,25% ao ano durante cinco meses, até março, subiu gradativamente, chegando ao atual nível de 13%. Há estimativas de que o BC eleve a Selic em 0,5 ou 0,75 ponto percentual. "O mercado inteiro diz que o juro vai subir, mas quero ser surpreendido, sabendo que não vão aumentar uma só fração", reforçou Ciro Gomes. Até mesmo a declaração previamente gravada em vídeo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (que não participou do evento, embora tivesse participação prevista pela organização do Seminário) encaixou-se no debate sobre o tema "inflação e juros". "Ninguém gosta de aumentar taxas de juros, mas às vezes é preciso, para conter a inflação", disse Fernando Henrique, ministro da Fazenda durante o governo Itamar Franco. Mas a inflação está controlada, argumentaram Ciro Gomes e Ricupero, apesar dos sustos com altas de preços registrados há pouco tempo. O atual ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirmou durante o evento que "o surto inflacionário esta sob controle", refletindo a queda dos preços das commodities no mercado internacional. "Vamos poder encerrar o ano dentro das margens da meta de inflação. É meta cumprida quanto a isso", disse. "Não há nada a indicar retomada da inflação. Somos o único país do mundo a adotar o regi-me de metas de inflação e não escapulir dessa meta", disse Ciro Gomes. Conforme Ricupero, os sinais de desaceleração da economia mundial vão pressionar os preços das commodities para baixo, acabando com a tendência de "importação" da inflação. Para Ricupero, as dúvidas que ainda existem pairam sobre a inflação do setor de serviços. "Mas se essa é a dúvida do BC, o melhor é dar uma pausa agora e não agravar ainda mais com um novo aumento de juros", disse. Na sexta-feira da semana passada, a Conferência das Nações Unidas sobre o Comércio e Desenvolvimento (Unctad) divulgou estudo indicando que a adoção de altas taxas de juros por países emergentes, entre eles o Brasil, é um forte fator de limitação à expansão do desenvolvimento. Países que fugiram dos juros altos, como China e Índia, cresceram e crescerão muito mais, destacou a Unctad. A ex-ministra Zélia Cardoso de Mello defendeu as decisões recentes do governo. Admite que a política econômica tem sido extremamente conservadora, mas que isso se justifica para manter o controle da inflação, considerada por ela como uma conquista da sociedade brasileira. "Não podemos perder isso. Acho que as medidas devem ser tomadas e têm sido tomadas para evitar situações como quando a inflação era de 84% ao mês. Acho que o Governo está absolutamente correto em preservar essa conquista", disse Zélia. A ex-ministra durante o governo de Fernando Collor disse que o Brasil tem obtido crescimento dos níveis de emprego e de renda real. "É isso que interessa. O restante é especulação de economista", afirmou Zélia. As recomendações dos ex-ministros circularam além do debate sobre juros. Ricupero defendeu ajustes internos. "O Brasil tem reservas grandes, embora o saldo comercial esteja caindo. Nossa economia está crescendo por fatores internos, não pelo comércio exterior, pelo consumo das famílias e gastos do governo, mas temos de evitar situações de vulnerabilidade", disse ele. Para Ricupero, é necessário voltar especial atenção para os gastos públicos. "O governo deve ter muita atenção para não aumentar os gastos em ritmo superior ao do crescimento econômico", afirmou. O ex-ministro argumentou que não somente a política de juros, controlada pelo BC, deve ser utilizada para controlar o consumo. Segundo ele, "o arsenal ao alcance do BC está exaurido", e medidas como mudanças no prazo de concessão de crédito também podem ser adotadas para controlar eventual descompasso entre oferta e demanda internas. Ciro Gomes destacou que o país tem um déficit "monstruoso" em transações correntes, compensado pelo fluxo de investimentos estrangeiros. Ciro disse que o Brasil tem atualmente boas respostas para as crises externas, como a capacidade de oferta de petróleo e a possibilidade de expansão agrícola, podendo compensar futura queda de preços agrícolas e mantendo competitividade internacional. "Assim como em 2000, 2001, quando tivemos a crise da internet, essa também é uma bolha. Naquela época, essa bolha se desfez e exigiu processo de depuração", disse Zélia, referindo-se à previsão de desaceleração do crescimento mundial. Frente à recuperação mundial do dólar - que deprecia o real o ministro Mantega admite que há necessidade mudança na área do no comércio mundial. (Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 6)(Ayr Aliski)