Título: Bolsa deve ter mais incorporações
Autor: Pinheiro, Vinícius
Fonte: Gazeta Mercantil, 15/09/2008, Finanças, p. B1

São Paulo, 15 de Setembro de 2008 - A forte queda da bolsa nos últimos meses contribuiu para acelerar o processo de consolidação entre as empresas brasileiras de capital aberto. O valor de mercado em baixa, aliado à falta de liquidez para captação de recursos em conseqüência do agravamento da crise financeira internacional, tem facilitado a troca de controle e os processos de incorporação. O movimento se concentra no setor de construção civil. Em apenas duas semanas, foram realizados dois negócios: a aquisição da Tenda pela Gafisa e a incorporação da Company pela Brascan Residencial Properties. Especialistas consultados pela Gazeta Mercantil não descartam, porém, que empresas de outros segmentos com presença na bolsa sejam negociadas caso passem por dificuldades para obter recursos. De acordo com o sócio da área de fusões e aquisições da KPMG, André Castello Branco, a queda das ações torna o negócio mais viável economicamente para potenciais compradores. Do ponto de vista da empresa, a venda do controle pode acabar sendo precipitada pelo abalo que uma queda muito brusca no valor de mercado trouxer ao negócio. Para os analistas, foi o que ocorreu no caso da Tenda, cujas ações despencaram 65,2% apenas no mês de agosto, após a empresa anunciar resultados abaixo do esperado e revelar que encontrava dificuldades de financiamento. Apesar de a Gafisa se esforçar em apresentar a aquisição como estratégica, o mercado entendeu o negócio como uma tacada oportunista da construtora, que aproveitou a forte queda do valor de mercado da Tenda e reforçou sua posição no segmento de baixa renda. "Empresas de outros setores que vierem a passar por instabilidades provocadas pela queda das ações também podem se tornar possíveis alvos de aquisição", diz o executivo da KPMG. De acordo com o professor de finanças Maurício Carvalho, do Ibmec São Paulo, as empresas de construção civil são candidatas naturais a um processo de consolidação neste momento, não apenas por conta da queda das ações como pelo fato de haver um grande número de representantes na bolsa. "A desvalorização das empresas antecipou um movimento que já era amplamente esperado", diz. Ele afirma que as companhias que abriram capital na onda de ofertas iniciais de ações (IPO, na sigla em inglês) dos últimos anos tinham a expectativa de captar mais recursos para manter o ritmo de expansão, o que não foi possível em razão da piora das condições de mercado. Segundo o professor do Ibmec, novas aquisições dependeriam da concordância do acionista controlador. "E, se ele acredita que a empresa é sólida, por que venderia suas ações nesse momento de queda generalizada?", questiona, antes de acrescentar que, mais do que o preço, a situação de cada empresa deverá determinar a possibilidade de novos negócios. Para uma fonte de mercado, os bancos médios, que também vêm sofrendo com a piora do mercado e o aumento nos custos de captação, podem ser o próximo alvo de um processo de consolidação. O sócio da PricewaterhouseCoopers Raul Beer concorda que a negociação entre empresas listadas na bolsa pode ser facilitada com a queda das ações, mas pondera que essa análise precisa levar em conta o valor relativo das companhias. "As empresas que perderam menos valor de mercado e estão mais capitalizadas em tese têm melhores condições de efetuar incorporações", avalia. Beer afirma que as companhias estão sujeitas a serem compradas não só pelas concorrentes listadas em bolsa. Sem revelar nomes, o executivo diz que analisou operações entre empresas que acabaram não vingando porque o valor oferecido na época era menor do que os controladores conseguiram depois, no processo de abertura de capital. "Com a queda das ações, esse tipo de negócio pode voltar a ser viável." Se por um lado a queda das ações favorece os negócios entre companhias, nas empresas de capital fechado, mais protegidas da vigilância do mercado, o efeito é o contrário, de acordo com Castello Branco, da KPMG. "O dono de uma empresa que não tem ações na bolsa em geral não aceita a comparação com as companhias abertas, cujo valor de mercado é usado como referência nas negociações." Minoritários Além de ver o preço das ações despencar, os acionistas minoritários de empresas que foram alvo de aquisições na bolsa não conquistaram nenhum benefício, pelo menos do ponto de vista financeiro. Tanto no caso da Tenda como no da Company, o valor da operação ficou abaixo ou próximo da cotação das ações em bolsa. Como também não houve venda do controle acionário, os negócios também não dispararam o chamado tag along - o direito de os minoritários venderem os papéis nas mesmas condições do controlador - já que, em princípio, todos os acionistas receberam o mesmo tratamento.(Gazeta Mercantil/Finanças & Mercados - Pág. 1)(Vinícius Pinheiro)