Título: Consumo leva indústria ao topo
Autor: Ribas, Sílvio
Fonte: Correio Braziliense, 04/05/2011, Economia, p. 9

Apesar das medidas para conter o ritmo de crescimento, a produção aumenta 0,5% em março e atinge o pico dos últimos 20 anos. A atividade industrial passa praticamente incólume pelas medidas do governo para desacelerar a economia e conter a inflação, como a elevação da taxa básica de juros e o aperto nas condições de crédito. Impulsionada pelo consumo, a produção cresceu 0,5% em março, atingindo o nível mais alto na série histórica, iniciada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 1991. Segundo dados divulgados ontem, os volumes acumulam altas de 2,3% no primeiro trimestre e de 6,8% em 12 meses. A comparação entre os três primeiros meses deste ano e os três últimos de 2010 revela uma expansão de 1,3%.

A expansão de 0,5% pode parecer pequena, mas foi mais do que o dobro do esperado pelos analistas, que projetavam 0,2%. Por isso, surpreendeu. ¿A indústria deixou um comportamento praticamente estável nos últimos trimestres de 2010 para uma alta em todos os setores nos três primeiros meses deste ano¿, afirmou o gerente da Coordenação de Indústria do IBGE, André Luiz Macedo. Ele lembrou que o quarto trimestre do ano passado ficou estável na comparação com o terceiro, que havia recuado 0,4% ante o segundo.

Apesar do bom momento, na comparação com março do ano passado, a produção encolheu 2,1%, interrompendo 16 meses seguidos de taxas positivas. O instituto ressalta, contudo, que o mês teve dois dias úteis neste ano por causa do carnaval, o que faz diferença. Outra ponderação sobre a primeira queda anual desde outubro de 2009 está na base excepcional de comparação. No início de 2010, a indústria ainda era movida por incentivos fiscais adotados para tirar o Brasil da recessão de 2009. Por isso, o índice também foi pressionado pela queda na produção em 17 das 27 atividades e em 53% dos 755 produtos pesquisados.

Retomada Na comparação com o mês anterior, o aumento no ritmo de atividade se deu em 13 dos 27 setores pesquisados, com destaque para material eletrônico e equipamento de comunicações (10,1%), segmento que anulou a perda de 3,1% de fevereiro. Macedo explicou que, nesse grupo, os televisores apresentaram recuperação, enquanto os celulares se beneficiaram da retomada das exportações. Segundo ele, as compras das famílias, embaladas por crediário e pelos ganhos de renda, continuam sendo o principal motor da indústria.

O gerente de Política Econômica da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Flávio Castelo Branco, confirma que o primeiro trimestre de 2011 representou uma retomada para o setor em relação ao fim do ano passado. Ele ressalta, contudo, que a expansão verificada agora é ¿bem mais modesta¿ se comparada aos dois primeiros trimestres de 2010. ¿As medidas adotadas pelo BC, sobretudo a elevação dos juros, estão amadurecendo e serão melhor sentidas em sua totalidade nos próximos meses¿, comentou.

Os bens de consumo registraram expansão de 1,2% em março, embora tenham recuado 4,1% na comparação anual. Dentro dessa categoria, os artigos duráveis avançaram 4,1% mensais, mas caíram 5,2% anualmente. A produção de bens de capital (máquinas e equipamentos industriais) também teve bom desempenho, crescendo 3,4% em março. Estimulado pelos investimentos produtivos, esse segmento apresenta expansão de 8,4% no trimestre e de 16,5% em 12 meses.

Roberto Macedo, ex-secretário de Política Econômica, prefere analisar o desempenho da indústria num contexto maior, incluindo os juros altos e a concorrência dos importados, estimulados pelo real forte. ¿Apesar dos números do IBGE indicarem expansão, o parque produtivo está sendo gradualmente prejudicado pelo ambiente econômico¿, disse. Na avaliação do economista, o aquecimento das vendas ainda carrega estímulos fiscais dados pelo governo para superar a crise mundial de 2008 e 2009. ¿A tendência é de queda e estabilidade em patamar menor¿, sentenciou.

Exceção O segmento automotivo é o único que já mostra sinais de desaceleração por causa das medidas do governo para conter o consumo. A produção de veículos pisou no freio em março, recuando 0,5% em relação a fevereiro, informou o IBGE. Segundo o órgão, o desempenho das montadoras revelou acomodação, após o salto de 5,9% de fevereiro sobre janeiro. Segundo o IBGE, o setor de veículos automotores cresceu 0,3% em março na comparação com igual mês de 2010.

No comércio de carros, a desaceleração é mais evidente. Após dois meses seguidos de alta, as vendas de automóveis, comerciais leves, ônibus e caminhões novos caíram 5,54% em abril, somando 289.213 unidades, divulgou ontem a Fenabrave, que representa as concessionárias. Na comparação com abril de 2010, os emplacamentos subiram 4,1%. Segundo a entidade, o recuo de abril se deve, em parte, às iniciativas adotadas pelo Banco Central (BC), desde dezembro, para conter o crédito.

Construção desacelera Após um crescimento contínuo em todos os meses de 2010, impulsionado por crédito farto, programas oficiais para a compra da casa própria e a expansão da renda, a construção civil deve ter um ano de desaceleração. ¿Comparado com o anterior, em que o setor estava superaquecido, certamente será um ano pior¿, disse o gerente executivo de pesquisa da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Renato Fonseca. ¿O acesso ao crédito começa a diminuir. O consumidor está um pouco mais cuidadoso e preocupado com a inflação.¿ O índice que a CNI divulga sobre o nível de atividade na construção ficou em 49,9 pontos em março, o que indica estabilidade na comparação com fevereiro. Segundo Fonseca, a falta de mão de obra qualificada já provoca atrasos nas entregas das obras.