Título: Bin Laden e o PM
Autor: Pinto, Paulo Silva
Fonte: Correio Braziliense, 05/05/2011, Opinião, p. 26

O policial militar sobe morro com um fuzil pronto para atirar, entra na casa de um traficante, que está em seu quarto, ao lado da mulher, circunstancialmente desarmado. Nós, defensores dos direitos humanos, queremos convencê-lo a poupar a vida do traficante, ainda que se trate também de um assassino, que matou outros policiais. É preciso deixar a raiva de lado em benefício da Justiça. Não era fácil convencer alguém a agir de modo civilizado num momento como esse. Ficou mais difícil depois de 1º de maio de 2011, quando soldados dos Estados Unidos assassinaram Osama bin Laden, desarmado, em sua casa no Paquistão, depois de localizá-lo graças a informações fornecidas por integrantes da Al-Qaeda sob tortura em Guantánamo.

A operação contra Bin Laden certamente inclui um aspecto simbólico positivo: demonstrar que não há impunidade para o terror. Mas o modo como foi levada a cabo resultou em enorme carga simbólica negativa. Alguns argumentam que a escala dos crimes cometidos por Bin Laden dispensa maiores formalidades. Mas no fim da Segunda Guerra Mundial a interpretação foi outra. Nazistas que integravam a cúpula do governo alemão, responsáveis pela morte de milhões de pessoas, foram presos e julgados em Nuremberg.

O mal-estar moral agravou-se com a comemoração da morte de Bin Laden nas ruas nos Estados Unidos. Uma coisa ¿ discutível ¿ é achar que o terrorista deve pagar seus crimes com a vida. Outra coisa é fazer um carnaval depois da punição. Essas pessoas podem ser minoria. Mas indicam que a sociedade, na média, tende a oferecer pouca resistência a medidas que afrontam os direitos humanos. Tem sido ainda limitada a reação das entidades internacionais de defesa dos direitos humanos ¿ aquelas que, corretamente, criticam os PMs brasileiros que saem matando por aí. Ontem, a Anistia Internacional ainda apresentava em sua página na internet uma nota de 2 de maio, afirmando que a morte de Bin Laden ¿acabará com seu papel de organizar ou inspirar atos criminais¿. Ressalva que ¿irá analisar as circunstâncias da morte, ainda não esclarecidas¿. Na Human Rights Watch não havia sequer tal ponderação. Nota também do dia 2 afirma apenas que a morte de Bin Laden lembra que milhares de inocentes ¿sofrem quando o terrorismo busca a mudança política por meio da brutalidade¿.

É muito importante que essas instituições não estejam se enfraquecendo. Afinal, é preciso mais energia, não menos, para defender os direitos humanos nesses tempos difíceis.