Título: Por um Judiciário independente
Autor: Wedy, Gabriel
Fonte: Correio Braziliense, 06/05/2011, Opinião, p. 13

Presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) A paralisação dos juízes em todos os estados do país, no último 27 de abril, em defesa da valorização da magistratura federal, obteve adesão de mais de 90% dos juízes federais do Brasil que reivindicam maior segurança para processar e julgar as organizações criminosas e o narcotráfico internacional de drogas; igualdade de direitos com o Ministério Público Federal e a revisão do teto constitucional que baliza a remuneração da magistratura brasileira.

O movimento obteve a solidariedade de líderes de sindicatos de juízes da Espanha, de Portugal e da Itália, que realizaram greves em seus países recentemente, e o apoio expresso da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), que participaram de ato público que lotou o auditório na sede do Foro da Justiça Federal em Brasília e foi transmitido para todo o país.

É evidente que os juízes, como agentes políticos do Estado, são por formação contra a realização de paralisações e greves. Ninguém gosta de fazer greve, expediente utilizado apenas quando não se é ouvido. Ocorre que o atual estado de coisas é insustentável e não pode mais persistir, uma vez que nos últimos seis anos, apesar de cobradas com insistência, as cúpulas dos poderes Judiciário, Executivo e Legislativo relegaram praticamente ao esquecimento, num jogo de empurra-empurra, questões essenciais para o exercício da toga e, muito acima disso, prioritárias para a garantia de um Poder Judiciário independente.

É inaceitável que magistrados continuem vítimas de bandidos e não recebam do Estado a menor proteção. Os juízes federais foram os responsáveis diretos pela prisão dos maiores e mais perigosos criminosos do Brasil nos últimos anos. É inadmissível que se aguarde mais de cinco anos para aprovação do PL 3/2010, que cria o órgão colegiado de juízes para julgar narcotraficantes e líderes do crime organizado e a polícia judiciária vinculada ao Poder Judiciário.

Não é certo que os juízes estejam em posição de inferioridade em relação aos promotores em matéria de direitos e prerrogativas, em franco descumprimento à expressa disposição do texto constitucional que garante essa igualdade. E o mais grave: existe decisão do Conselho Nacional de Justiça que manda equiparar o Poder Judiciário ao Ministério Público desde agosto de 2010 que até o momento não foi cumprida.

Essa situação deixou surpresos e perplexos os magistrados europeus, que estiveram no país prestando apoio aos juízes federais brasileiros, uma vez que nos seus países, assim como em todas as democracias ocidentais, a magistratura é, ao contrário do que está ocorrendo no Brasil, o ápice das carreiras de Estado. A decisão do CNJ está sendo descumprida sob o inconsistente argumento de que é necessária lei complementar para que os magistrados possam gozar dos mesmos direitos do que os representantes do Ministério Público. Todavia, as carreiras vinculadas ao Poder Executivo possuem direitos e prerrogativas, de cunho pecuniário, garantidas por meras portarias e medidas provisórias sem que até o momento tenham sido questionadas em juízo.

Os juízes federais brasileiros lutaram pela criação do teto constitucional levado a efeito pela Emenda Constitucional nº 45 no ano de 2005. O teto constitucional moralizador foi importante porque, além de gerar um parâmetro remuneratório para o serviço público ¿ nenhum servidor público pode ganhar mais do que o presidente do STF ¿, gerou imensa economia para os cofres da União nos últimos anos. Essa foi uma vitória da sociedade que a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) apoiou, quase sozinha, enfrentando inúmeros interesses corporativos.

O teto constitucional deve obrigatoriamente ser atualizado anualmente, como está escrito no art. 37, inc. XI, de nossa Magna Carta. Todavia, nos últimos seis anos, a Constituição tem sido violada sem que nada seja feito. Enquanto o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) e o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) ultrapassaram os 35% no período, os magistrados federais brasileiros receberam apenas um reajuste de 8% em 2009.

Os juízes federais brasileiros estão firmes em um movimento cada vez mais consolidado e organizado e vão se reunir nas próximas semanas para decidir, sem abrir mão do diálogo, quais serão os próximos passos. Lutamos por um Poder Judiciário independente que possa levar ao povo brasileiro uma Justiça mais acessível, rápida e, que, no âmbito criminal, não admita a impunidade, em especial nos crimes mais graves e danosos à sociedade.