Título: Presentes, mas descrentes
Autor: Rothenburg, Denise
Fonte: Correio Braziliense, 10/05/2011, Política, p. 2

Prefeitos que estiveram em outras edições da marcha afirmam que o histórico de promessas não cumpridas pelo governo federal diminui as expectativas de muitos. CNM lista conquistas obtidas Ano após ano, prefeitos de todo o Brasil se reúnem na capital com duas expectativas: resolver pendências antigas que beneficiariam os municípios e voltar com a notícia de repasses imediatos de verba para suas cidades. A esperança, no entanto, não tem saído do imaginário deles: questionados sobre as conquistas de marchas anteriores, prefeitos só conseguiram se lembrar de três retornos de maior impacto. São eles: a reposição de parte das perdas do FPM depois de a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI); o adicional de 1% do FPM para ajudar as prefeituras a pagar o 13º salário; e o aumento do repasse para merenda escolar.

Diante da pauta extensa e repetitiva, chefes de Executivo não depositam muita expectativa no encontro. ¿Há um cansaço entre os prefeitos. Sentimos que nada sai do lugar. Queremos apresentar uma pauta mais clara e objetiva¿, diz o presidente da Associação Mineira de Municípios, Ângelo Roncalli (PR), prefeito de São Gonçalo do Pará, que leva como sugestão inédita o fim das emendas parlamentares. A impressão é compartilhada pelo ex-presidente da mesma associação José Milton de Carvalho (PSDB), que comanda Conselheiro Lafaiete: ¿Acredito que 90% da pauta da marcha é repetida¿.

Prefeito de Itabinha, Aurélio Cézar (PSDB) já participou de outras seis edições da marcha. ¿Algumas promessas surgem do encontro, mas geralmente o governo federal não cumpre. É decepcionante.¿ Ele precisou desmarcar na última hora a presença. Além da falta de novidades, pesou outro problema: os gastos com a participação são altos. ¿Afiliado da Confederação Nacional dos Municípios (CNM) não paga inscrição, mas os custos com hotel e passagem aérea ficam por conta da prefeitura¿, relata. A confederação informa que apenas indicou uma empresa de turismo para fazer os pacotes com descontos, mas sem interferir nas negociações. Apesar da grande quantidade de pessoas em Brasília, a lotação dos hotéis ainda não havia chegado ao máximo, segundo o sindicato da categoria, que considera a taxa de ocupação alta.

Já em 1998, na estreia do movimento, os chefes de Executivo reivindicavam a elevação do FPM. Naquele ano, pediam também a municipalização dos recursos do IPVA ¿ imposto arrecadado pelos estados ¿ e a renegociação de dívidas municipais com a União (item que nunca sai de pauta). No entanto, os prefeitos não conseguiram audiência com o presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e reclamaram por terem sido recebidos pela tropa de choque da Polícia Militar.

Para o presidente da CNM, Paulo Ziulkoski, ao se dizerem desanimados, os prefeitos se esquecem de conquistas anteriores. ¿Costumo dizer que, se vêm com o objetivo de voltar com dinheiro no bolso, não precisam comparecer. Nossas lutas são dia após dia. Em 2008, conseguimos que o Senado aprovasse a regulamentação da Emenda 29, que determina os gastos com a saúde. Agora, a luta é para que a Câmara também a aprove. Quando sair, será uma grande conquista¿, afirma.

Vício Além dos 4,2 mil prefeitos, outro grande número de pessoas estará no DF até quinta-feira, em eventos paralelos. São vereadores, que participam de um fórum, e as primeiras-damas, que realizam conferência para debater a saúde. No encontro da CNM, um tema não político, mas que preocupa prefeitos, também será discutido: a chegada do crack às pequenas cidades. Os prefeitos deverão apresentar um diagnóstico da situação do crack em suas cidades, principalmente nas fronteiras, onde será criada uma rede de proteção. A CNM apresentará também o observatório que acompanhará as ações públicas no combate ao vício em todo o país.

Consumo ascendente Nos últimos três anos, os municípios da fronteira ¿ principalmente de estados brasileiros próximos às regiões produtoras de coca, como Bolívia, Peru e Colômbia ¿ começaram a registrar um grande consumo de drogas, o que não era realidade há 10 anos. Isso se deve, segundo especialistas, ao preço baixo e ao poder viciante da cocaína transformada em crack ou oxi. Pessoas de baixa renda e até mesmo de classe média são as principais vítimas dos traficantes, que também têm como alvo adolescentes e crianças.