Título: Conflito religioso mata 12 no Egito
Autor: Craveiro, Rodrigo
Fonte: Correio Braziliense, 09/05/2011, Mundo, p. 13

A fé ficou relegada a segundo plano na noite de sábado, quando cristãos coptas e muçulmanos travaram um confronto sangrento, no Cairo. Pelo menos 12 pessoas morreram ¿ quatro adeptas do cristianismo e seis do islamismo ¿ e 232 ficaram feridas. Até o fechamento desta edição, os outros dois mortos não tinham sido identificados. A violência teve início assim que começaram a circular boatos de que uma cristã era mantida contra sua vontade na Igreja Ortodoxa Copta de Saint Mena, uma das mais antigas do Egito, situada no bairro de Imbaba. Após casar-se com um muçulmano, a mulher teria manifestado o desejo de se converter ao islã.

¿A história é confusa. Supostos muçulmanos salafistas escutaram que uma garota cristã era mantida refém, decidiram ir até lá e trocaram tiros com os cristãos¿, contou ao Correio Mahmud Salem, um empresário de 29 anos que chegou a outro templo atacado, a Igreja Aadra, por volta da 0h15 de ontem (19h15 de sábado). ¿Eu vi a igreja queimando. Havia pessoas lá dentro e os moradores de Imbaba faziam o melhor que podiam para debelar as chamas¿, acrescentou o morador do bairro de Heliópolis (leste). De acordo com ele, a Igreja Aadra teria sido alvo de marginais e não de muçulmanos. ¿Os moradores estavam descontrolados e ajudavam as equipes de segurança e o Exército¿, disse. Os cristãos representam apenas 10% da população do Egito.

O também egípcio Zezo El Shreif disse à reportagem ter ouvido que quando os muçulmanos se aproximaram da Igreja de Saint Mena, alguém começou a atirar. ¿Aqui no Egito, nós costumávamos viver com segurança e com amor, mas o velho regime usou a sedição sectária¿, admitiu. De acordo com a jornalista Aliaa Hamed, 27 anos, uma mentira incitou o caos. ¿O chefe dos salafistas descobriu que a história era uma farsa, mas era tarde demais. As pessoas começaram a atirar de dentro da igreja e 12 morreram, enquanto o prédio queimava¿, relatou à reportagem. Ela contou que se comenta no Cairo sobre a premeditação do conflito sectário. ¿Tudo teria sido planejado por oficiais demitidos ou por simpatizantes do ex-presidente Hosni Mubarak.¿ A agência France-Presse (AFP) informou que os muçulmanos jogaram coquetéis molotov contra as igrejas.

Mais violência A violência prosseguiu ontem, enquanto coptas e muçulmanos se uniam diante da Suprema Corte do Cairo, num gesto em defesa da unidade nacional. De acordo com a AFP, 400 manifestantes foram surpreendidos por dezenas de pessoas que lançaram pedras contra a multidão, no bairro de Maspiro. Os dois grupos trocaram golpes e pedras, antes de se dispersarem. Ao menos 10 pessoas ficaram feridas. ¿Com nossas almas e nossa sangue, nos sacrificaremos pela cruz¿, gritavam os fiéis. O primeiro-ministro do Egito, Esam Sharaf, adiou uma visita ao Barein e aos Emirados Árabes Unidos, convocou uma reunião de emergência e prometeu usar mão de ferro em defesa da segurança nacional.

¿A situação é muito tensa. Os coptas estão muito nervosos; os muçulmanos, chocados. Mas os radicais não dão a mínima¿, garantiu ao Correio um blogueiro que usa o apelido The Big Pharaoh e não quer ser identificado. ¿Fui ao protesto em Maspiro. Todos entoavam palavras de ordem contra o exército e contra os xeques muçulmanos¿, disse. Ele revelou temer uma espiral de violência. ¿Você nunca sabe para onde os radicais nos arrastarão. Maníacos são imprevisíveis¿, criticou. Nos últimos meses, tem aumentado a tensão entre a maioria muçulmana e a minoria cristã copta. A situação se agravou após a divulgação de um relatório, por parte do governo norte-americano, que acusava os muçulmanos de serem hostis com os seguidores do islã.

Eu acho...

¿Veremos mais confrontos. A divisão sectária tomará seu curso até que ambos os lados decidam que isso não vai funcionar. Eu espero que isso termine bem e com o menor número possível de mortos¿

Mahmud Salem, 29 anos, empresário no Cairo