Título: Até prioridades estão empacadas
Autor: Ribas, Silvio
Fonte: Correio Braziliense, 15/05/2011, Economia, p. 12

Exemplos não faltam para questionar a eficiência do atual governo. Projetos apontados como prioritários por Dilma Rousseff, como o trem-bala, a usina de Belo Monte e o Plano Nacional de Banda Larga, estão longe de sair do papel e só não se transformaram em fracasso porque a maior parte do dinheiro para pô-los em prática virá dos cofres da União. A inação da atual administração é tamanha que o Minha Casa, Minha Vida, programa habitacional voltado para a baixa renda e criado pela presidente da República ainda como ministra da Casa Civil de Lula, foi suspenso e, com muita boa vontade, só será retomado a partir de julho. Mas não é só: desde o início do ano, o país foi submetido a vários apagões de energia elétrica e os aeroportos estão em frangalhos.

Esse retrato não surpreende Nelson do Vale Oliveira, sociólogo e coordenador de informática do Ministério do Planejamento. A seu ver, parte da ineficiência decorre do perfil das instituições públicas, que precisam ser submetidas, rapidamente, a várias alterações legais. ¿Mas, independentemente dos entraves legais, muita coisa nas mãos do Poder Executivo pode ser melhorada com decisões administrativas e políticas. Como? Padronizar documentos, processos e tarefas; fixar e documentar rotinas; contabilizar pessoal e recursos para a execução de atividades comuns¿, afirma.

A partir de uma análise de auditorias do Tribunal de Contas da União (TCU), Oliveira concluiu estudo que revela ¿amadorismo generalizado¿ na administração federal, com excesso de reuniões e uso inadequado dos recursos humanos. ¿Um dentista não brinca com sua boca, mas um administrador público faz experiências a todo momento¿, resume. Sua pesquisa mostra, por exemplo, que a compra de equipamentos desnecessários é algo rotineiro.

Outro fenômeno é a existência de várias autoridades responsáveis por uma mesma ação, sem que nenhuma delas assuma responsabilidade por resultados. ¿Isso pode, sim, explicar atraso de obras. O governo vive anunciando projetos, mas nunca tem a resposta esperada¿, diz Oliveira. Por isso, ele desconfia da eficácia de se criar outros órgãos ou programas para dar eficiência à máquina, sem considerar as iniciativas de outros tantos implantados desde o governo José Sarney. ¿O ideal seria um trabalho sistemático e gradual para corrigir distorções, além de reformar sistemas de recursos humanos, planejamento e compras¿, resume.

Para Fábio Giambiagi, economista do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico Social (BNDES), medidas administrativas podem até otimizar a gastança do governo e melhorar a gestão, permitindo que obras prioritárias saiam do papel, atendendo os anseios da sociedade. Mas elas têm alcance limitado. ¿O esforço de austeridade é importante, mas afeta só uma fração modesta do gasto público. A poupança do país, de apenas 0,3 % ou 0,4 % do Produto Interno Bruto (PIB, a soma das riquezas produzidas no país), que implica cortes em diversas áreas, acaba inteiramente anulada com um simples ato de generosidade envolvendo o salário mínimo¿, ilustra.

Curiosamente, o governo Dilma empregou a sua maioria folgada na Câmara dos Deputados e no Senado para garantir a aprovação do ¿ajuste adequado¿ no salário mínimo, de R$ 540 para R$ 545, temendo impactos na Previdência Social, mas também para triplicar (US$ 360 milhões) o valor anual pago ao Paraguai pela energia de Itaipu. Outras contradições podem ser vistas ao se comparar o corte de R$ 50 bilhões no Orçamento da União deste ano com o total de ministros da Esplanada: 39, se incluir o de Pequenas Empresas, ministério criado recentemente pela presidente.