Título: Brasil quer novo câmbio
Autor: Ribas, Sílvio
Fonte: Correio Braziliense, 17/05/2011, Economia, p. 14

A obsessão do governo em conter efeitos nocivos da valorização do real ante o dólar sobre a balança comercial e a indústria estimulou o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic), Fernando Pimentel, a provocar ontem seu colega chinês, Chen Deming. Em visita ao país, o ministro de Comércio da China ouviu de Pimentel a defesa de mudanças no regime cambial do mundo, que tem o dólar como moeda de referência. ¿Estamos na segunda década do século e ainda convivemos com um modelo de meados do século passado. Precisamos iniciar a negociação de uma cesta de moedas para balizar o comércio mundial¿, disse ele, ao lado de Deming e do chanceler Antônio Patriota, durante entrevista coletiva conjunta no Itamaraty.

Pimentel reconheceu que a discussão levará tempo para evoluir, mas destacou que o ministro chinês demonstrou simpatia por ela durante reunião de trabalho realizada ontem. Essa afirmação, contudo, provocou um saia justa quando jornalistas pediram o comentário de Deming. Depois de tentar evitar a resposta, ele afirmou que não estava preparado para comentar um assunto não previsto na pauta da viagem oficial. Além disso, observou que uma eventual retirada do dólar das trocas entre Brasil e China requer muitos cálculos.

¿O futuro do padrão dólar é um debate longo e que deve ser avaliado tecnicamente por bancos centrais¿, ressaltou Deming. Ele lembrou ainda o tema tem boa aceitação no G-20 (grupo das 20 maiores economias do mundo) e no Fundo Monetário Internacional (FMI). O ministro brasileiro afirmou mais tarde que seu colega temia que sua avaliação favorável fosse confundida com a posição de Pequim. Pimentel lembrou que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, conseguiu ¿importante avanço¿ ao colocar a chamada ¿guerra cambial¿ na agenda oficial da Organização Mundial do Comércio (OMC).

A aceleração dos negócios entre Brasil e China ¿ embalados por pelo menos US$ 8 bilhões em investimentos diretos este ano ¿ foi a tônica da presença desde o fim de semana de 66 empresários chineses, acompanhados de Chen Deming. Ele mostrou conhecimento sobre as oportunidades na América Latina e prometeu melhorar a posição do Brasil na relação comercial chinesa, atualmente em nono lugar. O ministro destacou, entre os novos investimentos no país, a instalação de fábrica da marca chinesa de máquinas pesadas Sany, por US$ 200 milhões.

Soja e minério Pimentel ressaltou que as trocas com a China já cresceram 45% só nos quatro primeiros meses do ano, atingindo US$ 20 bilhões, com saldo de US$ 1,6 bilhão favorável para o Brasil. Sua expectativa é que o valor anual seja, no mínimo, 20% maior que os US$ 38 bilhões de 2010, beirando US$ 50 bilhões. ¿As exportações para o nosso principal parceiro comercial devem chegar a US$ 37 bilhões, ainda puxadas pelas cotações elevadas da soja e do minério¿, estimou.

O ministro procurou minimizar os impactos da barreira adotada na última quinta-feira para proteger a indústria automotiva nacional contra a crescente importação de veículos chineses, ao lembrar que elas não chegam a 2% do total. Além disso, adiantou que os dois países assinaram acordo para desenvolver conjuntamente tecnologias de componentes usados pelas montadoras.

Pimentel confirmou que os estímulos fiscais à produção de tablets no país estão previstos e medida provisória (MP) a ser editada esta semana, mas destacou que a produção de telas pela taiwanesa Foxconn virá apenas numa segunda etapa. A primeira refere-se apenas à montagem de iPads e iPhones, para a Apple. Ele e Deming também participaram do encerramento do Encontro Empresarial Brasil-China, na Confederação Nacional da Indústria (CNI). A rodada de negócios serviu para mostrar a empresários chineses em visita ao Brasil e a representantes de empresas brasileiras de diversos setores oportunidades de investimentos nos dois países. Os chineses afirmam estar interessados em oito grandes projetos, com destaque para energia e infraestrutura.

Saldo de US$ 1,49 bilhão A balança comercial brasileira registrou saldo de US$ 1,49 bilhão na segunda semana de maio, mantendo a tendência de alta verificada desde o começo do ano. As exportações chegaram a US$ 5,76 bilhões, com forte aceleração nas vendas de produtos básicos. Os destaques foram petróleo, minério de ferro, café em grão, farelo de soja e carne suína. As importações chegaram a US$ 4,27 bilhões, numa queda de 1,2%, com diminuição na compra de automóveis e outros industrializados. No ano, as vendas externas somam US$ 82,46 bilhões, crescendo 31,4%. As importações totalizam US$ 74,97 bilhões, em alta de 26,8%. No acumulado do ano, o superavit atingiu US$ 7,48 bilhões, mais do dobro de igual período do ano passado.