Título: Sessão histórica no CNMP
Autor: Campos, Ana Maria
Fonte: Correio Braziliense, 18/05/2011, Cidades, p. 19

O julgamento de ontem ficará marcado na história do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). Pela primeira vez desde a criação do órgão, um ex-procurador-geral de Justiça foi condenado à pena máxima: demissão do cargo. Apesar de a sessão de ontem ter sido mais tranquila do que anterior, principalmente pela ausência da promotora Deborah Guerner, diversas cenas e discussões pontuaram o dia. A defesa da acusada bem que tentou, mas o relator do processo administrativo aberto contra ela e Leonardo Bandarra, conselheiro Luiz Moreira, negou pedido para que a reunião ocorresse a portas fechadas. Com isso, os presentes puderam acompanhar o voto divergente aberto pelo conselheiro Achiles Siquara, autor do pedido de vista que adiou o julgamento iniciado em 6 de abril.

Siquara levou ao plenário os 10 principais volumes do total de 50 constantes do Processo Administrativo Disciplinar (PAD) nº 1.515/2009-73. Ele discordou da maioria dos argumentos apresentados por Moreira, que havia pedido a suspensão e demissão dos promotores, principalmente no tocante a Bandarra. Segundo o conselheiro, não existem provas sobre a participação do então procurador-geral de Justiça no vazamento de informações da Operação Megabyte ao então secretário de Relações Institucionais do DF, Durval Barbosa, nem na suposta extorsão feita a José Roberto Arruda, governador do DF à época.

Segundo Siquara, a falta de um Código de Ética dificulta o enquadramento das ilicitudes e a definição das sanções. No entanto, para ele, Bandarra deveria ser punido com censura por ter procurado o promotor Mauro Faria de Lima para interferir na apresentação de denúncia, em 2009, contra o então comandante da Polícia Militar do DF, Antônio Cerqueira. Segundo o conselheiro, o promotor é réu primário e não poderia ser condenado com a exoneração. A pena seria de censura. No entanto, esse tipo de punição também estaria prescrita. Diante disso, o acusado deveria ser inocentado.

Já no caso de Deborah Guerner, Siquara acredita haver evidências suficientes para a demissão. Depoimentos de Durval, Arruda e da assessora Cláudia Marques comprovam a atuação da promotora para tirar da internet, com a ajuda de hackers, notícia de que ela e Bandarra estariam beneficiando empresas nos contratos de coleta de lixo no DF.

Além disso, a promotora teria ¿achacado¿ o ex-governador. Ela cobrou R$ 2 milhões de Arruda e, em troca, não divulgaria vídeo em que ele aparece recebendo dinheiro de Durval. Sobre a acusação de repasse de informações, entretanto, Siquara também absolveu a promotora. ¿Tenho como insuficiente o acervo de prova da prática de ato ilícito de vazamento da Megabyte¿, disse.

Ética O voto de Siquara tomou a metade da sessão de ontem e animou a defesa dos acusados. No entanto, a segunda parte da manhã foi destinada ao contraponto apresentado pelo conselheiro Cláudio Barros Silva ¿ seguido pelos demais colegas até completar o placar de 9 votos a 1 pela condenação de Bandarra e de 10 a 0 pela demissão de Deborah. ¿Dos membros do Ministério Público exige-se uma conduta diferenciada, dentro de um espectro superior de responsabilidade. Estamos a julgar matéria administrativa em que se imputa a membros do MP grave violação à dignidade de suas funções à Justiça¿, disse o conselheiro.

Cláudio Barros proferiu um voto duro contra os acusados. Segundo ele, o exercício do cargo exige comportamento ilibado, idôneo e probo com um peso superior ao da moral comum. ¿Todos sabem que o MP não existe para assegurar ou sustentar meros interesses individuais, políticos ou econômicos, e o capricho de governantes.¿

Segundo ele, há indícios veementes sobre a ação indevida para bloqueio de matéria jornalística, da violação do sigilo sobre operação realizada pelo órgão e da tentativa de extorsão realizada contra Arruda. O conselheiro disse que, apesar de serem jovens e cultos, Guerner e Bandarra não souberam manter a integridade e dignidade.

Antes da apresentação do oitavo voto contra Bandarra, suficiente para a condenação, o ex-procurador-geral de Justiça do DF deixou o plenário, desceu rapidamente ao estacionamento e saiu sem falar com ninguém.