Título: A César o que é de César
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Fonte: Correio Braziliense, 27/05/2011, Opinião, p. 12

Acertou a presidente Dilma Rousseff ao suspender o envio do material anti-homofobia a 6 mil escolas públicas. Considerou-o impróprio e inadequado. Mais tarde, ao falar sobre o assunto, afirmou que o kit ¿não faz defesa de práticas não homofóbicas. Faz propaganda de opções sexuais¿. Mais: frisou não ser papel do governo interferir na vida privada das pessoas.

Encomendado pelo Ministério da Educação, o pacote, composto por um caderno, seis boletins, três vídeos e cartas de apresentação, teria como objetivo acabar com o estereótipo sobre homossexualismo porventura existente entre os estudantes. A iniciativa provocou reações.

Além de pais e responsáveis por jovens matriculados em instituições de ensino do Estado, membros do Congresso elevaram a voz. Com base em imagens divulgadas na internet, as bancadas evangélica e católica ameaçaram obstruir os trabalhos do Legislativo e apoiar a criação de CPI para investigar o ministério caso o projeto fosse levado avante.

Em entrevista divulgada ontem, o ministro da Educação, Fernando Haddad, defendeu o kit. As informações, segundo ele, diminuiriam a violência nas escolas contra rapazes e moças que demonstrassem preferências homossexuais. O veto da presidente não seria, pois, contra a ideia, mas contra a forma como foi apresentada.

Tem razão o ministro. Nem a presidente nem qualquer outra pessoa podem se opor às manifestações de intolerância, seja quem for a vítima. O inciso IV do artigo 5º da Constituição não deixa dúvidas. Proíbe a discriminação em razão de raça, sexo, cor, idade e qualquer outra forma de manifestação preconceituosa. A escola, independentemente de pressão desta ou daquela bancada, tem o papel de formar cidadãos.

Além de dar acesso ao conhecimento, precisa socializar e estimular a tolerância. Respeitar os diferentes faz parte da convivência civilizada. Peso, cor, religião, origem, opção sexual, deficiência mental ou física devem ser vistos com naturalidade. Todos têm direito a tratamento cortês. Exceções precisam ser vistas como exceções. E tratadas como exceções. Desobedecer à regra exige acompanhamento pedagógico e, se necessário, punição. É o que as escolas têm feito com relação ao bullying.

O combate ao mal pressupõe a participação efetiva da família. Impõe-se não esquecer o papel que pai, mãe, irmão, tio desempenham na educação da criança. Ora, por que dispensar tratamento diferenciado à homofobia? Com a discriminação, corre-se o risco de reforçar preconceitos. Como disse a presidente, não cabe ao governo interferir na vida privada das pessoas. ¿A César¿, ensina o Evangelho, ¿o que é de César.¿