Título: Hora de rearticular
Autor: Rothenburg, Denise
Fonte: Correio Braziliense, 31/05/2011, Política, p. 2

Diante da crise que levou o ministro da Casa Civil, Antônio Palocci, a cuidar de dar explicações ao Ministério Público e à base aliada sobre o faturamento de sua empresa, o governo se mostra disposto a reformular a articulação política do Congresso com o Planalto. O primeiro ensaio dessa reforma segue no sentido de dar mais poder ao ministro de Relações Institucionais, Luiz Sérgio, que, até então, cuidava basicamente de receber e retornar as ligações telefônicas daqueles parlamentares que procuravam por Palocci e o ministro da Casa Civil não conseguia atender.

Ontem, por exemplo, Luiz Sérgio almoçou com o líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros (AL). Foi o primeiro encontro mais reservado entre os dois desde a posse da presidente Dilma Rousseff. O PMDB, especialista em ¿mergulhos¿ ¿ o que em política significa ¿sair de cena¿ ¿, acha que Palocci precisa se preservar mais, de forma a não deixar os parlamentares irritados com ele. Como o tempo do ministro da Casa Civil parece dedicado à sua defesa, o mais sensato na opinião de muitos é dar a Luiz Sérgio mais atribuições, como a questão de cargos de segundo escalão, a liberação de emendas ao orçamento que dizem respeito direto aos parlamentares e também mais acesso à presidente Dilma.

Ocorre que essas atribuições estão hoje mais afeitas à Casa Civil do que propriamente ao ministério de Relações Institucionais. Luiz Sérgio não tem tanto acesso direto à presidente Dilma como o ministro da Casa Civil, seu fiel escudeiro durante toda a campanha presidencial. A área de Luiz Sérgio é vista como aquela que só leva problemas, e não soluções, à presidente. Para completar, Luiz Sérgio não vai a jantares com a base aliada, enquanto alguns de seus antecessores, Alexandre Padilha e José Múcio Monteiro, tinham às vezes, uns três encontros a cada quarta-feira. Faziam périplos nos jantares promovidos pelos partidos e sempre levavam uma mensagem de apreço do presidente à base política. Como diz um alto comandante partidário, ¿nem José Múcio nem Padilha tinham poder de decisão sobre a liberação de verbas, mas o sujeito saía satisfeito da conversa com eles. Luiz Sérgio parece que não pegou essa manha¿.

Diagnóstico Os parlamentares avaliam que Dilma também não é lá muito paciente no quesito conversas políticas. Ela costuma dedicar horas a estudar um programa governamental, analisando dados e chances de sucesso. Mas não é do seu feitio ficar cinco horas discutindo assuntos políticos, como chamar um líder para conversar sobre cenários, a situação dos partidos da base, as perspectivas da oposição, o futuro político de alguns aliados, temas que Lula era capaz de discorrer por muito tempo, enquanto bebericava um bom destilado e fazia a discussão da relação de seu governo com a base aliada.

Dilma tentará exercer esse papel nos jantares e almoços que participará com os parlamentares daqui para frente, mas não dispensará a presença de Palocci, que aproveitará para se explicar. Luiz Sérgio também irá mais a jantares partidários sem a presidente. No almoço com Renan, por exemplo, os dois tentaram colocar os ¿pingos nos is¿. Juntos, avaliaram que qualquer um no lugar de Luiz Sérgio teria as mesmas dificuldades, não tanto pela força de Palocci, mas pelo fato de o Ministério de Relações Institucionais cuidar de assuntos que dizem respeito a outras pastas como a liberação de verbas.

Luiz Sérgio e Renan fizeram ainda um diagnóstico do PMDB, que tem muito mais aliados hoje no governo do que no passado, daí o fato de Renan dizer ao ministro que não acredita na criação de uma CPI para investigar Palocci. Inclusive no G-8, o grupo dos oito senadores independentes, há quem tenha mais afinidades com o Planalto do que com a oposição, caso, por exemplo, do senador Eunício Oliveira (PMDB-CE), ex-ministro de Lula. ¿Crises são normais, fazem parte do processo político. Tem que se estar preparado para essas coisas¿, disse Renan, que buscava uma ¿sintonia fina¿ dentro do PMDB, no jantar de ontem à noite na residência oficial do vice-presidente da República, Michel Temer, com 15 senadores.

O encontro entre Renan e Luiz Sérgio ocorreu menos de uma semana depois do café da manhã de Luiz Inácio Lula da Silva com os líderes no Senado. Naquela ocasião, um dos problemas apontados pelos líderes foi a falta de autonomia de Luiz Sérgio para atender os parlamentares. O próprio PT reclamou. Integrantes da tendência Construindo Um Novo Brasil (CNB) ¿ o grupo mais alinhado a José Dirceu e do qual Luiz Sérgio e o líder no Senado, Humberto Costa, fazem parte ¿ consideram que Luiz Sérgio tem um perfil para o cargo, mas não consegue exercer o seu papel porque está tudo centralizado nas mãos de Palocci. Luiz Sérgio não foi convidado para aquele café por puro esquecimento. Agora, ao que parece, todos se lembraram dele.

OAB defende licença de Palocci do cargo O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Ophir Cavalcante, defendeu ontem que o ministro Casa Civil, Antonio Palocci, se licencie de imediato do cargo até que explique de forma convincente o seu crescimento patrimonial em 20 vezes, nos últimos quatro anos. Ophir criticou a Controladoria-Geral da União (CGU) por não ter aberto investigação contra o ministro e disse ser favorável à criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar as denúncias. De acordo com o presidente da OAB, a entidade não tem poderes para interferir junto à Justiça na investigação do caso, mas, segundo ele, a Ordem tem o dever ¿cobrar posturas éticas¿ das autoridades públicas.