Título: Telhado de vidro no Senado
Autor: Sassine, Vinicius
Fonte: Correio Braziliense, 31/05/2011, Política, p. 3

Licenças ambientais concedidas pelo governo de Blairo Maggi (PR) levaram ao descontrole das queimadas em Mato Grosso, no fim de 2007. O fogo consumiu parques e reservas da Amazônia e do Cerrado. Levou diversas cidades a declararem estado de calamidade pública, cancelou aulas, superlotou hospitais públicos. Em Joinville (SC), o então prefeito Luiz Henrique da Silveira (PMDB) autorizou a retirada da vegetação de um mangue para a instalação de um loteamento privado, com 319 lotes. A Rua Guanabara foi prolongada e asfaltada à revelia de ordem judicial. Já o senador João Ribeiro (PR-TO) ergueu edificações à margem do lago da usina de Lajeado, a 55km de Palmas. As obras foram feitas numa Área de Preservação Permanente, levaram a desmatamentos ilegais e deram início a erosões à beira do lago.

As três ocorrências de crimes ambientais estão documentadas em investigações da Polícia Federal e do Ministério Público Federal. Citados como responsáveis pelos crimes, os senadores Blairo Maggi, Luiz Henrique e João Ribeiro têm foro privilegiado e passaram a ser investigados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) ¿ Luiz Henrique, inclusive, já é réu na ação penal. Os parlamentares vão apreciar o texto do Código Florestal Brasileiro, que deve chegar esta semana ao Senado. Aprovado na Câmara com permissão de atividades agrárias em APPs, anistia a desmatadores e dispensa de reserva em pequenas propriedades, o código será acompanhado de perto por Blairo e Luiz Henrique. O primeiro prepara emendas. O segundo deve ser o relator na Comissão de Constituição e Justiça.

Outros três senadores são suspeitos de infrações ambientais. Ivo Cassol (PP-RO) teve quatro áreas de suas fazendas embargadas pelo Ibama em razão de desmatamento de APP e reserva legal na Amazônia. O senador prepara emenda ao Código para garantir a transferência aos estados da possibilidade de regularização de APPs. Três áreas do senador Jayme Campos (DEM-MT) foram embargadas em Mato Grosso pelo mesmo motivo. E a senadora Kátia Abreu (ex-DEM-TO), presidente da Confederação Nacional da Agricultura, foi autuada pelo Ibama por desmatamentos ilegais. O filho dela, deputado Irajá Abreu (ex-DEM-TO), chegou a ter duas áreas embargadas.

No caso dos senadores que passaram a ser investigados no STF, o foro privilegiado impediu, até agora, punições. O crime ambiental citado na denúncia contra Luiz Henrique prescreveu neste mês, conforme decisão do ministro Dias Toffoli. A acusação de desobediência a uma ordem judicial, ao autorizar o loteamento sobre um mangue, permanece. Para o advogado do senador, Carlos Adauto Vieira, Luiz Henrique já não responde a acusação de crime ambiental. ¿Ele não tinha conhecimento da ilicitude desse ato.¿ Quando governador de Santa Catarina, Luiz Henrique sancionou o Código Ambiental do estado, questionado no STF.

As queimadas em Mato Grosso em 2007 levaram o juiz Julier da Silva, da 1ª Vara Federal do estado, a exigir abertura de inquérito pela PF para apurar os responsáveis. Perícias, imagens de satélite e licenças concedidas embasaram a responsabilização de servidores e do então governador, Blairo Maggi. O caso foi remetido ao Superior Tribunal de Justiça, por causa do foro privilegiado. A eleição de Blairo para o Senado levou a nova transferência, ao STF. ¿O estado não teve responsabilidade. Colocamos aviões e brigadistas no combate ao fogo¿, diz o senador. Sobre as licenças ilegais, Maggi afirma que os documentos foram suspensos. Durante a gestão de Blairo, dois secretários de Meio Ambiente foram presos pela PF por extração ilegal.

O inquérito contra João Ribeiro cobra explicações do governo de Tocantins e da prefeitura de Lajeado ¿ onde fica a chácara do senador ¿ sobre autorizações para obras irregulares à beira do lago. Ribeiro é investigado também por trabalho escravo numa fazenda no Pará envolvendo 38 trabalhadores. Segundo a assessoria dele, a irregularidade à beira do lago se resume à fossa de um banheiro que avança em APP. Sobre o trabalho escravo, a assessoria informa que o senador recorre da multa de R$ 760 mil.

¿Não sou bandido¿ Numa das regiões onde mais cresce o desmatamento da Amazônia, Alta Floresta (MT), três áreas rurais do senador Jayme Campos (DEM-MT) foram embargadas pelo Ibama. Jayme diz que foi ¿perseguição política¿ e culpa a ¿insegurança jurídica¿ gerada pelo Código Florestal em vigência. ¿Crio boi nas áreas e não sou bandido.¿ Já o senador Ivo Cassol (PP-RO), com quatro áreas embargadas em Rondônia, sustenta que os crimes foram em áreas vizinhas às suas. Nas propriedades da senadora Kátia Abreu (ex-DEM-TO), não há exploração de área de reserva legal, segundo ela.