Título: O PSDB daqui em diante
Autor: Coimbra, Marcos
Fonte: Correio Braziliense, 01/06/2011, Política, p. 6

Sociólogo e presidente do Instituto Vox Populi

Parece que o PSDB encerrou uma fase em que esteve voltado fundamentalmente para dentro, cuidando de suas desavenças. Precisa, agora, voltar-se para fora, assumindo seu posto de principal partido oposicionista.

No último sábado, o PSDB fez sua convenção nacional e, finalmente, deu um passo adiante. Depois de uma prolongada indefinição, escolheu seu caminho para o futuro. Senão o distante, pelo menos o próximo.

Era uma decisão aguardada desde novembro de 2010, quando o Brasil saudava o governo eleito e as oposições começavam a discutir que rumos tomariam depois da terceira derrota seguida para o PT. A demora de sete meses não lhe serviu de nada.

Na convenção, enfrentaram-se as duas correntes em que se dividem os tucanos. Serristas e aecistas mediram forças e os segundos venceram: o PSDB será dirigido por aliados do senador, restando ao ex-presidenciável um prêmio de consolação que, se pudesse, teria recusado. Depois de ter sido (quase) tudo de importante que há em nosso sistema político (deputado, senador, prefeito da maior cidade e governador do maior estado, ministro, secretário de estado, candidato a presidente por duas vezes ¿ em ambas bem votado), Serra assumiu um cargo inventado na undécima hora, apenas para que não ficasse de mãos abanando. Dirigirá o ¿Conselho Político¿ do partido.

O confronto entre apoiadores de um contra apoiadores do outro é típico de partidos como o PSDB. Se, nas legendas de quadros, o que importa são os notáveis, nada mais natural que vitória e derrota sejam personalizadas. Não foram ideias ou segmentos ideologicamente distintos que se enfrentaram, mas lideranças pessoais.

Já estava mais que na hora de a seção paulista deixar de dar seu rosto ao partido. Afinal, os três fracassos tucanos foram de candidaturas de políticos identificados com o estado, que tinham feito carreira em postos no Executivo e na representação parlamentar de São Paulo. Suas campanhas foram formuladas por equipes por lá treinadas, em linguagem inspirada na cultura dos embates locais. Embora acertassem em algumas coisas, mostraram-se pouco capazes de estabelecer uma boa comunicação com o eleitorado do restante do país.

Com a vitória, Aécio tornou-se o virtual candidato peessedebista à sucessão de Dilma. É claro que estamos longe da eleição e que muita água ainda vai correr por baixo da ponte até 2014. Mas ele já pode contabilizar a seu favor o resultado da convenção: nela, o partido deixou claro que não pretende voltar a escolher seu representante com base em pesquisas de intenção de voto. Ninguém duvida que Serra está e continuará na frente, tendo concorrido duas vezes. Mas o partido, sem suas habituais tergiversações, preferiu o mineiro: o único posto de destaque dos serristas é o tal lugar ¿honorífico¿ (salvo a Vice-Presidência, que caberá a Alberto Goldman).

Embora seja, talvez, cedo para dizer, parece, portanto, que o PSDB encerrou uma fase em que esteve voltado fundamentalmente para dentro, cuidando de suas desavenças. Precisa, agora, voltar-se para fora, assumindo seu posto de principal partido oposicionista, dizendo o que propõe para o Brasil e deixando claro em que difere e em que está de acordo com o governo.

Existe, para isso, uma saída fácil e outra nem tanto. Pode fazer como é praxe nas oposições tradicionais e, simplesmente, assumir o discurso do contra. Se o governo quer uma coisa, basta ser contrário. Se defende uma proposta, sequer a considerar, manifestando-se contra e votando para que não seja aprovada.

Há quem diga que foi isso que o PT sempre fez enquanto esteve na oposição e é assim que o governo Dilma deveria ser tratado. Seria o velho ¿olho por olho, dente por dente¿ ou, quem sabe, o ¿quem com ferro fere, com ferro será ferido¿.

São muitos os que defendem essa postura e ela tem suas justificativas. É difícil esquecer mágoas recentes.

Mas ela conflita com o que as lideranças mais relevantes do partido têm procurado. O ¿olho por olho¿ não combina com o projeto de um novo PSDB, capaz de falar de perto para um novo eleitorado.

Como pretender ser (e ser, de fato) um partido que representa as ¿novas classes médias¿, os segmentos modernos da população, mais conectados e sintonizados com as transformações contemporâneas, e votar igual aos segmentos mais reacionários do Congresso, como, por exemplo, no Código Florestal? Como se calar em questões de cultura e comportamento, tacitamente se aliando às bancadas conservadoras, apenas para não ficar do mesmo lado que o governo?

Não é se escondendo atrás de um oposicionismo fácil que o PSDB se tornará o que quer ser. É mais provável que quem tenha razão seja Fernando Henrique, com sua corajosa e moderna defesa da descriminalização do consumo de drogas leves. É avançando que o partido deve procurar seu novo lugar, não indo para trás.