Título: Entre a lei e os negócios
Autor: Prates, Maria Clara
Fonte: Correio Braziliense, 05/06/2011, Política, p. 8/9

Belo Horizonte ¿ A revelação de que o pagamento de pensão alimentícia à ex-mulher foi negociado em troca de um cargo público no Tribunal de Justiça de Minas (TJ-MG) é apenas a ponta do iceberg da intrincada vida pública, sindical e privada do desembargador Elpídio Donizetti Nunes, da 18ª Câmara Cível. Alvo do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), onde responde a processo administrativo por nepotismo, o magistrado é sócio da Faculdade Del Rey, o que é vedado pela Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman), e mantém estreitas ligações com outras empresas, todas elas parceiras da Associação Nacional dos Magistrados Estaduais (Anamages), fundada por ele em 2001 e sob sua presidência por 10 anos.

A exoneração, publicada na quinta-feira, de Fábio Antônio Klein da Silva do cargo de assistente judiciário do gabinete do desembargador confirma mais um troca-troca entre o público e privado. O servidor acumulava, até março, o expediente no gabinete de Donizetti com o de próspero empresário. Ele era sócio-fundador da empresa Aprobatum ¿ Centro Nacional de Qualificação de Pessoal Ltda., com fins lucrativos, e do Instituto Universitário Brasileiro Ltda. (Iunib), com sede no mesmo edifício. E, apesar de ser subordinado do magistrado, contou com a ajuda dele para tocar o negócio da área de ensino. Em uma publicidade da Livraria Aprobatum, ligada ao curso, o desembargador aparece assinando uma simulação de cheque em que oferece 50% de desconto àqueles que o apresentassem na compra de material didático. Abaixo da assinatura do magistrado, que também é garoto-propaganda da Iunib, aparece a informação: ¿Prof. Elpídio Donizetti, coordenador do Curso Aprobatum¿.

Segundo registros públicos, quando deixou o quadro societário do Iunib, o ex-assessor foi substituído pela então mulher do magistrado, Jussara Donizetti Nunes , que teria 90% das cotas da empresa. A saída de Fábio, em 21 de março de 2011, ocorreu no mesmo dia da entrada de Jussara. A troca no quadro societário, que deixou tudo em família novamente, não deve afetar a situação do ¿empregado¿ do Iunib, desembargador Elpídio, contratado como professor.

Proibição De acordo com a Loman, é vedado ao magistrado ¿exercer cargo de direção ou técnico de sociedade civil, associação ou fundação, de qualquer natureza ou finalidade, salvo de associação de classe, e sem remuneração¿. A proibição não impediu a atuação do desembargador, que ainda desprezou outra norma: ¿Exercer o comércio ou participar de sociedade comercial, inclusive de economia mista, exceto como acionista ou cotista¿. Segundo registro da Junta Comercial de Minas, o magistrado é sócio da União de Ensino Superior de Minas Gerais Ltda. (Uesmig), que tem o nome fantasia de Faculdade Del Rey, aberta em agosto de 2001.

Na Uesmig, o magistrado é sócio de Ivagner Pereira Júnior, responsável pela faculdade. Além dos registros públicos, ele nunca escondeu de ninguém o orgulho de ter Elpídio Donizetti no quadro societário da empresa. Em 2009, em entrevista a um jornal mineiro, Ivagner considerou como um dos trunfos da administração da Faculdade Del Rey ¿seus três sócios que atuam diretamente no dia a dia da instituição¿. ¿Os três (sócios) têm currículos para a posição que ocupam. Gustavo Magalhães é formado em direito, mestre e doutorando em direito, professor, empresário e procurador do município; Elpídio Donizetti é mestre em direito e desembargador; e Ivagner Ferreira tem formação em ciências contábeis, pós-graduado em consultoria e marketing.¿

Entenda o caso » O Sindicato do Servidores do Tribunal de Justiça de Minas entra com representação no Conselho Nacional e Justiça (CNJ) contra o desembargador Elpídio Donizetti por prática de nepotismo. Em 15 de outubro de 2010, ele nomeou sua ex-mulher Leila Nunes, servidora efetiva do Tribunal de Justiça mineiro, ao cargo comissionado de assessora, com salário de R$ 9,2 mil.

» Para se defender da acusação, o desembargador informa ao CNJ estar separado de Leila. Para comprovar a informação, o conselheiro pede o termo de separação ao TJ-MG e descobre nele uma cláusula que prevê a isenção do pagamento de pensão à ex-mulher durante o período em que ela ocupar o cargo de assessora.

» O relator do caso entende que a ¿atuação do desembargador, que entrelaça sua vida particular com sua posição como membro do TJ-MG, ofende a Lei Orgânica da Magistratura Nacional¿. O voto foi acompanhado pelos demais conselheiros por unanimidade.