Título: Exército de pensões
Autor: Maciel, Alice
Fonte: Correio Braziliense, 06/06/2011, Política, p. 4

Os cofres públicos bancam pensões de 87.065 filhas de militares das Forças Armadas. Só em dezembro, essas pensões, criadas há cinco décadas, custaram aos cofres públicos R$ 327,29 milhões, que representam em torno de 8,3% do total gasto com a folha de pagamento de pessoal (R$ 3,91 bilhões) do Ministério da Defesa. Considerando essa média mensal, o governo gasta, por ano, R$ 3,927 bilhões com essas pensionistas. Coincidência ou não, muitas das beneficiárias são solteiras convictas. Casadas perdem o benefício.

Medida provisória (MP) editada em 31 de agosto de 2001 extinguiu a regra instituída em 4 de maio de 1960 que dava às herdeiras solteiras, ainda que maiores de idade, o direito de receber a pensão vitalícia. Entretanto, a MP não acabou completamente com esse benefício. Somente estabeleceu que, para garantir a pensão vitalícia à família, os militares teriam de contribuir com 1,5% do soldo. Foi um alívio para filhas dos funcionários das Forças Armadas que sonhavam em concretizar o casamento. Isso porque os pais que passaram a pagar essa contribuição as livraram da possibilidade de ficar sem o benefício a partir da união civil. Pelas novas regras, o direito à pensão depende da contribuição e não está condicionado ao estado civil dos familiares beneficiados.

Parte das mulheres que não tiveram essa sorte, até hoje, mesmo morando com os parceiros ¿ algumas delas mães de família ¿, prefere se privar do casamento formal a abrir mão da pensão. O advogado especializado em direito previdenciário Lásaro Cândido da Cunha explicou que, a partir da MP de 2001, a cláusula que limita a pensão às filhas solteiras passou a valer apenas para as filhas que tinham adquirido o direito ao benefício antes da publicação da medida. Para as filhas de militares que optaram pela contribuição, a pensão vitalícia vale também após o casamento, apesar de os impactos da medida não terem sido medidos, ainda de acordo com o advogado. ¿Na época, não foi feito um estudo para estabelecer a alíquota¿, afirmou.

Achar uma entre as 87.065 beneficiárias que admita publicamente que não se casa para não deixar de receber a pensão vitalícia não é uma tarefa fácil. O Correio entrou em contato com 10 filhas de militares que recebem o benefício, mas nenhuma quis dar declaração aberta à reportagem. Na condição de que não fosse identificada, uma delas, de 45 anos, saudável, moradora de Belo Horizonte, contou que vive com o companheiro há 10 anos e recebe uma pensão no valor de R$ 6 mil. Ela até chegou a se casar no religioso, mas não concretizou a união em cartório para não perder a pensão. Para cuidar melhor dos dois filhos, ela optou por não trabalhar. Seu pai morreu pouco depois da edição da medida provisória e, pelas regras, ela já havia adquirido o direito ao benefício, desde que fosse solteira, já que ele não chegou a pagar a alíquota de 1,5% do soldo.

87.065 Quantidade de filhas de militares que recebem o benefício atualmente