Título: Desafio de erradicar a miséria
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Fonte: Correio Braziliense, 03/06/2011, Opinião, p. 20

Visão do Correio

Erradicar a pobreza talvez seja utopia. Mas erradicar a pobreza extrema é possibilidade factível. Depende, em primeiro lugar, de vontade política. Uma vez tomada a decisão, impõe-se traçar os rumos de curto, médio e longo prazo. Os programas daí derivados devem não só prestar socorro urgente a quem passa necessidades primárias, mas também apresentar portas de saída que permitam aos beneficiários andar com as próprias pernas.

O Brasil sem Miséria, lançado ontem pela presidente Dilma Rousseff, se propõe a resgatar 16,2 milhões de brasileiros miseráveis cuja existência envergonha o país que caminha a passos largos para ostentar o título de 7ª economia do mundo. O número divulgado pelo Planalto se baseia na renda per capita ¿ inferior a R$ 70 por mês. O contingente dos muito pobres tem endereço e idade. Mais da metade dele ¿ composta de menores de 20 anos ¿ encontra-se na Região Nordeste. Cerca de 40% desse público-alvo tem até 14 anos.

Três áreas merecerão atenção especial do programa ¿ transferência de renda, microcrédito e acesso à água. A Floresta Amazônica ganha enfoque especial. O Bolsa Verde, direcionado principalmente à população da Amazônia, destinará R$ 300 por trimestre às famílias que moram na região para que preservem a floresta. As áreas secas também mereceram olhar diferenciado. Recursos lhes serão reservados para a construção de cisternas e reservatórios. A medida, aliada ao microcrédito, pode incrementar a produção em pequenas propriedades rurais, hoje castigadas por impiedosas estiagens que levam ao êxodo da população desamparada e consequente inchaço das grandes cidades.

O Brasil sem Miséria aprofunda iniciativas do governo Lula da Silva. Amplia de três para cinco o limite de benefícios por família que integra o Bolsa Família. A previsão é incluir 1,3 milhão de crianças e adolescentes no programa. Não só: neste imenso país, há, com certeza, pessoas tão excluídas que ainda não foram alcançadas pelo programa de transferência de renda. O governo quer localizá-las e abrir-lhes a possibilidade de acesso a benefícios, mínimos que sejam, proporcionados pelo desenvolvimento. Mais: cursos de capacitação e acesso à energia elétrica para 257 mil famílias até 2014 estão também nos projetos.

Das palavras aos resultados, há longo caminho a percorrer. A abordagem transversal do problema é, sem dúvida, acertada. Mas exige eficácia na articulação. Um dos desafios: conseguir a adesão das três esferas do poder. Outro: lograr que os órgãos da administração federal falem a mesma língua e se encaminhem na mesma direção. A tarefa não é fácil. Exigirá acompanhamento e cobrança da presidente. Espera-se que o faça. Tanto no discurso de posse quanto em pronunciamentos à nação, Dilma Rousseff afirmou que a única fome admissível é a do conhecimento.