Título: Manobra contra embargos
Autor: Sassine, Vinicius
Fonte: Correio Braziliense, 07/06/2011, Política, p. 6

A cinco dias do fim do prazo para que produtores rurais regularizem áreas de preservação permanente (APPs) e de reserva legal, a senadora Kátia Abreu (ex-DEM-TO) prepara uma manobra para suspender os embargos de áreas desmatadas e ocupadas irregularmente pela agropecuária, principalmente nos estados da Amazônia. Presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA) e porta-voz da bancada ruralista no Senado, Kátia Abreu encaminhou ao líder do governo na Casa, senador Romero Jucá (PMDB-RR), a minuta de um decreto que, além de prorrogar o prazo para a regularização dos produtores, permite que eles voltem a usar áreas embargadas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).

A ação de Kátia Abreu é baseada na expectativa de prorrogação do prazo estabelecido no decreto nº 7.029, de 2009. A data final para a regularização ambiental é o próximo dia 11, conforme o decreto. Se o novo Código Florestal Brasileiro fosse aprovado a tempo no Senado, a medida perderia a validade e os produtores rurais que deixaram de averbar APP e reserva legal não entrariam na ilegalidade. O próprio Romero Jucá já pediu que a presidente Dilma Rousseff prorrogue o prazo, até que a proposta do novo código seja apreciada pelos senadores.

A estratégia de Kátia Abreu é buscar novas benesses aos produtores caso a presidente Dilma decida prorrogar o prazo para a regularização ambiental dos produtores. Um outro decreto, de 2008, suspendeu até dezembro de 2009 embargos impostos pelo Ibama, por causa de desmatamentos ilegais. A Amazônia ficou fora dessa suspensão, ou seja, o Ibama continuou a embargar propriedades ocupadas ilegalmente. Na minuta de decreto encaminhada a Romero Jucá, Kátia Abreu tenta retomar essa suspensão dos embargos ¿ por um prazo não determinado no documento que ela entregou ao líder do governo ¿ e incluir a Amazônia na decisão. A medida seria acompanhada da prorrogação do prazo para averbação de reservas legais.

A suspensão dos embargos pode beneficiar a família da própria senadora. O filho dela, deputado Irajá Abreu (ex-DEM-TO), tem duas áreas embargadas pelo Ibama numa fazenda em Tocantins. A senadora responde a dois autos de infração do órgão por desmatamento ilegal. Somente em Mato Grosso, onde a devastação da Amazônia voltou a aumentar exponencialmente em abril, o Ibama já embargou 26,4 mil hectares desde janeiro deste ano.

Contramão A bancada ruralista deu uma mostra de força na Câmara ao aprovar o relatório do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) e a Emenda nº 164, do PMDB, que permite qualquer atividade ¿agrossilvopastoril¿ em APPs e transfere aos estados a possibilidade de regularização dessas áreas. Agora, no Senado, a bancada já prepara emendas ao texto. Kátia Abreu afirma que, se houver alteração significativa na proposta aprovada pela Câmara, vai apresentar emenda para reforçar a possibilidade de os estados terem seus próprios programas de regularização ambiental. ¿O desmatamento está caindo, o Brasil vai cumprir as metas assumidas, e isso é graças aos órgãos ambientais estaduais. É preciso acabar com o grande negócio de licenciamento ambiental existente no país¿, diz a senadora.

Uma pesquisa divulgada ontem pela Universidade de Brasília (UnB) vai na direção contrária do que afirma Kátia Abreu. Segundo o estudo, o texto do novo código aprovado na Câmara pode provocar desmatamento 47% maior do que o previsto para 2020. Mantida a legislação, e com uma fiscalização eficaz, a devastação seria 25% menor nos próximos dez anos. O estudo levou em conta 11 municípios de Mato Grosso e Pará, na região da BR-163.

Colaborou Igor Silveira

Intenção de segurar O governo pode não prorrogar o prazo do decreto que obriga a regularização ambiental por parte dos produtores rurais. A partir do próximo dia 12, esses produtores poderão ser notificados por órgãos de fiscalização, mas não multados, segundo interpretação de técnicos do Ministério do Meio Ambiente (MMA). Eles ainda teriam mais 180 dias para averbar a reserva legal e, só então, poderiam ser autuados. Esse detalhe pode fazer com que a presidente Dilma Rousseff não mexa no decreto. Um senador petista ouvido pelo Correio admitiu que a estratégia do governo na Casa é fazer com que a tramitação do novo Código Florestal se arraste por um tempo. Para isso, estão previstas algumas reuniões em comissões sob o pretexto de discutir melhor o texto.