Título: Batalha morro acima
Autor: Rothenburg, Denise ; Sassine, Vinicius
Fonte: Correio Braziliense, 08/06/2011, Política, p. 2

As revelações sobre o crescimento patrimonial do ministro da Casa Civil abriram uma janela de oportunidade para a erupção de todas as insatisfações. Sem o ministro, a presidente livra-se de um problema imediato, mas sai algo mais fraca. Diante do PT e também diante da oposição e da opinião pública

O ministro-chefe da Casa Civil não suportou o bombardeio e está fora. E desta vez ninguém deve culpar a oposição. Pois a pressão maior para tirá-lo do cargo veio exatamente do PT. Nos últimos dias, ele vinha recolhendo apoio fora do partido, especialmente no PMDB, mas não foi suficiente nem deu tempo. O PT abandonou o correligionário por não achar razoável pagar novamente uma fatura pesada, e desta vez sem que a operação a defender pudesse ser abrigada sob um guarda-chuva estritamente partidário. Viu também na troca na Casa Civil uma janela de oportunidade para ampliar o próprio poder.

Os petistas desde sempre enxergaram o governo Dilma Rousseff como nova etapa no projeto político. Sem Luiz Inácio Lula da Silva a concentrar todas as luzes e atrair todos os fluidos do poder, eram chegadas a hora e a vez da legenda. Foi dito durante a campanha eleitoral. Mais de uma vez.

Mas a constituição do núcleo governamental acabou não confirmando a tese. A dobradinha entre a presidente da República e seu ministro da Casa Civil funcionou nestes quase seis meses como mecanismo de concentração do poder presidencial.

As reclamações na base política são múltiplas e a novidade na comparação com o governo anterior é que desta vez as queixas vinham incluindo também o PT. Um exercício desafiador nos últimos tempos em Brasília é encontrar alguém da base satisfeito com o governo.

Assim, as revelações sobre o crescimento patrimonial do ministro da Casa Civil ¿ acontecido antes de ele ser ministro da Casa Civil ¿ abriram uma janela de oportunidade para a erupção de todas as insatisfações. E foram o cenário das primeiras semanas de turbulência, até que o PMDB, tardiamente, passou a achar que seria melhor não mudar.

Esse apoio valioso mas tardio não foi suficiente. Faltou exatamente o PT. O ministro tinha respaldo na bancada da Câmara dos Deputados, mas o PT do Senado ontem recusou uma proposta de moção favorável à permanência dele no cargo. O ministro tampouco pôde contar com ajuda do comando partidário. Sem o ministro, a presidente livra-se de um problema imediato, mas sai algo mais fraca. Diante do PT e também diante da oposição e da opinião pública. Recompor a força talvez venha a ser batalha morro acima.

Rio 20 A presidente da República lançou ontem o ambicioso projeto dela para a Rio 20, a Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável. No evento palaciano que marcou o lançamento, Dilma Rousseff voltou à retórica de não negociar com o desmatamento.

Tem sido um discurso recorrente de sua excelência, e pelo visto vai durar.

Vai durar porque pode render. A Dilma Rousseff ministra de Minas e Energia e depois chefe da Casa Civil era a face do desenvolvimentismo no governo Lula. Por causa dessa característica colecionou muitos apoios.

E também acumulou atritos com o lobby ambiental. Entrou em choque com a então ministra Marina Silva, que no fim deixou de ser ministra, o governo e o PT para virar candidata do PV ao Planalto.

É curioso que a agenda da candidata que perdeu tenha passado a comandar, mas são coisas da política. O desenvolvimentismo agora é ¿out¿.

O PT e Dilma andam preocupadíssimos com a erosão da imagem num segmento social mais moderno, mais antenado em pautas ditas contemporâneas. Assustaram-se com a votação de Marina no primeiro turno e com a ameaça de se formar um campo majoritário antigoverno, a partir da adesão maciça das classes médias.

Sobrou então para os ¿desmatadores¿. Um inimigo conveniente, porque já bastante demonizado. E toca a discursar, mesmo que a vida real caminhe noutro sentido. Mesmo que o próprio governo tenha apoiado na Câmara dos Deputados medidas para facilitar, por exemplo, a vida de pequenos proprietários que cultivam ou criam gado em áreas de preservação permanente.

Tecnicamente são ¿desmatadores¿, mas o Planalto precisou negociar as reivindicações deles. Assim como precisará negociar no Senado.