Título: Brasil resiste a condenar a Síria
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Fonte: Correio Braziliense, 10/06/2011, Mundo, p. 15

O ministro Antonio Patriota sugeriu ontem, em Nova York, que o Brasil poderá mais uma vez divergir dos Estados Unidos e de seus aliados europeus, no Conselho de Segurança das Nações Unidas, na votação de uma resolução condenando o regime da Síria pela violência contra manifestantes desarmados. Em março passado, o governo brasileiro alinhou-se com Rússia, China e Índia (parceiros na articulação dos Brics), além da Alemanha, e se absteve na aprovação da resolução pela qual o conselho autorizou a intervenção militar na Líbia, em defesa da população civil.

Falando à imprensa na sede da ONU, onde discursou na reunião de alto nível sobre o combate à Aids, o chanceler brasileiro deixou evidentes as reservas do governo Dilma quanto à eficácia de uma condenação ao governo do presidente Bashar Al-Assad. "A Síria é muito central quando se analisa a estabilidade no Oriente Médio", disse Patriota.

"Eu penso que a última coisa que queremos ver ou fazer é contribuir para exacerbar tensões naquela que consideramos uma das regiões mais tensas do mundo."

A posição brasileira acompanha o tom da Índia e da África do Sul (que também integra o Brics), porém é mais cautelosa que a da Rússia e da China ¿ ambos os países manifestaram forte oposição ao projeto de resolução, patrocinado por França e Reino Unido, com apoio dos Estados Unidos.

O ministro aproveitou para questionar os resultados da intervenção na Líbia e reiterar as reticências do Brasil à solução militar. "Existe uma preocupação sistêmica, eu diria, sobre a implementação da Resolução 1.973. Os membros do conselho deveriam observar estritamente a linguagem e o espírito nos quais ela foi adotada", ponderou Patriota.

"Penso que preocupações a respeito da implementação dessa resolução também estão influenciando a forma como as delegações olham para outras medidas que podem afetar outros países da região, e a Síria em particular." Em especial, o chanceler brasileiro apontou ainda a ausência de apoio no mundo árabe a uma ação contra Damasco, ao contrário do que ocorreu no caso líbio, quando a Resolução 1.973 foi a votação.

O Conselho de Segurança começou a debater ontem o projeto condenando a Síria, que poderá voltar à pauta do organismo mais elevado da ONU a pedido da Agência Internacional de Energia Atômica. Por 17 votos contra seis, além de 11 abstenções, a junta governativa da AIEA decidiu relatar ao conselho as suspeitas sobre a Síria por ter mantido uma instalação nuclear em atividade sem informar o órgão. A existência da unidade veio a público quando ela foi destruída em um ataque aéreo israelense, em 2007.

Líbia Uma missão do Conselho de Direitos Humanos que visitou a Líbia no fim de abril concluiu que pelo menos 10 mil pessoas morreram no país desde o início da rebelião contra o ditador Muamar Kadafi, em fevereiro. O chefe da delegação, Cherif Bassiouni, afirmou que foram encontrados indícios de crimes de guerra cometidos pelas forças governistas, incluindo ataques a civis e a missões humanitárias, mas relatou transgressões cometidas também pelos rebeldes.

Reunidos em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos, para discutir o futuro de uma Líbia sem Kadafi, os países que participam da ação militar ou a apoiam renovaram promessas de ajuda à oposição. A Itália ofereceu US$ 586 milhões, incluindo fornecimento de combustíveis. A França prometeu liberar US$ 420 milhões em receitas de exportação de petróleo líbio, congeladas em obediência a resoluções do Conselho de Segurança. Os rebeldes pedem US$ 3 bilhões para os próximos quatro meses.