Título: Dinheiro tem; atividades, não
Autor: Rizzo, Alana ; Maciel, Alice
Fonte: Correio Braziliense, 13/06/2011, Política, p. 2

Programa de qualificação de jovens para o mercado de trabalho distribuiu R$ 121 milhões para ONGs e prefeituras em 2011, mas apresenta problemas em alguns casos, como turmas fantasmas e falta de alunos

Formosa (GO), Cidade Ocidental (GO) e Ribeirão das Neves (MG) ¿ Reformulado em 2007, o Programa Nacional de Inclusão de Jovens está longe de cumprir a promessa de inclusão social e de garantir o primeiro emprego. Cursos profissionalizantes que não funcionam, turmas fantasmas, professores despreparados e até aqueles que nunca apareceram, além de atividades sem caráter educacional, são algumas das situações repetidas pelo programa, que só no ano passado recebeu mais de R$ 895 milhões. Este ano, já foram investidos R$ 121 milhões, segundo dados do Portal da Transparência do governo federal.

Os jovens representam mais da metade dos 16,2 milhões de miseráveis brasileiros. Com renda familiar inferior a R$ 70 por mês, eles são foco do recém-lançado plano Brasil sem Miséria, que promete ampliar a oferta de serviços públicos e melhorar a distribuição de renda. O programa tem a tarefa de atender jovens da cidade, da zona rural, beneficiários do Bolsa Família e aqueles que não conseguiram terminar os estudos. A meta é prepará-los para o mercado de trabalho e aproximá-los dos serviços públicos.

O Projovem está dividido em quatro módulos: Trabalhador, Urbano, Adolescente e Campo (veja quadro). A verba é transferida dos ministérios para as prefeituras, que executam as ações. Em alguns casos, ONGs recebem o dinheiro.

Foi o que ocorreu em Formosa, distante 78km da Esplanada dos Ministérios, onde a Confederação Nacional dos Evangélicos do Brasil (Conae) ficou responsável por oferecer cursos de capacitação para jovens entre 18 e 29 anos. A proposta incluía aulas de administração, beleza, construção, turismo e vestuário, de acordo com dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). As aulas deveriam ajudar os jovens a conseguir um emprego, mas, segundo a administração municipal, o convênio só rendeu "dor de cabeça".

Segundo o Ministério do Trabalho, o contrato com a prefeitura foi firmado em 31 de dezembro de 2009 e deveria durar até o próximo dia 30. No entanto, em uma das escolas onde o curso teria que funcionar, a informação é de que ninguém aparece no local desde o ano passado. Os poucos jovens estudavam à noite e ocupavam, no máximo, duas salas de aula. A oferta de cursos diversificados também não se confirmou. A lista de presença e a frequência dos estudantes ¿ o que garante uma bolsa mensal de R$ 100 ¿ é outra caixa-preta. Constam 900 jovens no cadastro do ministério, mas na cidade ninguém sabe informar ao certo quem fez o curso, quem estava na lista e quem já conseguiu emprego. Uma das obrigações do Projovem trabalhador é integrar pelo menos 30% dos alunos ao mercado de trabalho. A direção da escola estadual reclama dos transtornos causados pela entidade e afirma que os dirigentes sumiram. A reportagem também não conseguiu localizar os representantes da entidade.

Em 2010, mais de R$ 740 mil foram transferidos para a conta da prefeitura. Este ano, R$ 611 mil. A prefeitura confirma que não há curso em funcionamento do Projovem Trabalhador e transfere a responsabilidade das aulas para a entidade. "Nem sabia que tinha dinheiro este ano. Deve ser para pagar alguma coisa do ano passado", afirma a secretária de Promoção Social, Sibele Saad. "Nós queremos continuar o projeto sem a empresa."

Diversão Em Cidade Ocidental, a aula de quarta-feira do Projovem Adolescente transformou-se em uma partida de pebolim (mais conhecido como totó entre os estudantes), o que não é raro. A presença da reportagem levou um monitor voluntário a ensaiar alguns passos de dança com os três jovens do programa. O Projovem Adolescente funciona em uma casa, destinada ao Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti). Jovens dividem o pequeno espaço com crianças. Também aproveitam o transporte escolar, a merenda e os instrutores do Peti, apesar da prefeitura ter cadastrado no Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) nove turmas com 225 estudantes. "Muita gente desistiu. Eles mudaram o espaço, tiraram algumas aulas", explica Aline Batista, de 18 anos. Ela afirma que continua participando do programa por causa do curso de violão. "Quando tem, é muito bom", conta. O irmão dela tem outra motivação: "É melhor vir para cá do que lavar vasilha em casa", afirma Marcos Batista, de 19 anos. Os dois moram no Jardim ABC, a 17km do centro da cidade.

O Correio tentou falar com o prefeito. Porém, os telefones da administração municipal não atendiam, no entanto, a coordenação do programa na cidade admite falhas e diz que o principal problema é a evasão dos jovens. O Projovem Trabalhador também não está mais funcionando na cidade. A informação é de que as turmas terminaram e que não está definido se o programa irá continuar. Segundo o Ministério do Trabalho e Emprego, 750 jovens deveriam fazer cursos de administração, esporte e lazer, serviços domiciliares e transporte. Em 2010, a prefeitura recebeu R$ 169 mil. Este ano, R$ 509.753.