Título: Conversão do Cespe em empresa pública
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Fonte: Correio Braziliense, 12/06/2011, Opinião, p. 18

Quanto mais a sociedade se empenha em exigir racionalidade e transparência nas atividades cometidas a entidades oficiais, mais avançam medidas que a contrariam. Cabe incluir no desapreço à opinião da coletividade a proposta do Conselho Universitário da Universidade de Brasília (Consuni) para transformar o Centro de Seleção e Promoção de Eventos (Cespe) em empresa pública. Argumenta que a permanência do atual modelo do órgão comprometeria a gestão de processos relativos ao Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e ao Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade), entre outros.

Suponha-se que o diagnóstico, a despeito da notória inconsistência, retrate com fidelidade a ineficácia do Cespe. Suponha-se, também, que se tornou indispensável removê-la. Então, seria o caso de recorrer a ações administrativas e aos instrumentos de renovação operacional para a correção das deficiências. Não se pode admitir como princípio lógico que, ante falhas na execução burocrática ou suspeitas de irregularidades, entes da administração estatal só possam corrigir tais disfunções se convertidos em empresas públicas.

Render homenagem a entendimentos da espécie ¿ e aplicá-los ¿ acabaria por transformar em imensa empresa pública o estamento governamental, tantos são os desacertos que o desqualificam. A posição do Consuni parece revelar, apenas, inapetência para enfrentar desafios de forma mais dinâmica. Daí buscar saídas automáticas e menos trabalhosas para os problemas. Parece, também, não ter avaliado os efeitos nefastos do insólito despacho do Cespe para estrutura vulnerável a apetites condenáveis.

Na condição de empresa pública, caso prospere a iniciativa do Consuni, o Cespe vai incorporar-se a tantas outras que servem, em primeiro lugar, como cabides de empregos. Aí, sim, o descaso e a incompetência se apresentariam como risco incontornável e previsão de graves distorções funcionais. A moralização dos concursos públicos, objeto principal da Concursobrás, como é conhecido o Cespe, ficará em segundo plano. O oportunismo, o político e o das conveniências inconfessáveis de dirigentes, tratará de perverter trabalho relevante para o sistema educacional.

A matéria ainda vai ser apreciada pelos ministérios da Educação e do Planejamento e, depois, ouvida a Casa Civil da Presidência da República. Os autores da inovação esdrúxula pretendem viabilizá-la mediante medida provisória. Resta aguardar que, inconveniente como é e ofensiva à garantia da lisura e da transparência, seja rejeitada desde logo. Em última instância, caberá ao Congresso dar a palavra final ¿ com a atenção voltada para os interesses superiores do país, espera-se.