Título: Promessa de aliar o técnico e o político
Autor: Lyra, Paulo de Tarso ; Rothenburg, Denise
Fonte: Correio Braziliense, 14/06/2011, Política, p. 2

Discursos de Dilma e da nova ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, sinalizam a conciliação com o Congresso. Base do governo, porém, cobra mais do que cargos e nomeações: quer peso nas decisões estratégicas

A presidente Dilma Rousseff e a nova ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, reforçaram ontem, durante a posse da petista, o discurso conciliador e a importância de um novo modelo de negociação do governo com o Congresso. Dilma reconheceu que "a continuidade das grandes transformações necessárias ao Brasil só pode nascer da negociação". E ressaltou que o estilo técnico não pode sobrepor o debate político. Ideli pediu a Deus juízo, chamou os líderes na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), e do Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), de "meus queridos". Prometeu que os "acordos existem para serem cumpridos", mas também devem ser "precedidos de muita negociação". Na tentativa de afastar o perfil de "trator" pelo qual ficou conhecida durante os tempos de CPI do Mensalão, Ideli prometeu inaugurar um novo estilo a partir da posse de ontem. "Sempre ganhei mais batalhas conciliando que divergindo. Serei firme nos princípios e afável na abordagem", disse.

Os discursos buscam reverter a desconfiança que os partidos aliados têm em relação ao novo perfil da articulação política do governo. Líderes do PMDB admitem que, até o momento, não foi possível perceber mudança concreta. Para eles, as promessas de liberação de emendas e cargos são importantes, mas insuficientes, e o novo modelo precisa ir além: os aliados querem ter peso maior na definição das políticas de governo. "Todo mundo tem inveja de uma base composta por 70% dos parlamentares do Congresso. Mas o governo parece estar querendo destruir essa maioria folgada", ressaltou um articulador do PMDB no Senado.

Ideli participou ontem, pela manhã, da primeira reunião oficial com a presidente Dilma, na qual foram traçadas as prioridades para o Congresso. Além das duas, estiveram presentes a chefe da Casa Civil, ministra Gleisi Hoffmann, e o secretário-geral da Presidência, Gilberto Carvalho. O vice-presidente da República, Michel Temer, contudo, não participou do encontro, deixando claro que o PMDB ainda não faz parte do núcleo decisório. "Nós precisamos de alguém que faça uma ponte conosco, não que sirva simplesmente para defender a Dilma das nossas reclamações", protestou um aliado de Temer.

Sintonia fina Apesar das ressalvas, o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), defende que seja dado um voto de confiança à nova ministra. "Prefiro dizer que o governo está convergindo, ampliando a relação com o Congresso, fazendo a sintonia fina." Jucá participou, após a cerimônia de posse, de uma reunião com Ideli e o líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), para fazer uma radiografia das pendências solicitadas pelos aliados. No encontro, Ideli foi avisada que prometer a liberação de R$ 250 milhões em emendas é apenas um paliativo, já que a demanda represada supera a casa dos R$ 2 bilhões.

Com a economia em fase de ajuste, um gradual controle da inflação e a necessidade de apaziguar a crise com a base aliada, o governo não poderá mais ancorar-se no discurso de contingenciamento das emendas parlamentares. Mas o Planalto não quer fazer essa transição de afogadilho e sinaliza que as primeiras liberações deverão acontecer em julho. A demora poderá custar caro, já que o Congresso tem matérias delicadas e importantes para o governo e que precisam ser votadas neste mês, antes do recesso parlamentar.

O primeiro desafio ocorre amanhã, quando o governo pretende votar a Medida Provisória nº 527, que cria a nova Secretaria de Aviação Civil. A MP servirá, também, para flexibilizar as regras de licitação para as obras da Copa de 2014(leia mais na página 5). O governo também tem outros grandes desafios na Casa: a PEC nº 300, que equipara o salário de bombeiros e policiais militares aos vencimentos das categorias na União e a Emenda Constitucional 29, que define os percentuais de gastos da União, estados e municípios com Saúde (leia mais na página 3). Líderes aliados reconhecem a possibilidade concreta de derrota do Executivo nas duas matérias.

Ideli teria hoje uma chance de conversar com os deputados, no almoço promovido por Vaccarezza todas as terças com os líderes dos partidos aliados na Câmara. Mas a aproximação terá que esperar. Ela foi convocada pela presidente Dilma para participar de um almoço com senadores do PR e, amanhã, com senadores do PP. A ministra resolveu reunir-se novamente com Vaccarezza, no fim da noite de ontem, para levar aos deputados as propostas para o distensionamento no diálogo.