Título: Senado repassa pepino à União
Autor: Sassine, Vinicius
Fonte: Correio Braziliense, 17/06/2011, Política, p. 6

O Senado precisou de 26 anos para dar início ao processo de desocupação de 13 apartamentos em Brasília designados irregularmente a funcionários da Casa. Desses imóveis, 11 permanecem ocupados, três deles desde 1985. Entre os servidores agraciados com os apartamentos, três são comissionados e dois já não estão na folha de pagamento do Senado. Mesmo assim, seguem morando nas residências que fazem parte de uma "reserva técnica", teoricamente destinadas a ser apartamentos funcionais para os senadores. A situação é tão esdrúxula que chegou a motivar uma ação na Justiça movida pela ex-mulher de um dos ocupantes dos imóveis. Ela reivindica um dos apartamentos, que pertencem à União e estão há décadas cedidos ao Senado.

A Mesa Diretora da Casa decidiu ontem devolver os 13 imóveis à União, que passará a ser a responsável pelos inquilinos. A desocupação deve ser resolvida na Justiça. Praticamente todos os ocupantes dos apartamentos, que ficam em diferentes quadras na Asa Norte e na Asa Sul, foram indicados por senadores ou por diretores influentes da Casa. O primeiro-secretário, senador Cícero Lucena (PSDB-PB), não deu qualquer detalhe sobre como será feita a devolução dos imóveis. Responsável pela proposta, aprovada pela Mesa Diretora, o parlamentar limitou-se a dizer que o Senado "não tem obrigação" com os apartamentos. "Eu não tive a preocupação de saber quem são essas pessoas."

Ex-funcionários O Correio apurou quem são os 11 inquilinos dos imóveis, que são espaçosos, parte deles com três quartos, mas de qualidade inferior aos ocupados pelos senadores. Dois deles não trabalham mais no Senado. Um ocupou o cargo de motorista de um senador na década de 1990 e outro recorreu à Justiça para garantir sua permanência no apartamento. O caso ainda não foi resolvido e, enquanto isso não ocorre, o ex-servidor continua morando no local. Outros seis funcionários, entre membros da Primeira-Secretaria, do Serviço de Atendimento aos Parlamentares, da Polícia Legislativa, da Secretaria de Engenharia e do gabinete de um senador, são efetivos da Casa. Alguns casos chamam a atenção.

Uma das servidoras está num dos apartamentos desde 1985, três anos antes de ela chegar oficialmente ao Senado. Hoje, chefia um setor do Congresso. Entre os efetivos, há ainda funcionários da Primeira-Secretaria, do Serviço de Atendimento aos Parlamentares, da Polícia Legislativa, da Secretaria de Engenharia e do gabinete de um senador. O imóvel ocupado mais recentemente passou a ser habitado em 2006. O funcionário está no Senado desde 1980.

Completam a lista três comissionadas que trabalham nos gabinetes de três senadores. Uma delas ocupa o apartamento funcional desde 2003, enquanto seu contrato mais recente com o Senado é de 2007. Outra está há 26 anos no imóvel ¿ 18 a mais do que o tempo de seu último compromisso, ainda em vigor. A terceira passou a trabalhar no gabinete de um senador em 2003, mesmo ano em que ganhou as chaves de um dos imóveis sob a responsabilidade do Senado.

Apadrinhados O Senado possui 72 imóveis destinados oficialmente aos senadores. Os apartamentos ficam em três blocos na 309 Sul. As outras 13 unidades, que serviriam como uma "reserva técnica" em caso de ocupação integral dos apartamentos funcionais, passaram a ser loteadas entre servidores apadrinhados por diretores e senadores influentes na Casa.

No início desta legislatura, a Terceira-Secretaria da Mesa Diretora começou a fazer um levantamento dos imóveis funcionais à disposição do Senado. O órgão identificou os espaços ocupados irregularmente pelos servidores e comunicou o fato à Primeira-Secretaria, mas não foi encontrada resolução ou normativa que permita a ocupação de imóveis funcionais por servidores. Essa prerrogativa existe apenas para os senadores. A situação desses apartamentos entrou na pauta da reunião da Mesa Diretora de ontem. A decisão foi pela devolução à União.

A volta das "rachadinhas"

A Mesa Diretora do Senado aprovou ontem uma resolução que faz concessões às bancadas estaduais na liberação de emendas parlamentares, aproximando-as das chamadas "emendas rachadinhas". Uma resolução de 2006 proibiu as "rachadinhas", emendas globais fatiadas posteriormente para diferentes municípios e diversas obras. Essa divisão levou a desvios de recursos e a vários escândalos de corrupção. A regra aprovada em 2006 obriga que a emenda seja destinada a apenas uma obra, numa única cidade. Na resolução validada ontem, passam a ser permitidas transferências para diferentes obras dentro de um mesmo programa. Na Câmara, a Mesa acatou requerimento do deputado José Priante (PMDB-PA) para a instalação de CPI destinada a investigar denúncias de irregularidades no repasse e na destinação dos recursos da Compensação Financeira sobre Exploração de Recursos Minerais (CFEM).