O presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, defendeu ontem a independência da Corte em relação ao Palácio do Planalto, mesmo depois de o PT ter indicado a maioria dos ministros. O ministro Gilmar Mendes disse, em entrevista publicada na segunda-feira, que era importante a Corte não se tornar “bolivariana” para “chancelar o que o governo quer”. Para Lewandowski, não existe risco. “Não há bolivarianismo”, disse ele em um café com jornalistas. “Não há vinculação com o partido do Palácio do Planalto.”
A presidente Dilma Rousseff indicará um novo ministro ao tribunal para a vaga deixada por Joaquim Barbosa, que foi o relator do mensalão e contribuiu para que figuras históricas do PT fossem parar na cadeia por corrupção. Com as aposentadorias próximas de Celso de Mello e Marco Aurélio Mello, nomeados por indicação de José Sarney (1985-1990) e Fernando Collor (1990-1992), Dilma e o ex-presidente Lula acabarão responsáveis por indicar 10 dos 11 ministros da Corte até 2018. Só restaria Gilmar Mendes, que chegou ao posto pelas mãos de Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Em entrevista à Folha de S.Paulo, ele disse que a possibilidade de uma Corte submissa ao governo é algo que “tem de ser avisado e denunciado”.
Ontem, Lewandowski rechaçou a possibilidade. “A história do Supremo não tem demonstrado isso”, afirmou. O próprio Joaquim Barbosa, algoz dos petistas no mensalão, foi indicado pelo ex-presidente Lula. Ele também indicou Cézar Peluso e Carlos Ayres Britto, criticados pelos governistas nas redes sociais por votos duros contra os réus no esquema de pagamento de propinas para compra de apoio político no Congresso. Lewandowski, que foi o revisor do mensalão, costumava ter posições divergentes de Barbosa e votou pela absolvição do ex-ministro do governo Lula José Dirceu no crime de corrupção ativa. “O STF se orgulha muito dessa independência enorme que os ministros têm com relação aos presidentes que os indicaram”, disse o presidente do Supremo. “Essa é a história do STF.”
Políticos nas turmas
O presidente indicou que o tribunal pretende manter o julgamento de políticos nas turmas do STF, onde não há transmissão ao vivo dos julgamentos para o público. Só é possível observar as sessões pessoalmente ou em computadores instalados dentro do tribunal. Além disso, só os presidentes das Mesas do Congresso podem ser julgados no plenário, após decisão dos ministros tomada em maio.
A Câmara dos Deputados ingressou com uma ação direta de inconstitucionalidade para que os julgamentos voltem a ser feitos apenas no plenário. Lewandowski afirma que, nas conversas que teve com colegas, não percebeu a disposição de mudar a decisão. “Existe alguma isonomia entre um parlamentar comum e o chefe de um poder?”, questionou ele.
Ele também rebateu a crítica da condenação do deputado Protógenes Queiroz (PCdoB-SP), que foi feita por apenas três ministros na turma. “Temos uma Corte Suprema em que os membros têm reputação ilibada e notável saber jurídico, é excepcional. Há presunção de ter três notáveis que julgaram aquela pessoa”, disse Lewandowski
Romeu Queiroz pede prisão domiciliar
Sem pagar nenhum centavo da multa de mais de R$ 1,26 milhão por ter sido condenado no mensalão, o ex-deputado Romeu Queiroz (PTB-MG) pediu para ser transferido para o regime aberto, que, geralmente, concede direito à prisão domiciliar. O pedido chegou ao Supremo anteontem com uma certidão datada no mesmo dia confirmando o calote, fato já revelado pelo Correio.
Queiroz foi condenado a 6 anos e 6 meses de detenção por corrupção passiva, mas até hoje não pagou a dívida, segundo a Vara de Execuções Penais de Ribeirão das Neves (MG). O ex-deputado dorme na cadeia à noite e trabalha de dia no escritório de sua empresa. O Ministério Público estadual diz que ele fez um acordo para pagar o débito em 15 vezes de R$ 84 mil a partir de 1º de outubro, mas ainda não começou a amortizar a dívida.
Em ação de execução, a promotoria pede a correção monetária dos valores, que estão atualizados apenas até maio, e a intimação para que Queiroz pague tudo em 10 dias ou apresente bens para garantir a cobrança. Se não fizer isso, o Ministério Público pede que a Justiça penhore os bens do réu do mensalão. O advogado do ex-deputado, Marcelo Leonardo, não pôde atender as ligações da reportagem.
Dirceu deixa emprego
Depois de ser autorizado a cumprir pena em regime aberto na última terça-feira, o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu (PT) deixou de trabalhar em escritório de advocacia em Brasília para tentar reestruturar a empresa de consultoria. De acordo com a lei, Dirceu tem 90 dias para informar a Justiça sobre o novo trabalho. Condenado por corrupção ativa no julgamento do mensalão, Dirceu cumpre pena de 7 anos e 11 meses, da qual passou 354 dias na cadeia.
Críticas à auditoria
O presidente do STF, Ricardo Lewandowski, criticou a auditoria nas urnas pedida pelo PSDB à Justiça Eleitoral. Anteontem, o Tribunal Superior Eleitoral negou formar uma comissão para conferir o resultado nas eleições, mas permitiu aos tucanos obter dados das máquinas para, se quiserem, fazer uma fiscalização à parte. Para Lewandowski, o TSE agiu de maneira correta e as urnas são “absolutamente invulneráveis”.
Ele rechaçou o questionamento da oposição sobre a segurança do equipamento. “Neste mesmo segundo turno foram eleitos vários governadores também, e muitos governadores da oposição”, disse ele, que já presidiu o TSE. “Vai impugnar como? Todas as urnas? Algumas urnas? É a mesma urna.”
O presidente do STF afirmou que há de 6.200 a 6.500 vagas de juiz em aberto hoje até porque “ninguém mais quer ser” juiz por falta de incentivo. “Todo mundo acha que juiz ganha uma maravilha, mas não ganha porque na verdade ele tem 27,5% descontado de Imposto de Renda, logo no início, aí tem a verba previdenciária, plano de saúde, ele acaba ganhando em torno de 10, 11 mil reais líquidos”, calculou o ministro. Hoje, um juiz federal titular recebe, em termos brutos, R$ 25 mil e mais auxílio-moradia de R$ 4.300 por mês. “E são gente top de linha que passa no concurso da magistratura, e hoje não aposenta mais com integralidade de vencimentos, entra no regime geral da Previdência”, afirmou Lewandowski.
Para o ministro, os juízes não têm conseguido manter um padrão de vida de classe média. “Em São Paulo, ninguém quer sair do interior. Com 10, 11 mil reais líquidos, ele não tem uma vida de classe média, tem que pagar condomínio, escola dos filhos, prestação de automóvel, IPVA, IPTU...”