Falhas nos sistemas judicial e processual e a inoperância do Estado em fiscalizar o cumprimento da progressão da pena fizeram com que Robson Martins da Silva, 33 anos, protagonizasse o sequestro e a ameaça à vida de Jurema da Silva Assunção. O acusado de usar uma faca para render a vítima de 28 anos por cerca de 40 minutos na tarde de terça-feira nos arredores do Palácio do Buriti acumula uma extensa ficha criminal — com passagens por homicídio, tentativa de homicídio, roubo e porte de arma de fogo —, usa crack e cocaína e cumpria pena em regime domiciliar. Agora, voltará para o Complexo Penitenciário da Papuda.

Sob a situação penal a que estava submetido, o motorista desempregado Robson deveria trabalhar durante o dia e se recolher no período noturno em uma casa de albergados, mas, pela inexistência desse estabelecimento no Distrito Federal, o condenado cumpria a determinação na própria residência. Entre as exigências estava o retorno para a casa a partir das 21h. No entanto, para especialistas ouvidos pelo Correio, não há quem efetivamente controle o cumprimento dessa obrigação.

O juiz aposentado Everardo Alves Ribeiro, ex-titular da Vara de Execuções Criminais do Distrito Federal, explicou que a transição para o regime aberto ou domiciliar depende da situação criminal de cada indivíduo. Segundo ele, o objetivo é reinserir e reconduzir o réu ao convívio social. “Essa possibilidade é para reeducar o indivíduo a viver em sociedade. Um dependente de vários antecedentes criminais pode receber esse direito mesmo tendo outras condenações, mas, por uma falha do sistema processual legal, o juiz de penas alternativas define a progressão até chegar ao regime aberto”, explicou.

O magistrado reforça que falta aparelhamento do Estado para fiscalizar e acompanhar os condenados de forma devida. “Uma das obrigações do regime é que a pessoa trabalhe durante o dia e retorne a partir das 21h para o recolhimento. É necessário que se fiscalize se o indivíduo não está frequentando lugares após esse horário, como bares, e se não está com porte de arma ilegal ou acompanhado de outra pessoa em cumprimento da mesma pena”, afirmou.

A professora de direito penal do mestrado do Instituto de Direito Público (IDP) Soraia da Rosa Mendes acredita que a falha não é do magistrado responsável pelo sentenciamento, mas do sistema prisional. Segundo a especialista, se o juiz concede uma pena de regime domiciliar, possivelmente o envolvido já contava com o benefício do aberto. “Ocorre que, no DF, não existem casas de albergados. As falhas são do sistema carcerário, mas o indivíduo em questão (o sequestrador) é visivelmente perturbado, e a lei penal determina que pessoas com essas características sejam submetidas a tratamento. Essa é uma medida de segurança e não tratamento prisional”, considerou.

 

Constrangimento

Em 24 horas, a Polícia Civil encaminhou ao Tribunal de Justiça do DF e Territórios (TJDFT) o auto de prisão em flagrante de Robson da Silva. O advogado dele, Kendrick Xavier, explicou que, em razão do crime cometido, ele perderá o benefício do regime domiciliar. Por isso, responderá ao processo de sequestro preso. “A tese da defesa é de que a tipificação legal não foi de sequestro, mas isso será discutido em série de processo penal. O Ministério Público, com certeza, ao fazer a denúncia, não vai agir como sequestro, pois não fica fundamentado juridicamente”, alegou. Para o advogado, ele praticou uma tentativa de constrangimento. O advogado confirmou que, segundo familiares, o cliente fazia uso contínuo de crack e cocaína nos últimos meses.