Aliviada após vencer por uma diferença de pouco mais de 3,45 milhões de votos em relação ao candidato do PSDB, Aécio Neves, a presidente Dilma Rousseff prometeu paz, amor e diálogo nos próximos quatro anos de mandato. A julgar pela pilha de problemas e obstáculos que terá pela frente, no entanto, a presidente reeleita precisará de paciência e sangue frio para conduzir o país. E, com base na postura centralizadora do primeiro período de governo, ela terá que mudar o estilo pessoal de governar para vencer as batalhas que a aguardam. 

"Ela aprendeu com tudo o que passou. Quero dizer, é o que eu, o PT, os aliados, os economistas esperam que tenha acontecido. Senão, Dilma será engolida nestes quatro anos", confidenciou um petista com bom trânsito nos corredores palacianos. "Dilma tem um personalidade muito forte. Acho difícil que ela consiga mudar tanto assim", questionou o coordenador de Graduação e Pós-Graduação em Relações Internacionais do Ibmec-RJ, José Niemeyer. 

Os questionamentos se multiplicam. E começam pela própria relação que a presidente manterá com o PT e com o ex-presidente Lula. Padrinho e afilhada, criador e criatura que se aproximaram, se complementaram e se estranharam ao longo do primeiro mandato, ambos conseguiram administrar as pressões do PT pelo "volta Lula". Petistas históricos ficaram amuados, mas a gerentona bateu o pé e garantiu o direito à reeleição. Lula sempre defendeu, em público, esse direito da pupila. 

Agora é diferente. Lula é candidatíssimo ao Planalto em 2018. Em entrevista ao Jornal do SBT, Dilma afirmou que apoiará Lula "no que ele quiser ser". O presidente do PT, Rui Falcão, já disse que o ex-presidente terá um protagonismo maior no próximo período, o que, em tese, diminui a margem de autonomia de Dilma para governar o país. 

Os petistas tentam ver o problema pela ótica do copo meio cheio. Em primeiro lugar, eles acreditam que a quase certeza de que Lula será o candidato em 2018 deve tornar a relação do PT com Dilma menos tensa, pois o movimento a favor do sindicalista não seria mais visto como rebeldia. Há também quem acredite que tudo, neste momento, seria uma cortina de fumaça. 

Para esse grupo, Lula só vai decidir se, de fato, disputará um novo mandato presidencial em dezembro de 2017 ou abril de 2018, limite para o anúncio da candidatura. Mas, por ser um nome natural, impediria uma disputa interna pela vaga entre outros petistas, o que poderia, a curto e médio prazo, inviabilizar o governo de Dilma Rousseff. 

O PMDB também deverá ser um grande pesadelo. A primeira semana já foi tumultuada, com a movimentação de Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) e do líder Eduardo Cunha (PMDB-RJ) derrotando o governo no projeto dos conselhos populares e ameaça colocar para votar as chamadas pautas-bomba. "Quem ganhou a eleição foi a Dilma Rousseff, não o PT", declarou um cacique peemedebista. "Embora sempre recue na hora H, o PMDB parece disposto a tornar-se uma terceira via em 2018 e lançar candidatura própria ao Planalto", lembra Niemeyer. A dúvida é se a legenda tem quadros para isso. Especula-se o nome do prefeito do Rio, Eduardo Paes, mas a tendência, no momento, é de que ele concorra ao governo do Rio daqui a quatro anos. 

Mercado reticente 
Se existem problemas políticos a solucionar, o horizonte econômico da presidente não é menos turvo. A economia cresce a um ritmo pífio, a inflação estoura o limite da meta, as contas públicas apresentam deficit. Na última quarta-feira, o Comitê de Política Monetária (Copom) aumentou para 11,25% a taxa Selic para dar uma rearrumada no cenário nacional. 

Mesmo assim, os empresários esperam sinais mais consistentes do Planalto. A começar pela decisão de quem será o titular da Fazenda. "O desafio não é simples. A presidente Dilma precisa fortalecer não apenas o Ministério da Fazenda e o Banco Central, mas também o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio para que o país retome o rumo do crescimento", disse Niemeyer. 

O aumento do PIB, sobretudo durante o segundo mandato de Lula, deu-se especialmente com a adoção de estímulos ao consumo por intermédio do aumento do crédito. Para especialistas, essa fórmula não poderá mais ser adotada. "Dilma não pode nem pensar em implantar medidas que desequilibrem ainda mais as contas públicas", completou o coordenador do curso de Relações Internacionais do Ibmec. 

Dilma também tem que recobrar o diálogo com três dos aliados mais tradicionais do PT, que são o sindicalismo, o funcionalismo público e os movimentos sociais. "As ruas de 2013 mostraram que havia um caldeirão de personagens e reivindicações nos protestos. Dilma precisa corrigir o discurso, implantar as propostas que fez naquela época, incluindo a reforma política. A grande batalha será saber quem assumirá o protagonismo diante desses grupos ao longo dos próximos anos", disse um aliado de Dilma. 

"Embora sempre recue na hora H, o PMDB parece disposto a tornar-se uma terceira via em 2018 e lançar candidatura própria ao Planalto" 
José Niemeyer, professor do Ibmec-RJ 

Não vai ser fácil 
Os desafios e os obstáculos da presidente de 54 milhões de votos 

Lula 
Apesar do movimento "volta, Lula", o ex-presidente defendeu o direito de Dilma a disputar a reeleição. Mas agora já fala em concorrer em 2018, e não quer entrar na disputa com o atual governo mal avaliado. Por isso, deve aumentar a pressão sobre Dilma até o próximo pleito. 

PT 
Egressa do PDT, a presidente precisou do PT e da militância na reta final para reeleger-se. A legenda deve cobrar essa fatura à altura. 

PMDB 
A legenda deve atazanar o governo ao longo dos quatro anos, sobretudo com Eduardo Cunha na Câmara dos Deputados. 

Base aliada 
Deputados e senadores apoiaram a reeleição, mas devem tensionar a relação com o Planalto ao longo dos próximos quatro anos. 

Indústria 
O setor despencou sua participação no PIB ao longo dos últimos anos. Dilma precisará retomar a confiança e a competitividade da área. 

Empresários 
O setor produtivo reclama do excesso de intervencionismo na economia. Por isso, apoiaram, em sua maioria, as candidaturas de oposição ao Planalto. 

Setor financeiro 
Os banqueiros não gostaram das sucessivas baixas de juros feitas entre 2010 e 2014. O clima entre a petista e o setor financeiro azedou de vez com as críticas de Dilma aos banqueiros na campanha. 

Servidores públicos 
Com a economia fragilizada, os servidores sabem que dificilmente conseguirão aumento nos salários pelos próximos quatro anos, apesar do recente reajuste de 15,8%. 

Sindicatos 
Os sindicalistas afirmam que Dilma não abre espaço na agenda presidencial e faz pouco caso das reivindicações dos trabalhadores. 

Movimentos sociais 
A exemplo dos sindicatos, os movimentos sociais sentiram-se escanteados do poder nos primeiros quatro anos. Há reclamações especialmente na questão agrária. 

Inflação 
A inflação extrapolou o limite da meta imposto pelo próprio governo e corroeu a renda, sobretudo dos mais pobres. 

Economia 
Crescimento pífio do PIB, balança comercial negativa e deficit nas contas públicas são alguns dos indicativos de que o país vai mal nesta área, travando o desenvolvimento.