O setor de energia solar deu, ontem, um importante passo para deslanchar no Brasil. Com o resultado do leilão de reserva, realizado em São Paulo pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), as usinas solares começam a deixar para trás sua fase "experimental" para se tornarem um negócio comercialmente viável.

Considerado o mais disputado da história, o Leilão de Energia de Reserva (LER) 2014 durou oito horas e teve 104 propostas. O antigo recorde, de 2008, teve 72 rodadas. Serão ao todo 31 usinas solares, das quais 14 localizadas na Bahia.

O mercado se surpreendeu com o preço médio de R$ 215,12/MWh para a energia solar - um deságio de 17,9% em relação ao preço-teto de R$ 262/MWh estabelecido pelo Ministério de Minas e Energia (MME). A expectativa antes do início da concorrência era de que o preço médio ficasse acima dos R$ 250/MWh.

Essa é a primeira vez que o governo compra exclusivamente energia solar. No ano passado, a Aneel chegou a realizar um leilão para várias fontes renováveis de energia, que incluía projetos solares - só que na disputa com outras modalidades, como a eólica e as pequenas centrais hidrelétricas, a solar perdeu no preço e nenhum megawatt foi contratado.

Em junho deste ano, por exemplo, as usinas eólicas conseguiram vender energia a um preço médio de R$ 130. Nos últimos meses, empresas estrangeiras e nacionais esperavam o resultado deste leilão para definir seus investimentos no setor.

Foram contratados ontem 31 projetos de energia solar, com uma capacidade instalada de 1.048 MW. O presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim, classificou o resultado do leilão como um "marco". "Contratamos energia solar a um dos menores preços de que se tem conhecimento no mundo, de aproximadamente US$ 90/MWh. Isso coloca o Brasil como uma das fronteiras da expansão da energia solar no mundo", disse Tolmasquim, em entrevista.

O governo federal deve realizar já no próximo ano um novo leilão no qual a energia solar não disputará preços com outras fontes. Segundo Tolmasquim, o governo pretende sinalizar que leilões de energia solar devem ocorrer anualmente a partir de agora. A meta oficial do governo é alcançar 3.500 MW de capacidade instalada até 2023.

"Acredito que parte do sucesso se deva aos fornecedores que vieram muito competitivos para ganhar o mercado brasileiro e parte à estratégia adotada pelos empreendedores, que vieram se organizando ao longo do tempo, evoluindo com o próprio setor", destacou a advogada da área de Infraestrutura do Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados, Laura Souza.

A crise que reduziu investimentos na Europa e nos EUA nos últimos anos e os preços recordes da energia no País fizeram com que grandes empresas, de fora e daqui, começassem a se interessar por esse mercado.

A empresa que mais se destacou na disputa foi a brasileira Renova Energia. Ela comercializou um total de 106,9 MW de capacidade instalada de energia solar, a serem gerados por quatro parques solares, localizados no Estado da Bahia, na mesma região dos parques eólicos em operação da companhia.

Os lotes foram vendidos ao valor médio R$ 220,30 por MWh. Em nota, a empresa disse que "com essa comercialização, a Renova consolida ainda mais a sua liderança no mercado de energia renovável no Brasil". A capacidade instalada contratada da companhia passa de 2.301,1 MW para 2.451,5 MW.

Entre os Estados brasileiros, o da Bahia foi o principal destaque do leilão, como já era previsto inicialmente, com a contratação de energia a ser gerada 14 usinas solares. Tolmasquim também destacou a contratação de energia a ser gerada em nove usinas solares em São Paulo, estado onde o nível de produtividade dos projetos solares não atinge os mesmos patamares daqueles esperados na Bahia. Também foram contratados projetos solares nos estados da Paraíba, Goiás, Ceará, Rio Grande do Norte e Minas Gerais.

Eólica. Em contraste ao sucesso obtido com a venda de energia solar, a fonte eólica apresentou desempenho mais discreto. O preço médio da energia contratada foi de R$ 142,34/MWh, com deságio de apenas 1,15% em relação ao teto de R$ 144/MWh estabelecido para o certame. Os projetos eólicos contratados hoje têm capacidade instalada de 769,1 MW. Anteontem, em entrevista ao Broadcast, serviço em tempo real da Agência Estado, a presidente executiva da Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica), Elbia Melo, previu que fossem contratados no mínimo 1.200 MW em capacidade de usinas eólicas.

Não foram feitas propostas para a energia das termelétricas abastecidas com biogás e resíduos sólidos urbanos cadastradas no evento, cujo preço-teto era de R$ 169/MWh. A ausência de propostas por empreendimentos a biomassa já era esperada por especialistas do setor elétrico.