O ministro da Fazenda, Guido Mantega, deu ontem aval para que a Petrobras reajuste o preço da gasolina entre 4% e 5% até o fim do mês. A decisão foi tomada durante reunião do Conselho de Administração da estatal, que se reuniu por mais de nove horas na sede da empresa, em Brasília. Nenhum dos integrantes do órgão quis comentar a medida. A presidente da petroleira, Graça Foster, contudo, preferiu economizar as palavras e não fazer o anúncio oficial após o encontro. "Aumento de gasolina não se anuncia. Pratica-se", disse ela, que, segundo fontes do governo, solicitou uma elevação de 8% no combustível. 

Sem que se chegasse a um consenso, porém, o número não foi fechado na reunião de ontem, e a decisão final deve ficar com a diretoria da empresa. "Em relação ao reajuste de preços, a companhia reitera o que foi divulgado em comunicado ao mercado em 29 de outubro de 2014, que esse assunto é discutido frequentemente pela sua diretoria executiva e pelo seu conselho de administração, mas, até o momento, não há decisão quanto a reajuste no preço da gasolina e do diesel", afirmou a Petrobras, em nota distribuída no início da noite. 

Com isso, o governo pretende ganhar algum tempo. O recuo do preço do barril de petróleo no mercado internacional, que ontem caiu 2,02%, para US$ 77,19, em Nova York, deu algum fôlego à companhia. A equipe econômica quer escolher o melhor momento para liberar o aumento nas bombas, preocupada com o impacto que o reajuste terá na inflação, que está acima do teto da meta oficial, de 6,5%. Ainda nesta semana, será divulgado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de outubro, e a expectativa do mercado é de que ele fique em 6,68% no acumulado de 12 meses. 

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em média, a gasolina compromete 3,74% do orçamento familiar. Isso significa, de acordo com o economista André Braz, da Fundação Getulio Vargas (FGV), que cada 1% de aumento no combustível tem impacto de 0,04 ponto percentual no IPCA. "Se o reajuste for de 5%, por exemplo, o efeito será de 0,20 ponto percentual", afirmou. O óleo diesel, que também pode ser reajustado, compromete fração bem menor do orçamento das famílias -0,14%. "Com esse peso, para cada 1% de alta, o impacto será de 0,001 ponto percentual no indicador. Se o reajuste for de 5%, o índice subirá 0,005 ponto percentual", calculou o economista. 

Dívida 
O último reajuste dos combustíveis foi em 30 de novembro do ano passado, quando a gasolina foi majorada em 4% e o óleo diesel, em 8%. Em 2014, com os preços represados pelo governo para segurar a inflação, a Petrobras amargou prejuízos por conta de uma defasagem de até 17%, entre janeiro e setembro desde ano, entre os valores desembolsados no mercado internacional e o preço pelo qual os combustíveis foram vendidos no país. Pelas contas da Gradual Investimentos, a petroleira perdeu R$ 60 bilhões, o que afetou seriamente as finanças da estatal. Hoje, ela tem a maior dívida entre companhias petrolíferas de todo o mundo - mais de R$ 300 bilhões. 

O diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura, Adriano Pires, explicou que, graças à queda do preço do barril de petróleo no mercado mundial e ao câmbio valorizado, não há defasagem de preços atualmente. "Neste momento, o reajuste ficou em segundo plano porque o mercado internacional deu uma ajuda. Mas a Petrobras precisa recuperar as perdas do passado. O buraco no caixa da empresa é grande. A dívida em dólares é de mais de US$ 114 bilhões", destacou. Pires acredita que seria o momento de o governo restabelecer a cobrança da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) sobre a gasolina, e não de aumentar combustíveis. "Isso daria competitividade ao etanol", assinalou. 

Resultado 
A reunião do conselho da Petrobras não foi apenas longa. Também foi tensa. Na pauta, além do reajuste dos combustíveis, estava a divulgação do balanço do terceiro trimestre da companhia, que não chegou a ser debatido. Ficou acertado que haverá nova reunião até 14 de novembro para aprovar o resultado financeiro da empresa. Será o terceiro encontro em menos de um mês, sendo que o normal é apenas uma reunião mensal. 

Isso ocorreu porque, na semana passada, em encontro ainda mais conturbado que o de ontem, a PriceWaterhouseCoopers (PwC), auditoria que assina o balanço da Petrobras, fez diversas exigências para aprovar os números da empresa, abalada pelo escândalo de corrupção levantado pela Operação Lava-Jato, da Polícia Federal. Entre elas, a saída imediata de Sérgio Machado da presidência da Petrobras Transporte (Transpetro) e a contratação de outras duas auditorias independentes para analisar o balanço. Assim, os dados, que usualmente são divulgados no fim de outubro, só devem ser anunciados às vésperas do fim do prazo legal, que é 45 dias após o fechamento do trimestre, portanto em 15 de novembro. 

A Petrobras atendeu aos pedidos. Anteontem, Machado se licenciou por 31 dias. Há 11 anos e quatro meses à frente da Transpetro, o ex-senador cearense foi citado em depoimento do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, que disse ter recebido dele R$ 500 mil em propina de esquema de licitação para compra de navios. A estatal também confirmou a contratação de duas empresas independentes especializadas em investigação, uma brasileira, a Trench, Rossi e Watanabe Advogados, e outra americana, a Gibson, Dunn & Crutcher LLP, "com o objetivo de apurar a natureza, extensão e impacto das ações e alegações" denunciadas na Operação Lava-Jato. 

Na opinião de economistas, as exigências da PwC se justificam. Para Jason Vieira, do portal de informações financeiras Moneyou, a auditoria, que é internacional, tem que prestar esclarecimentos à Securities and Exchange Commission (SEC), órgão americano equivalente à Comissão de Valores Mobiliários (CVM). "Isso significa a necessidade de colocar uma rubrica sobre as denúncias de corrupção no balanço", esclareceu. A medida faria as agências de classificação de risco rebaixem a nota da Petrobras. "O nível de sensibilidade dos investidores estrangeiros é muito maior porque a taxa de risco deles também é mais elevada. Um rebaixamento faria eles debandarem da petroleira", alertou.

Produção cresce 
A produção de petróleo e gás natural no Brasil em setembro alcançou 2,92 milhões de barris de óleo equivalente (BOE) por dia, sendo 2,36 milhões de barris diários de petróleo e 88,9 milhões de metros cúbicos de gás natural. Segundo a Agência Nacional de Petróleo (ANP), o volume é o maior já registrado, superando o do mês anterior, quando a produção totalizou 2,89 milhões de BOE por dia. Em relação a agosto, a produção de petróleo aumentou 1,4% na produção. Já a de gás natural foi 2,2% menor.

 

Expectativa na Bolsa

 

 

 

A Bolsa de Valores de São Paulo (BM&FBovespa) viveu um dia tenso ontem com a expectativa da decisão do Conselho da Petrobras sobre o reajuste dos combustíveis. O pregão alternou altas e baixas para fechar com avanço de 0,81% aos 54.383 pontos. As ações ordinárias da estatal chegaram a cair quase 3% durante a tarde, mas, no fim do dia, registraram recuo de 1,96%. Os investidores reagiram também à notícia de afastamento do presidente da Transpetro, Sérgio Machado, por 31 dias, após a PriceWaterhouseCoopers (PwC) impor condições para auditar o balanço da estatal.

O resultado positivo da Bovespa foi puxado pelos papéis de bancos, reagindo à divulgação de balanços positivos do terceiro trimestre. As ações ordinárias do Santander tiveram a maior valorização, de 12, 04%. As do Itaú Unibanco avançaram 1,57%. 

Para o economista e diretor executivo da NGO Corretora, Sidnei Nehme, “a Petrobras será o grande problema institucional do governo. Ainda mais agora que a SEC (Securities and Exchange Comission, órgão que fiscaliza o mercado dos Estados Unidos) também está investigando o que ocorreu com a empresa”, afirmou.

O sobe e desce da Bovespa também se deveu às expectativas sobre a definição dos nomes da equipe econômica do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff. “A bolsa continua volátil e com viés de alta, o que é normal ante tantas incertezas. Isso acaba também alavancando o dólar”, frisou Nehme. A moeda norte-americana chegou a bater em R$ 2,53 durante a sessão, fechando em R$ 2,50 com alta de 0,20%.