Um grupo empresarial do Pará acusado pelo Ministério Público Federal de fraudar uma licitação da Transpetro, subsidiária de logística da Petrobrás, ajudou a financiar o diretório do PMDB de Alagoas, que por sua vez foi o principal repassador de verbas para a campanha de 2010 do atual presidente do Senado, Renan Calheiros. As empresas do grupo deram R$ 400 mil ao diretório peemedebista.

As doações foram feitas legalmente ao PMDB de Alagoas em nome de SS Administração e Serviços e Rio Maguari Serviços e Transportes Rodoviários.

Três meses depois de o grupo empresarial liderado pela SS Administração e Serviços fazer as doações ao diretório alagoano do PMDB, as empresas desse mesmo grupo venceram, via consórcio batizado como ERT, uma licitação para a construção de 20 comboios navais que serão usados no futuro para transportar álcool no interior de São Paulo.

Na época, a subsidiária de logística da Petrobrás já era presidida por Sérgio Machado, indicado por Renan para o cargo em 2003 - o executivo deixou o posto na segunda-feira da semana passada, após ser citado em denúncias de corrupção pelo ex-diretor da Petrobrás Paulo Roberto Costa, delator na Operação Lava Jato, da Polícia Federal.

Suspeitas. Procuradores de Araçatuba, no interior paulista, apontam desvios de R$ 21,9 milhões no contrato de R$ 432 milhões entre a Transpetro e o grupo. Para o Ministério Público, Sérgio Machado ajudou a direcionar a licitação, razão pela qual é acusado de improbidade administrativa. Em outubro, os procuradores pediram o bloqueio de seus bens e também o seu afastamento da subsidiária de logística da Petrobrás.

Ao todo, o processo aberto a pedido do Ministério Público aponta oito indícios de que a concorrência foi fraudada para favorecer o ERT, que, além da SS e da Rio Maguari, conta com a participação da também paraense Estre Petróleo, Gás e Energia.

Segundo a prestação de contas do PMDB alagoano, em 2010 foram arrecadados R$ 4,1 milhões. Desse volume, R$ 3,4 milhões foram repassados ao comitê de Renan, o que corresponde a 82% do dinheiro recebido pelo parlamentar.

O sistema do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para consultas às doações daquele ano não permite rastrear a origem dos recursos repassados pelo partido ao comitê de reeleição de Renan. Mas é possível constatar que as verbas partidárias representaram 63% de todo o volume arrecadado pelo senador, a principal contribuição ao volume de R$ 5,4 milhões gastos na campanha do peemedebista.

Os dados sobre as doações do grupo no site do TSE demonstram que, fora do Pará, a SS destinou recursos apenas para o PMDB de Alagoas. Na sua área de atuação comercial, no Pará, doou R$ 300 mil para a então governadora e candidata à reeleição pelo PT, Ana Júlia, enquanto o Estaleiro Rio Maguari, do mesmo grupo, financiou mais R$ 200 mil. A petista perdeu a disputa para o tucano Simão Jatene.

Nas eleições de 2014, as empresas não contribuíram nas campanhas de Alagoas, segundo dados ainda não consolidados do TSE. No Pará, três candidatos a cargos legislativos do PT e do PSB receberam, ao todo, R$ 50 mil do Rio Maguari.

O grupo empresarial nega qualquer relação entre a doação eleitoral e o contrato obtido na subsidiária da Petrobrás.

A Transpetro, por sua vez, defende a legalidade da licitação.

 

Empresa nega ter proximidade com Renan

O grupo SS Administração e Serviços, que contribuiu com R$ 400 mil para o diretório do PMDB de Alagoas - o principal repassador de dinheiro para a campanha ao Senado de Renan Calheiros (PMDB-AL) em 2010, disse que a doação foi feita seguindo os parâmetros legais.

O grupo integra consórcio ERT, vencedor de concorrência da Transpetro, cujo presidente licenciado, Sérgio Machado, é afilhado político do hoje presidente do Senado. "Nas eleições de 2010 fizemos doações a partidos e candidatos a cargos diversos, de regiões diversas e de partidos políticos diferentes", afirmou Fábio Vasconcelos, diretor comercial do Estaleiro Rio Maguari, em e-mail em nome do grupo. Ele disse que executivos da empresa não mantêm qualquer proximidade com Machado ou Renan.

A empresa alegou que, apesar das acusações do Ministério Público Federal de atraso na conclusão dos comboios navais, até hoje já entregou mais produtos à Transpetro do que recebeu de pagamento. A estatal confirma que, enquanto não entregar toda a encomenda da embarcações, o estaleiro não receberá os 95% de saldo contratual e deve, nesse meio tempo, assumir a construção com recursos próprios.

A subsidiária da Petrobrás argumenta que o contrato foi auditado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) sem que qualquer irregularidade tivesse sido encontrada. A Transpetro informou que o resultado da licitação foi favorável à empresa porque a proposta do ERT foi US$ 36 milhões mais barata que a do segundo colocado.

Sobre a distribuição das doações de campanha em 2010, antes da reforma política que alterou a legislação eleitoral, o PMDB de Alagoas informou que privilegiou o financiamento de Renan por ele ter concorrido a um cargo majoritário.

Procurado por meio de sua assessoria de imprensa, Renan não respondeu aos questionamentos do Estado. Machado não foi encontrado, mas tem negado reiteradamente a existência de irregularidades na licitação para a contratação dos 20 comboios e que tenha participado de qualquer esquema de corrupção, ao contrário do que denunciou o ex-diretor da Petrobrás Paulo Roberto Costa, em delação à Operação Lava Jato, da Polícia Federal.

 

Doleiro confirma elo da Lava Jato com o mensalão do PT

O doleiro Alberto Youssef, alvo da Operação Lava Jato, confirmou ontem à Justiça Federal o elo do mensalão do PT com o esquema de corrupção e propinas na Petrobrás. Ele disse que mantinha uma conta corrente conjunta com o ex-deputado José Janene (PP-PR) - morto em 2010 -, responsável pela indicação de Paulo Roberto Costa para a diretoria de Abastecimento da estatal petrolífera, em 2004.

Youssef declarou que, por orientação de Janene, repassava valores a "agentes públicos" e "agentes políticos" e usava para isso um segundo doleiro, Carlos Habib Chater, dono do Posto da Torres, em Brasília, para entregar o dinheiro. Ele disse que parte da quantia vinha do caixa de construtoras.

O juiz Sérgio Moro, que conduz as ações da Lava Jato, perguntou a ele qual a origem do dinheiro. "Comissionamento de empreiteiras", declarou Youssef. O juiz perguntou: "Decorrente de contratos com a administração pública, em geral propinas?" Youssef respondeu: "Sim senhor, Excelência."

"Tudo o que o seo Janene precisava de recursos ele pedia a mim e eu disponibilizava", contou Youssef. "Às vezes essa conta ficava negativa, às vezes ficava positiva. Na verdade nessa conta também ia recurso para outras pessoas, não que eu administrasse os recursos dessas outras pessoas, mas eu via esse caixa como caixa do partido, o Partido Progressista."

O doleiro não citou nome de nenhum agente público ou agente político. Tais nomes ele já citou em acordo de delação premiada que ainda terá de ser homologado pela Justiça.

Youssef é réu em cinco ações penais da Lava Jato na Justiça Federal no Paraná. Em uma ação, ele é acusado de ter participado da lavagem de R$ 1,16 milhão do mensalão do PT através de investimentos em uma empresa de equipamentos industriais situada em Londrina (PR). A ação penal em que Youssef depôs ontem trata da ligação do doleiro com o ex-deputado Janene e com o doleiro Carlos Habib Chater.

Youssef afirmou que Janene investiu na empresa de Londrina por meio de outra companhia ligada a ele, a CSA Project. Essa firma foi usada para receber recursos do fundo de pensão da Petrobrás, a Petros, alvo da Lava Jato.