O governo se prepara para subtrair o apoio de partidos da base aliada ao deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que se lançou candidato à presidência da Câmara com três meses de antecedência. A estratégia do Palácio do Planalto para desidratar o "blocão" dos rebeldes passa pela composição do novo governo e acenos de mais "diálogo" em 2015.

Em troca da participação no segundo mandato da presidente Dilma Rousseff, a cúpula do PR já dá sinais de que está disposta a negociar com o governo. O "blocão" que impôs duras derrotas a Dilma em votações na Câmara é hoje formado por cinco partidos (PMDB, PTB, PR, PSC e Solidariedade), mas o Planalto joga a isca para isolar Cunha.

Por enquanto, ministros conversam com deputados aliados e fazem "sondagens" sobre o roteiro para evitar a vitória de Cunha, que é o líder do PMDB na Câmara. A eleição que renovará as presidências da Câmara e do Senado está marcada para fevereiro.

Para desembarcar do projeto pró-Cunha, o PR de Valdemar Costa Neto - condenado no processo do mensalão - faz pressão sobre o governo, com o objetivo de continuar no comando do Ministério dos Transportes. O PR tenta emplacar ali o senador Antônio Carlos Rodrigues (SP), mas Dilma, até agora, indicou que pretende acabar com "feudos" partidários. O PR ocupa Transportes desde o governo Lula.

Com bom trânsito no PT, Rodrigues é suplente da ministra da Cultura, Marta Suplicy (SP), que deixará o cargo para retornar ao Senado. Se não integrar a nova equipe de Dilma, Rodrigues deverá reassumir a vaga de vereador em São Paulo. "Não tem problema algum. Aqui eu sou reserva, mas lá sou titular, camisa dez", disse o senador.

A portas fechadas, porém, tanto auxiliares de Dilma como dirigentes do PR avaliam que a guerra dos aliados na Câmara só terá trégua quando ela atender aos principais pedidos dos partidos de sua base de sustentação. "Percebo que a presidente pretende ajudar e quer melhorar o diálogo", afirmou o deputado Lincoln Portela (MG), um dos cotados para assumir a liderança da bancada do PR, no ano que vem.

Embora em situação desfavorável na disputa pela presidência da Câmara, o PT de Dilma também decidiu lançar candidato à vaga. Arlindo Chinaglia (SP) e Marco Maia (RS), dois ex-presidentes da Câmara, Henrique Fontana (RS), líder do governo, e José Guimarães (CE) são os nomes citados para o cargo. Além de Cunha, o deputado Júlio Delgado (PSB-MG) também garante que concorrerá à presidência da Câmara.

Se o quadro continuar assim, o preferido pelo Planalto para enfrentar Cunha será Chinaglia. Dilma incumbiu os ministros Ricardo Berzoini (Relações Institucionais) e Aloizio Mercadante (Casa Civil) de dizerem à bancada do PMDB que aceita qualquer outro nome indicado pelos deputados, menos o de Cunha.

Na quinta-feira, a presidente foi questionada sobre a solução para os problemas com o líder do PMDB na Câmara. "Estamos há muito tempo convivendo com o Eduardo Cunha", respondeu ela, fazendo longo silêncio.

Nem mesmo o vice-presidente Michel Temer, sempre muito calmo, escondeu a irritação com o lançamento de Cunha. "Se tiver um candidato (à presidência da Câmara), ainda que seja do PMDB, que se coloque contra o governo, ele está se colocando contra mim, que sou vice-presidente da República", afirmou Temer.

Apesar dos acenos do Planalto na direção do apoio à candidatura de outro partido da base, contanto que o nome seja capaz de derrotar Cunha, os petistas não creem nessa possibilidade. "É da tradição da Câmara que o maior partido dirija a Casa. Com essa credencial é natural que o PT submeta um de seus nomes para avaliação da base do governo", disse o deputado Paulo Teixeira (PT-SP).

 

Presidente cogita dar mais autonomia a titular da Fazenda

A presidente reeleita Dilma Rousseff acenou a aliados que poderá indicar um ministro da Fazenda com perfil mais autônomo para conduzir a política macroeconômica. Dilma manteve uma série de encontros com a bancada do PT do Senado, com senadores do partido individualmente e com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, nos quais chegou a dizer que poderia "surpreender" com a escolha do titular da pasta.

A "surpresa" foi entendida como um ministro com mais autonomia em relação ao Planalto do que o atual titular do cargo, Guido Mantega. A presidente deve indicar o escolhido após a cúpula do G-20, em Brisbane (Austrália), no próximo fim de semana.

Contudo, em nenhuma das conversas, segundo relatos obtidos pelo Broadcast Político, serviço de notícias em tempo real da Agência Estado, a presidente mencionou nomes aos interlocutores. Mas, petistas que estiveram com Dilma e Lula - que tem tratado com a presidente da reforma ministerial - nos últimos dias confirmam que o perfil está entre o ex-presidente do Banco Central no governo Lula Henrique Meirelles e o ex-secretário-executivo da Fazenda Nelson Barbosa.

Um importante quadro do PT no Senado disse que, com qualquer um dos dois nomes, o governo acenará com mudanças. E destacou que Barbosa ou Meirelles só topariam assumir o posto com carta branca para conduzir os rumos da economia a partir de 2015.

Após o fraco desempenho da economia neste ano, os próprios petistas reconhecem reservadamente que Dilma precisaria indicar um nome que resgate a credibilidade do governo na área. Os parlamentares afirmam que Dilma, que é economista de formação, não pode cuidar da área na prática, como fez no primeiro mandato, ao não delegar poderes integralmente a Mantega. O governo precisa designar alguém para essa condução, abrindo espaço para que a presidente cuide mais prioritariamente da área social e dos projetos de infraestrutura, por exemplo.

Predileção. As bancadas do PT da Câmara e do Senado demonstram uma predileção maior por Barbosa. Ele é considerado pelos parlamentares como um nome que teria interlocução política - na Fazenda, Barbosa foi um dos principais articuladores da reforma tributária enviada em 2013 por Dilma ao Congresso. Ao mesmo tempo, avaliam, tem força no mercado para conduzir a política macroeconômica.

Entretanto, outro senador petista que conversou tanto com Dilma quanto com Lula na semana passada ficou com a impressão de que Meirelles está sendo, sim, considerado pela presidente para assumir o ministério. Eterno candidato de Lula, ele sempre foi preterido politicamente nos planos de Dilma.