A Controladoria Geral da União (CGU) e o Tribunal de Contas da União (TCU) apertaram o cerco nas investigações sobre a Petrobras. A CGU abriu processo para punir a empresa holandesa SBM Offshore, acusada de pagar propina a funcionários da estatal, e analisa a conduta de seis funcionários e ex-funcionários da Petrobras. Já o TCU quer explicações da estatal sobre o Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), que teve o orçamento inflado de US$ 6,1 bilhões para US$ 47,7 bilhões. Serão analisados contratos sem licitação assinados na gestão do ex-diretor Paulo Roberto Costa, preso na Operação Lava-Jato, com fornecedores citados na investigação da Polícia Federal.

O processo aberto pela CGU, órgão vinculado à Presidência da República, vai apurar o pagamento de propina e a possível obtenção de vantagens indevidas pela SBM. Caso punida, ela será proibida de celebrar contratos com a administração pública federal brasileira. A SBM atua na área de fretamento de embarcações e tem contratos de US$ 26,4 bilhões com a Petrobras. Na Holanda, a SBM anunciou um acordo com o Ministério Público local para encerrar um caso de pagamento de propina na Guiné Equatorial, em Angola e no Brasil. A empresa aceitou pagar US$ 240 milhões como punição por pagamentos irregulares feitos entre 2007 e 2011 e que haviam sido denunciados pela promotoria.

Acordo de leniência

A apuração da SBM não identificou funcionários da Petrobras como beneficiários desses pagamentos, mas concluiu que o ex-representante da empresa no Brasil Julio Faerman recebeu US$ 139 milhões. A possibilidade de a SBM colaborar com as investigações no Brasil é admitida pela CGU. E o ministro Jorge Hage já estabeleceu as condições:

- Se a SBM assinar acordo de leniência, vamos exigir que indique as pessoas na Petrobras que receberam propina. Ela já confirmou que houve o pagamento, mas não citou os nomes. Outra exigência é o ressarcimento imediato dos prejuízos.

A CGU abriu seis processos contra empregados, ex-empregados e ex-diretores da Petrobras, que serão ouvidos e responsabilizados, caso atos ilícitos sejam comprovados.

A investigação da Petrobras descobriu que documentos sigilosos da estatal, trocados por executivos da SBM e que fizeram parte da investigação na Holanda, foram gerados com a senha do ex-diretor da área internacional Jorge Zelada. Em depoimento à CPI da Petrobras, Zelada negou ter repassado os arquivos, que tratavam do plano diretor de desenvolvimento do polo de pré-sal da Bacia de Santos e da contratação de uma embarcação da empresa McDermott, concorrente da SBM.

Já o TCU avançou em medidas para apurar supostas irregularidades nas obras do Comperj. O órgão quer explicações da Petrobras para a celebração de contratos de US$ 7,6 bilhões sem licitação na gestão de Costa na diretoria de Abastecimento da Petrobras.

Questiona-se ainda a compra de equipamentos que não serão mais usados no projeto e aditivos de R$ 1,5 bilhão celebrados porque equipamentos não chegaram no prazo, devido à falta de vias de acesso. O relatório sobre o tema foi apresentado pelo ministro José Jorge em 15 de outubro e aprovado na sessão de ontem.

A auditoria do TCU frisou que há números divergentes na própria Petrobras sobre o custo estimado para a obra. A previsão inicial era de US$ 6,1 bilhões. A estatal já elevou essa estimativa para US$ 30,5 bilhões, mas a área de Estratégia Corporativa trabalha com a previsão de US$ 47,7 bilhões.

No projeto original, o Comperj seria um complexo petroquímico. Após mudanças, o formato atual é de uma refinaria com dois trens de produção para refino de 465 mil barris de petróleo/dia com a construção posterior da área de petroquímica. A primeira fase tinha 75% de execução em junho, segundo a Petrobras.

Janot quer dividir processo

Ontem, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, disse que a Lava-Jato levou à homologação de um processo de delação premiada, à conclusão de outros três (ainda a serem homologados) e ao começo de mais "cinco ou seis". Segundo Janot, há executivos, servidores e doleiros ajudando nas investigações. Também disse que pediu a divisão do processo, para facilitar a investigação, mas frisou que requereu ao relator do caso no Supremo Tribunal Federal (STF), Teori Zavascki, que não aprecie esse pedido até ter acesso às delações em curso.

‘Ministro-problema’ para o governose despede

Em seu último dia no TCU, José Jorge pede ajuda divina contra racionamento

Ministro que mais incomodou o Palácio do Planalto nos últimos anos, José Jorge despediu-se ontem em
sua última sessão do Tribunal de Contas da União (TCU) ao seu estilo. Aprovou um relatório sobre
irregularidades no Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), bloqueou o repasse de área de
exploração do pré-sal para a Petrobras e cobrou do BNDES o envio de detalhes de contratos com o grupo
JBS Friboi. Ainda incluiu em seu discurso de despedida a declaração de que São Pedro não seria suficiente
para evitar que o país vivesse um novo racionamento, pedindo a intervenção divina.

 menção ao racionamento não é em vão. Ele era ministro de Minas e Energia em 2001 quando o
governo Fernando Henrique Cardoso foi obrigado a adotar a medida. Descreveu a fase como seu pior
momento em 47 anos de vida pública. Mas não perdeu a oportunidade der irônico e atacar o governo
federal:
— No setor elétrico, estamos nas mãos de Deus, porque São Pedro, sozinho, não vai resolver esse
problema — disse.
Personagem que reúne, na descrição de amigos e adversários, os adjetivos de sério e bem- humorado,
deixará o TCU na próxima segunda-feira, na véspera do aniversário de 70 anos. Nas homenagens que
recebeu no plenário, uma história contada por um dos ministros mais próximos resume como os dois
Classificação do artigo 13 nov 2014 O Globo (Eduardo Bresciani)

Legislação dos EUA incentiva acordo com empresa investigada

 

Petrobras, que diz não ter sido informada sobre abertura de processos, pode melhorar sua situação se adotar medidas corretivas e processar responsáveis

Alexandre Rodrigues

O processo aberto pela Securities and Exchange Commission (SEC), o órgão regulador do mercado de capitais nos Estados Unidos, pode terminar em menos de um ano, se a empresa colaborar e se comprometer com ações internas de correção, criando as condições para um acordo. É o que dizem advogados e especialistas em administração ouvidos pelo GLOBO. Ontem, em nota, a Petrobras informou desconhecer "qualquer investigação" da SEC ou do Departamento de Justiça dos EUA.

"A companhia não recebeu notificação de nenhum dos dois órgãos acerca de abertura de investigações para identificar eventual violação à legislação americana, tendo em vista as denúncias efetuadas no âmbito da Operação Lava-Jato", informou a estatal. "A Petrobras, através do escritório americano contratado para conduzir as investigações independentes, Gibson, Dunn & Crutcher LLP, já fez contato com os referidos órgãos americanos, informando sobre o início dos trabalhos para apurar tais denúncias na companhia", informou a empresa.

Os órgãos americanos, por sua vez, não informam o foco nem o teor dos processos. Matheus Rossi, diretor jurídico do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), explica que investigações desse tipo podem apurar simultaneamente responsabilidades da empresa e de seus administradores nas esferas penal, civil e administrativa.

Geralmente, a SEC se concentra nesta última, já que sua principal atribuição é punir quem viola as regras do mercado de capitais. A Petrobras pode obter um acordo para encerrar o processo na SEC antes do fim das investigações da Operação Lava-Jato no Brasil.

- Sabemos que a lei anticorrupção americana, no âmbito da SEC, permite o arquivamento do caso e até inocentar empresas que venham a colaborar com as investigações e comprovem medidas de correção para mitigar falhas internas - disse Rossi.

A lei anticorrupção americana veda a cooptação de agentes públicos nos EUA e em outros países. A Petrobras está sujeita às autoridades americanas porque tem ações negociadas na Bolsa de Nova York. No Brasil, a estatal enfrenta uma investigação sigilosa da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). O mais provável é que o alvo dessas duas investigações seja a existência de controles internos para detectar e evitar prejuízos como os apontados pelo ex-diretor da estatal Paulo Roberto Costa, preso na Lava-Jato.

O Tribunal de Contas da União (TCU) estima que a Petrobras pode ter perdido mais de R$ 3 bilhões com obras superfaturadas ou aquisições desastrosas como a da refinaria de Pasadena, nos EUA. Quando uma empresa paga mais do que devia a um fornecedor, lucra menos. Isso afeta o patrimônio dos acionistas.

A devassa da SEC nas contas de uma empresa costuma buscar fraudes contábeis usadas para mascarar desvios, inclusive para patrocinar atos de corrupção. Isso também é vedado pela lei americana, bem como a possibilidade de executivos da Petrobras terem corrompido agentes públicos nos EUA ou em outro país. Esse, provavelmente, é o alvo de outra investigação, do Departamento de Justiça americano. Segundo um advogado que atua em casos similares, para buscar um acordo na SEC, a Petrobras precisa provar que não negligenciou medidas para detectar e deter os prejuízos causados sem o conhecimento do Conselho de Administração, comprometer-se com ações corretivas e processar os executivos responsáveis para tentar recuperar o dinheiro.