Título: Fazenda e Petrobras em queda de braço
Autor: Batista, Vera ; Ribas, Sílvio
Fonte: Correio Braziliense, 18/06/2011, Economia, p. 14

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, vetou ontem, pela segunda vez, a proposta de investimentos apresentada pela Petrobras no plano de negócios 2011-15. Insatisfeito com a insistência da companhia em ampliar os gastos em US$ 25 bilhões acima dos US$ 224 bilhões previstos para o período 2010-2014, Mantega, presidente do Conselho de Administração da estatal, determinou novos ajustes. A primeira versão do plano foi rejeitada em 13 de maio. Mantega também rechaçou a proposta da companhia de repassar à empresa privada Sete Brasil os contratos do programa de modernização da frota petroleira. Antes da reunião, a diretoria da empresa havia enviado ao governo pedido de reajuste de combustíveis de aproximadamente 10%. O aumento seria compensado pela Contribuição de Domínio Econômico (Cide). Com isso, não haveria repasse ao consumidor nem impacto sobre a inflação, mas reduziria a arrecadação do governo.

O impasse vem prejudicando as ações da Petrobras, que fecharam a sexta-feira em queda na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa). As preferenciais (PN) caíram 0,21%, para R$ 23,24, e as ordinárias (ON), 0,77%, para R$ 25,67. No dia, o principal índice de lucratividade do pregão paulista (Ibovespa) registrou alta de 0,28%. Diante das incertezas, os papéis PN estão no menor nível desde março de 2009, auge da crise mundial, quando valiam R$ 23. Essas ações acumulam perda de 13,21% no ano e as ON, 14,56%.

Durante a reunião do Conselho, realizada em São Paulo, a estatal voltou a desagradar o ministro, que já tinha pedido para os investimentos ficarem, no máximo, próximos do previsto no plano atual. A Petrobras ¿ que vem ampliando de forma expressiva seu endividamento ¿ terá agora de rever em pouco mais de uma semana 681 projetos para definir quais serão adiados ou cortados.

Por detrás do impasse dos últimos dias está a queda de braço entre o governo e o presidente da estatal, José Sérgio Gabrielli. O executivo argumentou em recente palestra a empresários em São Paulo que o país já importa gasolina e corre o risco de ampliar a dependência nos próximos anos, caso não resolva as deficiências de refino. Para ele, há o dilema de avançar na autossuficência de petróleo enquanto dispara a procura de combustíveis nos postos.

Preocupado com a inflação e em não dar motivos para o Banco Central aumentar a taxa básica de juros (Selic), que já está em 12,25% ao ano, Mantega quer que o plano seja reapresentado com cortes na próxima reunião do Conselho, no fim de julho. Caso surja antes acordo sobre a redução do orçamento, um encontro extraordinário pode ser convocada para votar o plano revisado. Apesar de a Petrobras aplicar recursos do próprio caixa nos seus investimentos, o governo não quer ver os gastos disparando. A maior razão está na resistência em autorizar aumentos nas tabelas da gasolina e do diesel. Com 60% de sua receita concentrada na venda dos combustíveis, a Petrobras perderá faturamento se os preços atuais continuarem.

Especialistas não se surpreenderam com o novo adiamento sobre o plano de negócios, mas ficaram desconfiados quanto aos rumos que o Conselho de Administração dará à Petrobras, se político ou técnico. A ingerência do governo, impedindo que a estatal desse reajustes regulares da gasolina, foi o primeiro passo para a queda na credibilidade. A solicitação de estudos adicionais à diretoria foi vista como um ganho de tempo para fugir das críticas da opinião pública.

Margem de lucro Para o economista Álvaro Bandeira, diretor da Ativa Corretora, a discussão em torno dos cortes no plano está centrada nos percentuais a serem destinados ao refino e à exploração. "Torço para que o refino tenha mais atenção", disse, admitindo que isso reduziria a margem de lucro da companhia. Já David Zylberstajn, presidente da DZ Negócios em Energia, acha, contudo, que não pode haver conflito de interesses entre a gestão da Petrobras e o governo. Ele defendeu a prioridade para a exploração, ramo no qual a empresa efetivamente ganhará dinheiro e se tornará competitiva.

Lucas Brendler, analista da Geração Futuro, viu o adiamento como positivo, por revelar cautela dos executivos da Petrobras diante dos pedidos do Conselho. "Afinal, é muito dinheiro envolvido", disse. Erick Scott, da SLW Corretora, não concorda. "O atraso dos investimentos é ruim na minha opinião, pois já estamos na segunda metade de junho. E mostra, mais uma vez, a interferência do governo na empresa. Eles não explicam porque rejeitaram", comentou.

Ingerência preocupante No Plano de Negócios divulgado em junho do ano passado, a área de exploração e produção da Petrobras ficou com 53% dos US$ 224 bilhões a serem investidos em quatro anos. A área de abastecimento obteve, por sua vez, 33%. No plano anterior a esse, de 2009-2013, que previa desembolsos de US$ 174,4 bilhões, exploração e produção ficaram com 59% dos recursos e o abastecimento, só com 25%. A súbita elevação dos recursos para o refino de um ano para outro já tinha sido vista por analistas como ingerência política em favor de projetos no Nordeste.