Um dos desafios mais difíceis para o ordenamento das finanças públicas foi a renegociação das dívidas de estados e grandes municípios. Tentativas anteriores, antes do lançamento do real, não foram bem-sucedidas e havia pouca esperança que se conseguisse encontra uma solução para o problema. A verdade é que os entes federativos estavam à beira da insolvência, situação camuflada pela superinflação em que o país mergulhara.

Reordenar as finanças de estados e municípios exigiu medidas que os políticos rejeitavam, entre as quais a privatização de bancos e outras companhias, concessão de serviços públicos, venda de imóveis etc. Com a Lei de Responsabilidade Fiscal, os entes federativos passaram a ter limites para despesas, e assim foi possível estabelecer parâmetros para a renegociação das dívidas. A União resgatou os títulos emitidos por estados e municípios e os trocou por papéis do Tesouro. Na prática, a dívida federal aumentou, mas tendo em contrapartida créditos gerados a favor da União.

Os critérios para pagamento não foram únicos. Os entes federativos que tinham patrimônio equivalente a 20% da dívida, e se mostraram dispostos a cedê-lo ou aliená-lo, foram beneficiados com taxas de juros mais baixas. De qualquer forma, foi um fixado um teto, de 13% da receita líquida disponível, para comprometimento das amortizações do principal e dos juros.

Mas, dependendo do tamanho da dívida e dos juros acordados, esses 13% foram insuficientes até para cobrir o valor dos encargos financeiros devidos. Passados já alguns anos desses pagamentos, a dívida nominal de estados e municípios com a União até aumentou, embora possa ter diminuído como proporção da receita líquida disponível (pela lei, esse endividamento deve ser inferior a duas vezes do total das receitas).

Governadores e prefeitos se queixavam que a dívida é corrigida por um indexador (IGP-M)que os prejudica. Os pagamentos podem se manter no mesmo patamar, mas como a dívida cresce, os entes federativos não conseguem contrair novos financiamentos.

Por isso, o Congresso abraçou a causa dos entes federativos. O Senado não só aprovou a mudança do indexador como optou por um efeito retroativo capaz de reduzir substancialmente o montante da dívida. É preciso verificar se essa redução tem equivalência com o custo da dívida que o Tesouro assumiu pela emissão de títulos na época da renegociação. Se não houver, a decisão fere a Lei de Responsabilidade Fiscal, o que pode levar a presidente Dilma a vetar especificamente esse artigo, ainda que líderes dos partidos assegurem que o governo assumiu o compromisso de não alterar o projeto aprovado no Senado.

A decisão do Congresso equivale a uma nova renegociação da dívida. O princípio dessa mudança deveria ser não ferir a Lei de Responsabilidade, que foi tão importante para arrumar a casa.