A aprovação pelo Senado de projeto que muda o indexador das dívidas de Estados e municípios renegociadas com a União trará grande alívio para os devedores, que enfrentavam dificuldades crescentes para quitar seus débitos. Como ele já havia sido aprovado pela Câmara, o projeto segue para a sanção da presidente Dilma Rousseff, a qual é dada como certa. Sete Estados e cerca de 180 municípios, segundo cálculos preliminares, serão beneficiados e poderão aos poucos melhorar sua capacidade de investimento, afetada pelas regras anteriores.
O atual indexador das dívidas - o Índice Geral de Preços - Disponibilidade Interna (IGP-DI) mais 6% a 9% ao ano, conforme o caso - será substituído pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) mais 4% ao ano, ou pela taxa Selic, que hoje está em 11,25%. A opção será pela fórmula que representar o menor índice. Essa substituição vinha sendo reivindicada há muito tempo pelos atuais prefeitos e governadores dos municípios e Estados por ela favorecidos e seus antecessores. No caso da capital paulista, por exemplo, participaram desse esforço tanto Fernando Haddad como Gilberto Kassab, José Serra e Marta Suplicy, esta apesar de um grave tropeço.
Outro ponto importante, que demandou longas e difíceis negociações com o governo, temeroso de seu impacto nas contas públicas, é o que estabelece efeito retroativo para o fator de correção. O projeto concede um desconto no estoque da dívida para aqueles entes federados, que vale desde a assinatura dos contratos de renegociação das dívidas - o que para a maioria deles ocorreu no final da década de 1990 - até janeiro de 2013. Estima-se em R$ 59 bilhões a redução no estoque da dívida.
Os Estados e municípios terão, portanto, ganhos substanciais nos dois casos. E neles a capital paulista será o maior beneficiado. São Paulo estava numa situação particularmente delicada por causa de uma decisão infeliz da então prefeita Marta Suplicy. Em novembro de 2002, a Prefeitura deveria amortizar R$ 3 bilhões da dívida, conforme estabelecia o acordo de renegociação assinado em maio de 2000 por Celso Pitta, então prefeito, com o governo federal, para que ela continuasse sendo corrigida pelo IGP-DI mais 6%.
Como isso não foi feito, a correção passou a ser feita por um índice bem mais pesado - o IGP-DI mais 9%. Além disso, o índice incidiu retroativamente e provocou um grande crescimento do saldo da dívida, cuja amortização passou a exigir um esforço maior da Prefeitura. Tudo indica que Marta Suplicy preferiu apostar num alívio da situação durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, que tomaria posse pouco mais de um mês depois de sua decisão. O alívio não veio e a situação se agravou desde então, por causa da manutenção do indexador da dívida no nível mais elevado.
São Paulo é o grande ganhador nisso e também na redução do estoque da dívida. Daqueles R$ 59 bilhões, R$ 24 bilhões referem-se aos Estados e R$ 35 bilhões aos municípios. E destes nada menos do que R$ 26 bilhões são de São Paulo, cuja dívida passará de R$ 62 bilhões para R$ 36 bilhões, uma diminuição de 42%. Tudo isso permitirá à Prefeitura paulistana aumentar consideravelmente sua capacidade de investimento, o que acontecerá "gradualmente, em menos de seis anos", segundo Haddad.
Entre os outros beneficiários das mudanças está o Rio Grande do Sul, um dos Estados mais endividados. O Estado de São Paulo também terá ganho significativo, embora em prazo mais longo que o da capital. O valor repassado anualmente à União para amortizar a dívida continuará por volta de R$ 14 bilhões, ou 13% do orçamento. Mas segundo o secretário estadual da Fazenda, Andrea Calabi, a diferença é que, com o novo indexador, o saldo devedor cairá de R$ 130 bilhões para R$ 40 bilhões em 2027.
A necessidade de manter o controle, cada vez mais ameaçado, das contas públicas fez a presidente Dilma Rousseff só ceder no último momento à pressão de sua própria base aliada, da oposição e de governadores e prefeitos para a aprovação do projeto.