Se as denúncias de corrupção na Petrobras forem comprovadas e os resultados apurados prejudicarem investidores estrangeiros, a estatal corre o risco de ser multada em até US$ 20 bilhões pela Securities and Exchange Commission (SEC), órgão dos Estados Unidos equivalente à Comissão de Valores Mobiliários (CVM). A Justiça norte-americana também pode decretar a prisão de diretores e conselheiros da empresa.

Eles sõ serão presos, contudo, se deixarem o país. Isso é o que garante a lei das companhias de capital aberto dos Estados Unidos, fiscalizada pela SEC e amparada por tribunais de várias instâncias. Como a Petrobras negocia ações na Bolsa de Nova York, está submetida às regras norte-americanas, bem mais rígidas do que as brasileiras. Especulações nesse sentido levaram as ações preferenciais (PN) da Petrobras caírem ontem 1,19%, quando o pregão da bolsa paulista fechou em alta de 1,57%.

As penalidades da CVM são mais brandas, mas as multas se multiplicam caso as fraudes sejam reincidentes. Os responsáveis podem ficar inabilitados por até 20 anos, antes mesmo do julgamento definitivo. A SEC é uma agência de aplicação da lei, que recomenda abertura de investigações quando verifica violações de regras. “Trabalhamos em estreita colaboração com outros órgãos e ao redor do mundo para levar casos ao nível criminal, se apropriado for”, explicou o órgão ao Correio.

Com a ordem formal de investigação, a SEC autorizaria os funcionários a abrir processo num tribunal federal ou uma ação administrativa, ou mesmo ambas. Entre as violações que podem levar a investigações do órgão incluem a deturpação ou a omissão de informações importantes e manipulação de preços da ações. Nas ações civis, a queixa são levadas a um tribunal distrital, exigindo ordem judicial ou liminar e auditorias.

Cabe à SEC ainda aplicar multas e obrigar a devolução de lucros ilegais, mas aceita celebrar acordos. Pagando multas bilionárias, os culpados conseguem se livrar dos julgamentos criminais. Desde 2012, mais de 10 bancos foram multados em mais de US$ 80 bilhões. O banco JPMorgan Chase, usado no esquema do empresário Bernard Madoff, por sua vez, pagou US$ 1,7 bilhão para evitar ir a julgamento no início deste ano. Em julho último, após meses de negociações, o banco norte-americano Citigroup desembolsou US$ 7 bilhões por responsabilidade na crise das hipotecas nos EUA, iniciada em 2008. 

Um ex-presidente da CVM destacou que o órgão regulador do mercado acionário dos EUA não é só mais ágil e incisivo do que o seu equivalente no Brasil. “Lá, as investigações e as punições não excluem nenhum envolvido, seja acionista, membro da diretoria executiva ou conselheiro. Eles vão para cima de quem cometeu o ilícito, cabendo até mesmo o pedido de prisão dos investigados”, sublinhou. A presidente Dilma Rousseff, por exemplo, estava à frente do Conselho de Administração da Petrobras quando da polêmica compra da refinaria de Pasadena (EUA), em 2006.

O executivo lembrou que não é por acaso que cidadãos brasileiros com problemas na Justiça norte-americana temem deixar o país e serem presos lá fora. “Os órgãos de controle locais aplicam a lei com igual rigor a todos. Alguns podem até ser banidos para sempre”, observou. Quanto às multas, lembrou que são proporcionais ao prejuízo provocado pelas irregularidades. A movimentação da Petrobras no sentido de processar ex-diretores “pode ser até um atenuante”, “mas não impede as ações em curso”.

“O pior dano hoje é para a imagem do mercado de capitais brasileiro, ainda mais com a notícia de julgamento do empresário Eike Batista”, observou Cláudia Kodja, consultora de negócios internacionais. Ela ressaltou que, nos EUA, a resposta às demandas de investidores é mesmo rápida.

Expectativa
O ex-diretor da CVM René Garcia acha precipitado falar em valores de multas. “O que temos ainda é uma investigação. A maior multa até hoje aplicada pela SEC foi de US$ 13 bilhões para o JP Morgan (que depois teve que pagar mais US$ 7 bilhões).

Rita Maria Scarponi, ex-vice-presidente do Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional (CRSFN), informa que as multas da CVM vão desde R$ 500 mil ou 50% do valor da emissão ou operação até três vezes o montante da vantagem econômica obtida. A Lei nº 6.385, de 1976, prevê sanções para infrações graves como a suspensão do exercício do cargo de administrador ou de conselheiro, e inabilitação de até 20 anos. (Colaborou Sílvio Ribas)

Moody’s revisa a nota da OAS
A agência norte-americana de classificação de risco Moody’s mudou ontem a perspectiva da OAS de “estável” para “negativa” e manteve a nota da construtora em B1. A decisão foi motivada pela percepção de “maior risco operacional” da empresa investigada pela Polícia Federal. “Embora as investigações ainda estejam em andamento e nenhuma conclusão tenha sido alcançada, acreditamos que esses eventos podem prejudicar a curto prazo a estratégia de crescimento da OAS”, ressaltou.

 

 

Obra paralisada em PE

 

 


Encurralada por denúncias de todos os lados, a Petrobras ainda tem que lidar com a paralisação de cerca de 4 mil funcionários do consórcio responsável pelas obras da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco. O assessor de crise do Sindicato de Trabalhadores na Indústria de Construção Pesada (Sintepav/PE), Leodelson Bastos, afirmou que os funcionários da Alumini Engenharia, que faz parte do consórcio, não receberam salários. O sindicato quer obter, na Justiça, rescisão indireta dos empregados, para garantir seus direitos como se tivessem sido demitidos.

A Petrobras informou, ontem, que a paralisação não deverá afetar o cronograma para o início das atividades. Os problemas na refinaria, que custou cerca de 
US$ 18,5 bilhões, valor bem acima do previsto inicialmente, começaram em agosto de 2013. “São quase 6 mil pessoas sem receber, algumas foram demitidas sem direitos. As outras decidiram parar as atividades. Cerca 1,8 mil trabalhadores que estão alojados no canteiro de obras tiveram a energia cortada nos dormitórios e serão despejados”, afirmou Bastos.

Não há informações que indiquem que a situação esteja relacionada aos desdobramentos da Operação Lava-Jato. A Alumini não foi citada.

“A Petrobras ratifica que está em dia com suas obrigações contratuais e que os pagamentos de seus compromissos com todas as empresas estão sendo realizados de acordo com a legislação vigente e com o estabelecido em contrato”, disse a estatal, por meio da assessoria de imprensa. “A companhia esclarece, ainda, que é das empresas contratadas a responsabilidade de honrar as obrigações trabalhistas”, acrescentou. (SK)

 

 

Perda pode ir a R$ 26 bi

 

 

 

 

 

A baixa contábil nos balanços da Petrobras, reconhecida como necessária pela presidente da empresa, Graça Foster, pode ser de US$ 10 bilhões, o equivalente a R$ 26 bilhões, segundo analistas do banco UBS. A estatal adiou a divulgação dos resultados do terceiro trimestre porque a Pricewaterhouse Coopers (PwC), responsável pela auditoria externa, não quis avalizar os dados, devido ao escândalo de corrupção no qual a petroleira está afundada. A revisão dos números deverá reduzir o valor dos ativos.

Ontem, o UBS cortou a recomendação para as ações ordinárias da empresa de compra para neutra e reduziu o preço-alvo do papel de R$ 20 para R$ 15, segundo relatório enviado a clientes. “Nós nos tornamos mais negativos em relação à Petrobras nas últimas duas semanas e cortamos substancialmente nossas estimativas de lucro por ação para 2014-2016, refletindo um real mais fraco ante a alta alavancagem da companhia e a hipótese de uma baixa contábil de US$ 10 bilhões, principalmente em projetos de refino”, disseram os analistas Lilyanna Yang e Carlos Herrera.

O UBS justificou a medida com base na pressão sobre os custos da Petrobras, que terá capacidade limitada de reajustar os preços nas refinarias, devido à deterioração da situação fiscal no Brasil e à queda no preço do petróleo Brent no mercado internacional. “Nós vemos a necessidade de US$ 45 bilhões em emissão de dívida em 12 meses, que provavelmente virão com custos mais elevados ou com maiores temores do mercado de ações no contexto do escândalo de corrupção, que levou a um atraso na divulgação dos resultados do terceiro trimestre”, diz o relatório.

Diferenças
Na opinião do analista de investimentos e consultor Robson Pacheco, atrasar a publicação do balanço foi uma atitude prudente. “Entregar os números dentro do prazo e comprometer as informações, que poderão ter ajustes significativos, colocariam os investidores em risco”, disse. Para Pacheco, a companhia deverá fazer uma provisão ou um contingenciamento dos valores referentes às diferenças em relação aos contratos com as empreiteiras envolvias no pagamento de propinas. “Se tentar fechar o balanço, vai demorar muito tempo, porque os números ainda precisam ser avaliados por auditorias externas. O correto seria fazer uma provisão e promover um ajuste depois”, explicou.

Contudo, o analista assinalou que, para tranquilizar o mercado, seria importante a Petrobras anunciar, com o provisionamento, quando serão feitos os ajustes, se no trimestre seguinte ou no fechamento do balanço deste ano. “A companhia não tem como acertar o valor das diferenças agora. O que pode fazer é um provisionamento para mais ou para menos”, alertou.