Apesar de já ter marcado o anúncio dos novos ministros da Fazenda, Joaquim Levy, e do Planejamento, Nelson Barbosa, para esta quinta-feira, tentando, assim virar a página e definir os rumos da política econômica do segundo mandato, a presidente Dilma Rousseff não vai conseguir dormir tranquila nos próximos dias. A aprovação do Congresso Nacional ao polêmico projeto de lei que autoriza o governo a descumprir a meta de superavit primário de 2014 não sairá nesta semana, como ela esperava. A votação da proposta, que altera a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), prevista para ontem, foi adiada para a próxima terça-feira, por falta de quórum.

A discussão do projeto tem sido tumultuada e difícil para o governo. Na Comissão Mista do Orçamento (CMO), o texto precisou de três reuniões e muita briga para ser aprovado, mesmo com maioria governista entre os 40 integrantes do colegiado. Enquanto isso, a oposição faz de tudo para impedir a mudança das regras fiscais.

Ontem, os partidos oposicionistas — PSDB, DEM, PPS e PSB — impetraram no Supremo Tribunal Federal (STF) dois mandados de segurança para suspender a tramitação do projeto. Num deles, alegam que houve abuso da Presidência do Congresso ao impedir a discussão em separado dos 38 vetos presidenciais que trancavam a pauta da casa até a quarta-feira. “A apreciação dos projetos em cédula única atropelou o processo legislativo constitucional e desrespeitou o direito de discussão dos assuntos”, sustenta o pedido encaminhado ao STF. 

Na véspera, o PSDB já havia entrado com mandado para suspender a tramitação do projeto, e avisou que deve propor uma Ação de Inconstitucionalidade (Adin) se a alteração for aprovada. “Esse projeto é nefasto para o povo. De um lado, ele exime a presidente Dilma Rousseff das consequências jurídicas de sua irresponsabilidade fiscal; de outro, o governo manda às favas os limites de endividamento”, disse o senador Aloysio Nunes (PSDB-SP). “Isso tem consequência direta nos custos do governo, no aumento da taxa de juros, não apenas para ele, mas para todos que forem fazer um financiamento”, emendou.

Otimismo

Mesmo com os percalços, o governo se diz confiante na aprovação da proposta na semana que vem. O relator do texto, senador Romero Jucá (PMDB-RR), avaliou que houve muitos avanços nos últimos três dias. “Aprovamos (o projeto) na CMO e limpamos dispositivos de veto que estavam trancando a pauta”, disse ele, lamentando, porém, a falta de quórum na sessão de ontem. “Nossa expectativa, quando a gente abre a sessão é sempre de votar. Agora, depende dos nossos nobres pares”, completou.

O secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, também demonstrou otimismo. “Acreditamos na aprovação do projeto”, disse o secretário, citando que o governo cogita até a venda de ações de bancos públicos para compor a meta fiscal.

Na avaliação do economista Raul Velloso, especialista em contas públicas, se o problema da LDO for superado, o próximo governo não terá mais obstáculos para fazer um ajuste firme no próximo ano, o que desarmaria a oposição. “Estamos no meio da transição do governo Dilma 1 para o Dilma 2. A trajetória da dívida pública é menos favorável do que seria se o superavit tivesse sido maior”, alertou.

Sem compromisso
A proposta permite que o governo desconte da meta fiscal de 2014 todo o valor das despesas com desonerações tributárias e com o Programa de aceleração do Crescimento (PAC), eliminando o teto fixado na LDO, que é de R$ 67 bilhões. Somente até outubro, essas duas rubricas somaram R$ 135,9 bilhões. Na prática, isso significa que o governo não terá obrigação de alcançar superavit primário, podendo até fechar o ano com deficit.