SÃO PAULO
O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, criticou ontem o que chamou de tentativa de "politização" da nova etapa da Operação Lava-Jato, da Polícia Federal, acusando a oposição de tentar promover um "terceiro turno eleitoral" ao dizer que as prisões comprometeriam o governo Dilma Rousseff. A PF prendeu 23 pessoas até ontem, entre diretores e presidentes das maiores empreiteiras do país e o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque. Eles são acusados de participar de um esquema para desviar dinheiro da estatal e de pagar propinas a políticos do PT, PMDB e PP.
- O governo não mudará um milímetro de sua conduta, na perspectiva de conduzir sua investigação e apurar, doa a quem doer, seja quem for o envolvido. Falo isso para repelir com veemência tentativas de se construir por cima desta investigação um terceiro turno eleitoral. É uma postura muito ruim, que não contribui para o avanço das investigações - disse Cardozo, classificando a ação da oposição como uma forma "pouco democrática de tentar desestabilizar o governo".
Cardozo condenou o que chamou de "eleitorização" do caso.
- Numa hora em que o Brasil precisa colocar tudo em pratos limpos, é necessário que as pessoas tenham maturidade de não levar para o plano político-eleitoral o que os brasileiros desejam - continuou o ministro, argumentando que a "eleitorização" da investigação faz com que ela seja colocada em "xeque e sob suspeita", o que não é desejável.
Sem citar nominalmente o candidato derrotado à Presidência, Aécio Neves (PSDB), Cardozo disse que a tentativa de desestabilização do governo ocorre por parte "daqueles que talvez não tenham digerido o resultado eleitoral, talvez porque tenham comemorado antes da hora uma vitória que não houve".
- Estou me referindo a toda e qualquer pessoa que neste momento tente transformar isso num palanque, tentando manter o clima eleitoral. Mantém o clima eleitoral quem tem uma questão mal resolvida. Talvez Freud explique - ironizou o ministro da Justiça.
Por várias vezes durante a coletiva, Cardozo afirmou que tanto forças do governo quanto da oposição são investigadas no âmbito da Operação Lava-Jato.
Dilma foi avisada da operação
Cardozo disse ter sido informado sobre a última etapa da operação por volta de 5h30m de sexta-feira, em sua casa, pelo diretor da Polícia Federal, Leandro Daiello Coimbra. Por volta de 6h30m, ele telefonou para a presidente Dilma Rousseff, que estava em viagem para participar da reunião do G20, na Austrália, para informá-la sobre a operação da PF.
- Ela transmitiu exatamente o que estou dizendo: peça à Polícia Federal que prossiga com firmeza na apuração das irregularidades, que proceda com absoluta lisura e imparcialidade nas investigações. Que zele para que tudo seja esclarecido - relatou o ministro.
Para Cardozo, o governo não está em crise em função das revelações da operação e das prisões de envolvidos.
- Não há crise nenhuma. Temos a consciência tranquila de que estamos cumprindo com o nosso dever. O dever é apurar, o dever é punir. Não tentamos esconder sujeira para baixo do tapete, não tentamos castrar investigação em nenhum momento, como muita vezes já se viu outrora - disse.
Ao ser perguntado se, na condição de filiado ao PT, Cardozo considerava um motivo de constrangimento o fato de João Vacarri Neto, um dos investigados, ser mantido no cargo de tesoureiro do seu partido, o ministro não defendeu o afastamento do correligionário.
- Desde o meu primeiro ano da faculdade de Direito, eu aprendi que é indevido prejulgar. Eu não faço isso com amigos, não faço com inimigos. Vamos olhar os fatos e investigá-los - afirmou.
Perguntado ainda se sua decisão de apurar a conduta de delegados vinculados à Operação Lava-Jato, que teriam se manifestado a favor da candidatura de Aécio Neves (PSDB) à Presidência e contra o governo em redes sociais, era uma forma de intimidá-los, Cardozo negou.
- A liberdade de manifestação é garantida pela Constituição, o servidor público pode fazer o comentário que quiser. Se ofender a honra de alguém, cabe àquele alguém entrar na Justiça. Outra coisa é a imparcialidade da investigação. Se uma pessoa se manifesta e não traduz seu desejo político para investigação, não há nada a ser recriminado. Porém, se alguma pessoa tem paixão e utiliza a função pública para perseguir sua paixão, aí tenho uma ilegalidade - afirmou o ministro, dizendo que sua função é zelar pela investigação, para que "amanhã ou depois" provas não sejam anuladas.