A Petrobras informou ontem à noite que adiou a divulgação de seu balanço financeiro e, pela primeira vez, reconheceu que tomou a decisão devido a "possíveis ajustes contábeis" por causa da Operação Lava-Jato, da PF. A decisão ocorreu após a empresa de auditoria PricewaterhouseCoopers se recusar a assinar o balanço sem antes receber relatórios internos da estatal sobre as denúncias de corrupção. A auditoria já havia exigido a demissão do presidente licenciado da Transpetro, Sérgio Machado, citado nas denúncias. O prazo para a Petrobras divulgar o balanço expirava hoje. -RIO E SÃO PAULO- Em meio a graves denúncias de corrupção, a Petrobras adiou a divulgação de seu balanço, que ocorreria hoje, para 12 de dezembro. A decisão, segundo fontes, ocorreu após a Pricewaterhouse Coopers (PwC), auditora da estatal, ter se recusado a assinar o balanço. Essas fontes disseram que a empresa de auditoria temeria responder judicialmente perante as autoridades reguladoras do mercado americano, a cujas leis também tem de obedecer. Em fato relevante enviado à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), a Petrobras admitiu, pela primeira vez, que terá de fazer "possíveis ajustes nas demonstrações contábeis com base nas denúncias e investigações relacionadas à Operação Lava-Jato, da Polícia Federal (PF)". A estatal disse ainda que vai avaliar a necessidade de melhorias nos controles internos. Com isso, informou que não está pronta para divulgar seus resultados.
No texto enviado à CVM, a Petrobras faz menção ao "teor do depoimento do ex-diretor de Abastecimento Paulo Roberto Costa à Justiça Federal em 08/10/2014, quando fez declarações que, se verdadeiras, podem impactar potencialmente as demonstrações contábeis da Companhia". Por isso, explicou, "em decorrência do tempo necessário para se obter maior aprofundamento nas investigações em curso pelos escritórios contratados e proceder aos possíveis ajustes nas demonstrações contábeis com base nas denúncias e investigações, não está pronta para divulgar as demonstrações contábeis".
Segundo uma fonte, a PwC teria se recusado novamente a assinar o balanço da estatal referente ao terceiro trimestre, alegando ser necessária uma análise sobre os relatórios elaborados pelas comissões internas de autoria da estatal. O imbróglio começou no dia 31 de outubro, durante reunião do Conselho de Administração da Petrobras. Na ocasião, de acordo com uma fonte ligada à estatal, a PwC recusou-se a validar o balanço, alegando que Sergio Machado, até então presidente da Transpetro, não poderia assinar o documento, já que seu nome havia sido citado por Paulo Roberto Costa em seu depoimento ao Ministério Público, como parte da delação premiada. Em uma tentativa de viabilizar a aprovação, Machado anunciou licença não remunerada por 31 dias no último dia 3.
- A Price quer ver ainda ver os relatórios das comissões internas da Petrobras. Essas comissões geraram relatórios das refinarias de Pasadena, nos Estados Unidos, do Comperj, no Rio de Janeiro, e de Abreu e Lima, em Pernambuco. Esses relatórios já estão prontos. A Price quer se resguardar. Mas do que adianta não aprovar agora se aprovou os trimestres anteriores? Isso não a isenta de problemas (com as autoridades regulatórias do Brasil e dos Estados Unidos) - disse uma fonte que não quis ser identificada.
AUDITORES TEMEM LEI ANTICORRUPÇÃO DOS EUA Ontem à noite, com a confirmação oficial pela estatal, às 20h17m, alguns membros do Conselho de Administração da companhia foram pegos de surpresa com a notícia. Hoje, haverá reunião entre os conselheiros, a partir das 9h, por meio de teleconferência, em Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília. Segundo uma fonte, o balanço é o tema mais importante da pauta. Hoje termina o prazo para as empresas de capital aberto arquivarem na CVM seus resultados referentes ao terceiro trimestre, segundo a instrução 480 da autarquia. O não cumprimento desse prazo acarreta multa diária de R$ 500. A Petrobras classificou o atual momento como "único" em sua história e destacou que a contratação de escritórios de investigação no fim de outubro - o brasileiro Trench, Rossi e Watanabe Advogados, além do americano Gibson, Dunn & Crutcher LLP - foi recomendada pelo Comitê de Auditoria da estatal.
-É a primeira vez que a Petrobras não publica o seu balanço dentro do prazo previsto pela CVM - destacou essa mesma fonte.
A Petrobras informou ainda que, mesmo em 12 de dezembro, o balanço não deve ser publicado com o parecer dos auditores. "Em observância ao princípio da transparência, a Petrobras estima divulgar, no dia 12 de dezembro de 2014, informações contábeis relativas ao terceiro trimestre de 2014 ainda não revisadas pelos Auditores Externos, refletindo a sua situação patrimonial à luz dos fatos conhecidos até essa data", afirmou em comunicado. A estatal lembrou ainda que está empenhada em divulgar as informações revisadas pelos auditores externos o mais breve possível, mas não fixou uma data.
Segundo um advogado que não quis se identificar, o escritório da PwC no Brasil está sujeito às leis dos Estados Unidos. Por isso, desde que o Departamento de Justiça passou a investigar as denúncias sobre corrupção na Petrobras, os auditores brasileiros se tornaram passíveis de serem responsabilizados pela legislação americana anticorrupção.
- O governo americano já havia informado à Price nos EUA que a Price do Brasil deveria cumprir as mesmas regras de controle. Diante disso, é natural que a Price daqui tenha ficado com medo de dar um parecer favorável ao balanço antes do fim da apuração das denúncias. O inquérito do Departamento de Justiça é criminal. A responsabilidade dos auditores é autônoma da dos administradores. Eles podem ser responsabilizados em processos separados pelos desvios. É isso que eles temem - disse esse advogado.
Segundo Fernando Zilveti, professor da FGV especialista em Finanças Públicas, o primeiro impacto será visto nos preços das ações, que já vêm sofrendo desde o início das denúncias. Ao não publicar o balanço, explicou, a Petrobras estará impedida de distribuir dividendos e repassar lucros para o Tesouro, que é seu controlador.
- O que traz sérias implicações para o futuro da empresa - disse Zilveti.
Fernando Araújo, gestor da FCL Capital, disse que a suspensão da publicação do balanço não chega a ser uma surpresa, pois os investidores já estavam colocando no preço dos papéis os problemas de gestão e interferência política na estatal: - Não é uma notícia positiva para as ações da Petrobras. Ao olhar um período mais longo, de uns 24 meses, os papéis da estatal estão sendo castigados devido aos questionamentos sobre interferências políticas e às investigações sobre corrupção.
Apesar do adiamento, analistas do mercado esperam um resultado fraco, com lucro líquido da ordem de R$ 3 bilhões, abaixo dos R$ 5 bilhões do segundo trimestre e dos R$ 3,4 bilhões registrados no mesmo período de 2013.