CURITIBA - Apontado como operador do PMDB no desvio de recursos da Petrobras, o lobista Fernando Soares, conhecido como Fernando Baiano, entregou-se ontem à Polícia Federal, em Curitiba (PR). Ele estava com a prisão temporária decretada desde a última sexta-feira, quando teve também o nome incluído na lista de procurados pela Interpol.

O lobista estava em São Paulo e chegou à sede da PF na capital paranaense de táxi. No documento assinado por ele na unidade policial, consta que se entregou às 17h7m. Por volta das 20h, ele deixou o local em uma viatura, supostamente para fazer exame de corpo de delito.

A apresentação de Baiano causou surpresa porque, semana passada, o advogado Mário de Oliveira Filho disse que ele estava sendo usado como "bode expiatório" e que não se entregaria. Oliveira Filho afirmou que seu cliente estava colaborando com as investigações e que tinha depoimento marcado. A defesa entrou com um pedido de habeas corpus ainda na semana passada, na tentativa de revogar o mandado de prisão, mas ambos resolveram mudar de estratégia. Ontem, o GLOBO tentou contato com o advogado, mas não teve retorno.

Negromonte foragido

Agora, o único com mandado de prisão expedido na sétima fase da Operação Lava-Jato e que continua foragido é Adarico Negromonte Filho, irmão do ex-ministro das Cidades Mário Negromonte (PP-BA). Ontem, a defesa dele apresentou um pedido de revogação da prisão temporária, alegando que, no dia das prisões, seu cliente não foi procurado em sua residência. Por isso, a defesa sustenta que ele não pode ser considerado foragido.

A polícia e o Ministério Público Federal chegaram ao nome de Baiano após o doleiro Alberto Youssef, preso desde março, ter afirmado à Justiça que o lobista operava a cota do PMDB no esquema de corrupção na Petrobras. Ele teria distribuído propinas a agentes públicos e valores para partidos políticos sobre porcentagens de contratos bilionários da estatal petrolífera. Somente na intermediação de um contrato de venda de sondas de perfuração para a Petrobras, Fernando Baiano teria recebido cerca de R$ 20 milhões.

Segundo o doleiro, Baiano fazia a ponte entre a construtora Andrade Gutierrez e a estatal. O Ministério Público Federal afirmou, na denúncia que justificou o pedido de prisão temporária de Baiano, que os executivos Júlio Camargo e Augusto Ribeiro, da Toyo Setal, informaram ter pago R$ 154 milhões em propina aos operadores do PT e do PMDB dentro da Petrobras. Segundo os delatores, o lobista atuava na diretoria Internacional da Petrobras, comandada por Nestor Cerveró.

A Justiça decretou ainda o bloqueio de ativos de empresas que pertencem a Baiano e que teriam sido usadas para receber propina, simulando contratos de prestação de serviços: a Technis Planejamento e Gestão e a Hawk Eyes Administração.

A veiculação das suspeitas de envolvimento do lobista com o PMDB fez o vice-presidente Michel Temer, presidente nacional do PMDB, divulgar, sexta-feira, uma nota alegando que Baiano "nunca teve contato institucional com o partido".

No mesmo dia, agentes da PF estiveram em dois imóveis de Baiano, na Avenida das Américas e na Avenida Lúcio Costa, na Barra da Tijuca, no Rio, mas não o encontraram. Os policiais vasculharam os locais e apreenderam documentos e computadores. Também na sexta-feira, a PF lançou o nome de Fernando Baiano na difusão vermelha, índex dos mais procurados do mundo, segundo registros da Interpol, que mantém conexões com quase 200 países.

Planilhas apreendidas pela PF na Operação Lava-Jato reforçam os indícios de pagamentos em série de propinas a Fernando Baiano a partir da intermediação de negócios da estatal. Num trecho de uma delas, o nome dele aparece associado a valores como R$ 600 mil, R$ 450 mil, R$ 500 mil, conforme relatório da investigação obtido pelo GLOBO.

esquema das consultorias

Baiano opera por meio de consultorias sediadas no Rio, em São Paulo e Brasília como forma de "legitimar" o dinheiro recebido das empresas. Uma das consultorias, segundo investigação da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) da Petrobras, é de Baiano, mas estaria em nome de um laranja. Por meio dela, é que seria viabilizada a maior parte dos desvios de recursos que abasteceriam o PMDB.

Baiano começou a intermediar negócios entre o setor público e empreiteiras na Bahia. Vinculou-se a políticos tradicionais e empresários locais, cacifando-se para alavancar contratos junto à Diretoria de Abastecimento da Petrobras, razão pela qual mudou-se para o Rio ainda no governo Lula. Ele já admitiu que conhecia Paulo Roberto Costa, um dos ex-diretores presos em março deste ano e que agora cumpre prisão domiciliar. Com Costa, ele teria tratado de interesses de empresas espanholas junto à Petrobras.

O lobista já foi dono de uma academia no Rio, vendida em 2013 para o empresário Alexandre Accioly e transformada na Bodytech. Além de aproximar-se de atletas e gestores ligados ao Comitê Olímpico Brasileiro (COB), ele tinha na Petrobras como principais interlocutores Paulo Roberto Costa e seus assessores.

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Petrobras rompe contrato com Iesa no RS

Presidente da empresa, que tem dívidas de r$ 2 bilhões, foi preso

 

Flávio Ilha

 

PORTO ALEGRE - A Petrobras decidiu romper, segunda-feira, o contrato de fornecimento de módulos para plataformas de petróleo da camada pré-sal na Bacia de Santos mantido com a Iesa Óleo e Gás desde o início de 2013 na cidade gaúcha de Charqueadas, na Região Metropolitana de Porto Alegre.

O contrato, de US$ 911 milhões, previa a construção de 24 módulos de compressão para seis plataformas de petróleo e mais oito para duas replicantes do pré-sal. A Iesa é uma das sete empresas com contratos junto à Petrobras que foram alvo da sétima etapa da Operação Lava-Jato, da Polícia Federal (PF).

O presidente da Iesa Óleo e Gás, Valdir Carrero, foi preso com um dos diretores da empresa, Otto Garrido Sparenberg. A investigação da PF apurou que a Iesa repassou R$ 400 mil para a empresa do ex-diretor da Petrobras, Paulo Roberto Costa, que está em prisão domiciliar.

A Iesa é uma empresa controlada pelo grupo paranaense Inepar, que, em setembro, ingressou com pedido de recuperação judicial devido a dívidas de R$ 2 bilhões.

A informação sobre o rompimento do contrato, divulgada pelo prefeito de Charqueadas Davi Gilmar de Souza (PDT), foi confirmada ontem pela estatal. Em comunicado, a Petrobras informou que o contrato para fornecimento do pacote III de módulos de replicantes foi rescindido e que uma nova licitação será realizada oportunamente para a recontratação dos serviços.

demissão de mil pessoas

A rescisão, segundo o comunicado, foi uma decisão conjunta da estatal com os parceiros privados na exploração da área, a inglesa BG e a portuguesa Galp Energia. A Petrobras não informou se a produção dos módulos será mantida no Brasil - uma parte da encomenda já havia sido transferida em outubro para fornecedores chineses.

Prefeito de Charqueadas, Souza estava em Brasília em audiência com o vice-presidente Michel Temer para tentar uma solução alternativa ao contrato quando recebeu a notícia. A previsão é que o rompimento cause a demissão de mil trabalhadores diretos e impacte a atividade de outras 4.000 pessoas no município, de 35 mil habitantes.

- Estamos tentando construir uma solução alternativa. Se não for com a Iesa, que seja com outras empresas. O assunto será tratado com o ministro Edison Lobão (Minas e Energia) - informou Souza.

Na última quarta-feira, o Comitê Pró-Charqueadas convocou manifestação e fechou uma estrada para pressionar por uma solução ao impasse. Souza disse que a situação da empresa "vinha se arrastando há meses".

O prazo para o fornecimento dos módulos era de 54 meses. Para viabilizar as encomendas, a Iesa construiu uma fábrica, às margens do Rio Jacuí, com 350 mil metros quadrados de terreno e 19 mil metros quadrados de área construída.

O investimento no complexo, de R$ 100 milhões, teve financiamento de R$ 43,7 milhões por parte do Badesul, banco de fomento do estado. Além disso, recebeu mais R$ 5 milhões de outros dois bancos públicos do Rio Grande do Sul.

Mais de 1,5 mil postos de trabalho foram gerados no pico do empreendimento, no primeiro semestre deste ano. Os primeiros módulos, que deveriam ter sido repassados à Petrobras no dia 19 de julho, não foram entregues.