BRASÍLIA
Após cerca de um ano de consultas informais com o Brasil - que acabaram se revelando infrutíferas -, a União Europeia (UE) pediu ontem, em Genebra, a abertura de um painel (comitê de arbitragem) na Organização Mundial do Comércio (OMC) contra os incentivos fiscais oferecidos pelo governo brasileiro a setores como o automotivo (Inovar-Auto) e o de tecnologia da informação, para produtos como smartphones e tablets. Segundo a UE, o país aplica altos impostos para importações em diversas áreas, enquanto as indústrias brasileiras podem se beneficiar de isenções tributárias ou reduções seletivas.

No automotivo, o Inovar-Auto permite o abatimento do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para as montadoras que utilizam peças e insumos nacionais, regime que começou em 2013 e vai até 2017. No caso dos smartphones e tablets, a alíquota de PIS/Pasep e Cofins foi zerada.

"Na opinião da UE, as medidas tributárias brasileiras dão uma vantagem injusta a fabricantes domésticos e vão contra regras da OMC", disse a Comissão Europeia em comunicado, acrescentando que o objetivo da queixa é "eliminar casos de discriminação e de incentivos fiscais ilegais". Os europeus esclarecem que a medida não tem por fim questionar a política fiscal brasileira em si, especialmente se esta é voltada ao desenvolvimento. A ideia é levar a julgamento o que consideram práticas ilegais de comércio.

Os europeus reclamam que o Brasil restringe o comércio, ao exigir de fabricantes nacionais o uso de componentes domésticos para ter benefícios fiscais.

O governo brasileiro está convencido de que não perderá a ação. Segundo o ministro das Relações Exteriores, Luiz Alberto Figueiredo, um ponto positivo é que os europeus não incluíram em seus questionamentos o regime da Zona Franca de Manaus, conforme ameaçavam anteriormente:

- Achamos que nossos regimes (o automotivo e outros) são plenamente compatíveis com as regras da OMC.

Para o ministro, a ação não vai afetar as negociações entre Mercosul e UE para um tratado de livre comércio. Ao contrário, a retomada das negociações, que deverá ocorrer no ano que vem, poderá facilitar o diálogo para um entendimento, acredita ele.

Ação pode levar anos

Dependendo do caso, a conclusão de um painel pode levar anos. A ação é levada ao âmbito do Órgão de Solução de Controvérsias da OMC e, após prazos, muitas vezes prorrogáveis, de defesa e recursos do reclamante, os árbitros elaboram um relatório dizendo quem está com a razão. Às vezes, recomendam modificações nos regimes aplicados pelo país alvo da queixa.

Um exemplo recente é o do algodão. O Brasil entrou na OMC contra os subsídios fornecidos pelo governo americano em 2004. Venceu a disputa e ficou com o direito de retaliar os EUA em US$ 900 milhões, mas concordou em suspender a punição em troca de um acordo que previa repasse de recursos a um fundo de assistência aos cotonicultores brasileiros. Porém, os EUA não cumpriram a palavra.