BRASÍLIA - O reconhecimento de que a produção de petróleo da Petrobras não vai aumentar quanto se esperava este ano, combinado a uma perspectiva de cuidado redobrado nas contratações futuras da estatal a partir da Operação Lava-Jato da Polícia Federal, deverão deixar ainda mais distante a retomada da autossuficiência do Brasil no setor. Antes de o ritmo de alta da produção ser reduzido de 7,5% em 2014 para algo entre 5,5% e 6%, segundo previsões divulgadas pela estatal na última segunda-feira, assessores da presidente Dilma Rousseff e dirigentes da Petrobras esperavam que, em algum mês no fim de 2015, o país já poderia voltar a ter uma produção diária de barris de petróleo acima do consumo interno.

Com a revisão feita pela Petrobras, fica mais provável que em 2015 essa equivalência ainda não seja atingida, mesmo com a disparada na produção de petróleo e gás natural (em barris equivalentes) neste ano. Desde janeiro, a produção média diária de petróleo no país subiu em 300 barris, depois de dois anos de produção em queda.

No ano, déficit de 13,7%

Em agosto, último dado disponível, o Brasil produziu uma média diária de 2.423 mil barris e consumiu 2.725 em derivados. No ano, há um déficit de 13,7% entre o consumo e a produção.

- É difícil que o crescimento da produção seja tão grande em 2015 (como tem sido em 2014), porque não vão entrar em operação tantas plataformas quanto entraram entre o fim de 2013 e o início deste ano - disse uma fonte do governo.

Quando a perspectiva de aumento da produção da estatal ainda era superior, em fevereiro, a presidente da Petrobras, Maria das Graças Foster, previu que, em 2015, a autossuficiência em produção de petróleo no país seria retomada. A Petrobras produz tradicionalmente 90% do total nacional. Indagada pelo GLOBO ontem se manteria essa previsão, a presidente da estatal não enviou resposta até o fechamento desta edição.

Na segunda-feira, a Petrobras justificou a revisão para baixo da perspectiva de crescimento da produção nacional de óleo e gás pelo atraso na entrega de plataformas, a necessidade de obras a bordo, atrasos nos processos de licenciamento e na interligação de alguns poços. A meta anterior, de 7,5% de crescimento, tinha uma margem de um ponto percentual para cima e outro para baixo.

Para o consultor Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infra Estrutura (CBIE), o ritmo de produção da Petrobras no futuro próximo corre riscos, se houver dificuldade maior para a empresa acessar recursos financeiros, com uma eventual queda do seu rating ou da nota de crédito do país, por exemplo. Isso porque já existe um cronograma para a entrada em operação de plataformas até 2018, período no qual a produção deve seguir em alta, se não houver percalços ainda imprevisíveis.

- Botando de lado a (operação) Lava-Jato, a Petrobras tem uma situação desconfortável, porque está entrando com dívida muito elevada em um ciclo de redução do preço do petróleo. Terá que rever investimentos, principalmente depois de 2018. Até lá, tem de administrar essa confusão - disse Pires.

Nos últimos anos, a Petrobras vem sendo cobrada pelo governo federal e, oficialmente, também pela Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP), a elevar o ritmo de produção de alguns campos, por exemplo na Bacia de Campos, que estavam aquém do razoável, tendo em vista o tamanho de seus poços, segundo a diretora-geral da ANP, Magda Chambriard. Combinado com a disparada no consumo de derivados de petróleo nos últimos anos, principalmente com o aumento da frota de veículos nacionais, o déficit de produção do petróleo levou a uma situação negativa da balança comercial nacional e prejudicou o resultado da Petrobras recentemente, já que a estatal teve de importar petróleo ou derivados a preços maiores do que praticava na venda ao mercado interno.

O Brasil já foi autossuficiente em petróleo em 2009, quando a produção média diária de barris foi superior ao consumo, em 28 barris por dia. Em 2006, essa marca também foi atingida, mas não ao longo de todo o ano. O fato foi divulgado com grande alarde pelo governo. Na época, a Petrobras gastou R$ 37 milhões em uma campanha publicitária para divulgar a conquista da autossuficiência. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva chegou a dizer que, por causa da conquista, o Brasil passava a ser "dono do seu nariz".

A autossuficiência em derivados de petróleo nunca foi atingida pelo país, uma vez que temos de importar produtos que não produzimos aqui, por conta do atraso da entrada em operação de refinarias da própria Petrobras. Segundo declarações de Graça Foster, feitas ao longo deste ano, a autossuficiência em derivados só será atingida em 2020.

A Bolsa de Valores de São Paulo fechou ontem em alta de 1,57%, apesar da queda das ações da Petrobras. Os papéis ON, com direito a voto, recuaram 1,56%, a R$ 11,94. Já os PN, sem voto, caíram 1,19%, a R$ 12,45 - ambos próximos da mínima histórica. O dólar cedeu 0,49%, a R$ 2,59.

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Lava-jato: Moody's rebaixa nota da Mendes Júnior

Vice-presidente da construtora foi preso por envolvimento nas acusações contra a estatal

Ana Paula Ribeiro

SÃO PAULO - A agência de classificação de risco Moody"s rebaixou ontem a nota da construtora Mendes Júnior, de B3 para B2, e alterou a perspectiva de estável para negativo. No caso da empreiteira OAS, a agência mudou apenas a perspectiva, também para negativa. Entre os fatores por trás dessas alterações estão as denúncias de corrupção na Petrobras.

"O rebaixamento da nota foi motivado pela percepção de aumento de risco de liquidez para a Mendes Júnior com base nas denúncias de corrupção que envolvem um dos seus principais executivos e a Petrobras, um cliente relevante, que atualmente responde por 15% da carteira de obras da construtora", diz a Moody"s, em relatório.

Na última sexta-feira, a Polícia Federal prendeu o vice-presidente da empresa, Sérgio Cunha Mendes.

A Moody"s explica ainda que as alterações refletem um ambiente mais difícil para o crédito, com inflação e juros em alta. "As previsões macroeconômica do Brasil e um ambiente fiscal desafiador podem resultar em taxas de investimento mais baixas e atrasos na aprovação de pedidos de recuperação de margem em projetos públicos", diz.

No caso da OAS, a alteração foi feita apenas na perspectiva. "Embora as investigações ainda estejam em andamento e nenhuma conclusão tenha sido alcançada, nós acreditamos que esses eventos podem afetar negativamente a execução da estratégia de crescimento da OAS no curto prazo", justificou o relatório. Entre os executivos da OAS presos estão o presidente, José Adelmário Pinheiro Filho, e o vice-presidente da área internacional, Agenor Franklin Magalhães Medeiros.