Nem assumiram seus novos mandatos, o “Congresso em Foco” publicou a relação dos 135 parlamentares que receberam quase R$ 1,4 milhão em doação de campanha de seus próprios assessores de gabinete. E a fonte é insuspeita: o próprio TSE. Ao todo, mais de 360 funcionários do Parlamento contribuíram para a reeleição de seus chefes. O que você acha? Ilegal? Não. Apenas imoral.

Para além das crises política, econômica e social bombardeadas diariamente na grande mídia, a crise moral permanece na raiz de nossos problemas sem, no entanto, o devido destaque. Crise que revela o desentendimento dos valores morais sobre os quais se erigiu a própria civilização ocidental. E que pode ser facilmente percebida através do noticiário da própria mídia, convencida mais de sua fácil função denuncista de delitos do que da difícil missão de formar o cidadão. Isso nos deixa a todos com a sensação de bovina permissividade em face da fatalidade da nossa cultura de transgressão. Sobretudo no campo da cultura política, com a dita preferência do eleitorado por governantes populistas que entregam benefícios imediatos sobre os que conduzem a gestão pública com probidade, manifestação política de uma crise moral anterior cuja responsabilidade é diluída para todos os cidadãos.

Neste caldo da cultura de transgressão, quem de nós se anima a se indignar com os índices de sonegação e corrupção, que “nunca antes nesse país” foram tão grandes? Além dos inúmeros desvios de conduta social relatados ad nauseam pela mídia patrulheira. Como dezenas de casos de estudantes do ensino fundamental que agridem professoras em salas de aula. Ou de ativistas do MST que espancam trabalhadores das fazendas invadidas. Ou de universitários em greve que depredaram instalações da própria universidade onde estudam. Ou de grupos de linchamento que partem para fazer justiça com as próprias mãos. Recentemente, a ANMP, Associação dos Médicos Peritos da Previdência Social, denunciou que nada menos do que 91% deles já sofreram ameaças ou agressões por parte de segurados inconformados com o fim do auxílio-doença.

Ou seja, o desentendimento da cidadania como titularidade de direitos sociais ilimitados contra nenhum dever político de cuidar do interesse público! Legado de anos de governos estatólatras para cujo cínico princípio da legalidade nada tem a ver com o princípio da moralidade. O resultado é esta crise moral épica, capaz de colocar em risco não só os esforços por uma plena cidadania política, mas a própria democracia.