Chamado por poucos de “Joca”, por muitos de “trator” e por petistas de “mãos de tesoura”, o engenheiro naval e PhD em economia Joaquim Levy será anunciado nesta quinta-feira, 27, ministro da Fazenda em substituição a Guido Mantega com a missão de encarnar, agora, o papel de “salvador da pátria” da política fiscal depois das manobras contábeis que abalaram a credibilidade do País.

Levy desperta esperança e apreensão dentro do governo. Se por um lado a presidente aposta na obstinação e no seu conhecimento técnico para, por exemplo, ser capaz de entregar o superávit que for prometido, por outro lado a ortodoxia do economista para cumprir suas missões arrepia governistas, que temem o comprometimento dos avanços sociais da gestão petista.

O escolhido para comandar a Fazenda no segundo mandato costumava protestar quando algum de seus assessores do Tesouro Nacional lhe comprava bilhetes na classe executiva em viagens internacionais, previsto pelo regulamento do setor público. “Com esse dinheiro, viajam dois”, reclamava.

Quando controlou a chave do cofre do Tesouro, entre 2003 e 2006, no governo Lula, costumava bater de frente com a então ministra de Minas e Energia Dilma Rousseff. Especialmente porque ele tentava intervir em questões da pasta, como por exemplo no episódio do marco regulatório de energia, que estava em elaboração pela então ministra. Casos como esse geraram brigas entre os dois e até a expulsão dele de dentro do gabinete dela.

Mesmo assim, a hoje presidente resolveu acatar a sugestão do nome de Levy movida pela razão e não pela emoção. Ele vem sendo descrito por economistas como “o mais completo” para a função de ministro.

FMI. Além da formação acadêmica que passa por mestrado na Fundação Getúlio Vargas e doutorado na Universidade de Chicago - com carta de recomendação escrita por seu ex-professor Arminio Fraga -, Levy conheceu a política monetária de vários países quando trabalhou no Fundo Monetário Internacional (FMI). Adquiriu experiência com a estrutura de gastos da máquina federal durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, quando foi secretário adjunto de Política Econômica, economista-chefe do Planejamento e, já na gestão Lula, chefe do Tesouro. Estreitou relações com agências internacionais de classificação de risco quando foi da direção do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Como secretário de Fazenda do Rio, conheceu em profundidade as finanças estaduais. E foi na diretoria do Bradesco Asset Management que aprofundou sua relação com investidores do mercado financeiro.

Quando atuou no governo federal, ele mandou contratar secretárias em três turnos diferentes. A última costumava encerrar o expediente às 2h da manhã. Muitas vezes, Levy trabalhava até o início da madrugada, voltava para sua casa, nadava alguns quilômetros e voltava ao trabalho. Ou dormia algumas horas no sofá do próprio gabinete para dali retomar mais um dia. E-mails enviados às 3h e ligações para cobrar resposta às 7h costumam ser rotina até hoje.

Se Dilma e Levy concordam no jeito austero e duro de cobrar os subordinados, agora resta a expectativa por parte do mercado e de governistas é se a presidente estará disposta a dar autonomia para conduzir a política econômica na qual acredita.

 

Um moderado que agrada aos petistas e ao mercado

 

Não era o ministério dos sonhos para o economista Nelson Barbosa. Desde que saiu do governo, em maio de 2013, teve presença garantida em todas as listas de apostas dos mais cotados para substituir Guido Mantega no comando da Fazenda. Ficou com o Planejamento. Mas sua chegada ao primeiro escalão da Esplanada deve marcar uma espécie de ressurreição da pasta que perdeu influência e poder nas mãos de Miriam Belchior, no primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff.

Na arrumação da casa, o novo ministro vai comandar a reformulação do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), vitrine do governo Lula que não deslanchou como se esperava com Dilma. Na dobradinha com Joaquim Levy no Ministério da Fazenda, Barbosa fará o ajuste fiscal necessário na direção da recuperação da transparência da política fiscal – cuja perda de credibilidade com o uso de manobras contábeis o empurrou para fora do governo, após sucessivos embates com o secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin. Um desafeto declarado que Barbosa quer ver longe da Esplanada dos Ministérios.

Quem espera atritos com Levy (os dois são parecidos no temperamento forte e impositivo) podem se surpreender, dizem os amigos mais próximos. Polarização e divergências devem ocorrer, mas a aposta é de que vão editar uma parceria para tentar recolocar a economia brasileira nos trilhos. Uma das razões é o fato de, entre os economistas mais próximos do PT, Barbosa ser dos mais respeitados pelo mercado financeiro, do qual se aproximou nos últimos tempos.

Transparência. Barbosa defende uma estratégia que resulte em geração de superávits primários sem interrupções para manter a estabilidade fiscal. Para ele, esse processo será gradual, com sinais claros no curto, médio e longo prazos. Na definição das diretrizes da política fiscal para 2015, deve defender a redução da meta fiscal fixada pela equipe entre 2% e 2,5% do Produto Interno Bruto (PIB). Em nome da transparência, prefere o anúncio do superávit “possível” para 2015.

Com perfil formulador de políticas, o ex-secretário executivo de Mantega tem hoje pronto um conjunto de propostas para o enfrentamento dos principais desafios macroeconômicos do Brasil para os próximos quatro anos – trabalho feito ao longo do um ano e meio em que ficou fora da equipe econômica de Dilma. É uma lista de 12 medidas fiscais, numa alusão aos trabalhos de Hércules.

Outros trunfos de Barbosa, que atuou no governo desde a gestão Lula, são o conhecimento acurado da máquina do governo e a capacidade aprendida de negociar com o Congresso.