“A polêmica me acompanha na universidade”, reconhece o professor Manoel Luiz Malaguti, do Departamento de Economia da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).
 
Ele, que admitiu ter respondido a processos na universidade, negou declarações racistas, mas admitiu que preferiria sim, ser atendido por um médico branco a um negro.

Ele é natural do Rio de Janeiro, professor da Ufes há 20 anos e atuou em Lisboa e fez doutorado na França. O docente – que não revela a idade “para não inserir o conflito de gerações” na polêmica – criticou as cotas, mas disse que cotistas precisam “de carinho”.

 

Manoel, que se considera um professor liberal, grava as aulas e avalia os alunos pela participação, disse que a denúncia veio após aplicar uma prova como “castigo” pelo fato de os alunos lerem pouco. Confira a entrevista:

O senhor realmente disse que detestaria ser atendido por um médico negro?
Não disse isso. No meio de uma discussão sobre cotas e sobre o sistema educacional, eu coloquei que se tivesse que escolher entre dois médicos, um branco e um negro com o mesmo currículo, eu escolheria o branco. Porque o branco, em média, estatisticamente falando, nasceu numa família mais abastada, consequentemente ele teve acesso a meios de comunicação mais avançados, em outros idiomas. Ele participou de atividades culturais, viajou. É um tipo de aluno que tem uma exigência, que vê a universidade de uma forma. Já os negros, em média, vem de sociedades menos privilegiadas. E nesse sentido não têm uma socialização primária na família que os torne receptivos. Eles têm muito mais dificuldades para acompanhar determinadas exposições. A gente como professor tem que fazer um duplo trabalho e falar em uma linguagem que penetre em todas as camadas sociais.
 
O senhor não acha que essa é uma visão preconceituosa?
Não. Acho que é bastante realista. A biologia e a genética nos informam que até os sete anos as conexões neurais já estão todas estabelecidas. Qualquer coisa que aconteça após essa fase é uma influência da razão, do pensamento, tentando mudar os conceitos e preconceitos adquiridos nessa época chave. Há uma maior dificuldade do cotista negro. Não que eles sejam inferiores. Ele simplesmente nasceu em uma condição de desigualdade social em relação aos outros alunos brancos que não são cotistas.
 
Mas o senhor não acredita que um médico negro pode ser um bom profissional?
Eu não acredito. É possível como exceção. Na média, os profissionais brancos são de uma camada social privilegiada. Todas as pesquisas mostram que para um mesmo trabalho os negros ganham menos. E, ganhando menos não podem se aperfeiçoar da mesma maneira que os brancos. Podem, na margem de erro das pesquisas. Não há nenhum tipo de inferioridade natural entre o negro e o branco. Todos nós temos algo de negro, de branco, de amarelo... Em média, o médico negro tem uma dificuldade maior para atingir o mesmo nível dos médicos brancos que provavelmente já recebem o consultório dos pais, têm uma clientela formada. Esse privilégio da classe média de poder viajar, comprar livros, se aperfeiçoar, se alimentar melhor, é isso que me faz pensar ao olhar para dois currículos, de preferir o branco.

O senhor é contra as cotas? O que tem que ser feito como política inclusiva?
Sou contra. É colocar o carro na frente dos bois. Você não pode jogar dentro da universidade pessoas que não tiveram avaliações anteriores, se você imaginar o problema da passagem automática no ensino fundamental e no ensino médio. Pessoas que não sofreram o mesmo que outras pessoas, que foram avaliadas e testadas, passaram.

Mas o fato de a universidade não se abrir para essas pessoas não estaria correndo o risco de criar um ciclo vicioso que perpetue a discriminação?
Isso perpetuaria se não houvesse políticas para a família. O problema é resolver a falta de condições sociais das famílias. Se conseguirem dar uma educação menos rançosa, eles não vão precisar de cotas.